O Mundo

Helen Araújo
algorabcorvus
3 min readSep 5, 2021

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“O mundo realiza todos os anseios humanos de alegria e prosperidade, mas o conforto pode se transformar em acomodação”

diz o panfletinho que veio no meu tarot macabra.

Quando tirei o arcano busquei rapidamente um cenário de fundo, e achei meu livro de fábulas de La Fontaine com ilustração de Gustave Doré. Peguei uma gravura aleatória que me remetesse ao Mundo e abri na fábula A Floresta e o Lenhador. Você vê na imagem um homem cansado, trabalhador, em desespero e rogando aos céus. A história dele é a seguinte: o cabo de seu machado quebrou e ele não pode mais extrair da floresta, então pede a ela mais um galho para consertar sua ferramenta e lhe PROMETE extrair lenha de outro local, preservando assim a natureza. A floresta concede, mas vê imediatamente a traição do homem, que volta a atacá-la. O texto me chocou porque termina com o seguinte parágrafo:

“Assim age o Mundo: faz-se o mal contra quem faz o bem. Estou cansado de repetir. A ingratidão e o abuso sempre estarão em moda”.

Perceba o mundo com M maiúsculo! O homem olhando em direção ao arcano (só li depois de fotografar)!

Podemos pensar em diversas situações, mas a mais óbvia é a pilantragem que estão fazendo com nosso bioma. Ou pessoas que, nem sempre por má vontade, mas por falta de fé em si mesmas se escoram na bondade alheia para conseguir algo de forma mais fácil. Mamãe sempre diz que “ser bom é de Deus, ser bobo é do Diabo”, católica que é. Não que eu apoie dicotomias, mas tudo é questão de boa interpretação da palavra: a completude do mundo já existe, mais que isso é solar a massa.

O Mundo é alquimia, há uma receita, uma quantidade correta, um equilíbrio entre as forças. A águia, o homem, o touro e o leão são manifestações de ar, água, terra e fogo. Os quatro elementos que, quando bem colocados, dão lugar à quintessência. Mas, como toda receita, “tudo demais é muito” — frase também de mamãe.

Devemos fugir dos excessos, tanto nossos, como de nossa bondade em relação ao outro. Não se trata de não colaborar com o camarada, trata-se de deixá-lo caminhar com as próprias pernas. Ajudar não é fazer pelo outro; saiba respeitar os próprios limites, carregue o que é seu e o que seu corpo, mente e espírito podem aguentar. Com o outro você co-labora, ou seja: trabalha (labora) em cooperação, co-opera. Cada um é coadjuvante na história alheia e protagonista na própria história. E não é só porque você está na crista da onda que vai dar uma de lebre e achar que a vida está ganha: foi seguindo essa lógica que ela perdeu para a tartaruga.

O mundo é perfeito, o homem não; por isso deve-se sempre estar atento nessa dança do equilíbrio, levando consigo o que é necessário e tentando equilibrar as forças, sem perder com isso a atenção, a noção de limites de si e do outro, a percepção da realidade.

Hel

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Helen Araújo
algorabcorvus

Escrevo, desenho, estudo gravuras, oráculos e costuro cadernos no estudiosaojeronimo.com