COVID-19, O QUE PODEM FAZER AS EMPRESAS PERANTE ESTE DESAFIO?

Tiago André Ferreira
Aliados Consulting
Published in
8 min readMar 15, 2020

O Coronavírus é um grande desafio mundial, considerado uma Pandemia pela Organização Mundial de Saúde. Hoje, milhares de pessoas enfrentam o desafio da luta contra a doença, profissionais de saúde enfrentam o desconhecido em condições técnicas e materiais muitas vezes deficitárias, e milhões de pessoas enfrentam restrições à sua liberdade de movimentos e ações, estando até em situações de quarentena.

Além da dimensão do desafio de saúde pública, o COVID-19 está, e continuará a gerar, efeitos económicos muito significativos que levarão a um forte abrandamento económico. O seu impacto total não é calculável, sendo que dependerá, da capacidade do mundo conter e anular a doença, do tempo que o demorará a fazer, do tempo necessário para a recuperação da confiança dos consumidores, e também do estímulo à economia que as instituições darão.

Com este artigo, pretende-se apresentar um conjunto de ideias para alimentar a reflexão de empresários e empreendedores, sobre como gerir este cenário de crise. Não existirão duas realidades iguais, porém, a aprendizagem de como agiram as empresas, por exemplo na China, certamente enriquecerá esta importante reflexão.

De seguida virão apresentadas várias ideias que as empresas poderão seguir, e que se encontram divididas em três grandes áreas: proteção aos colaboradores; gestão empresarial; responsabilidade social.

Apesar do esforço, recorrendo para isso às fontes mais credíveis e qualificadas, este texto será apenas um pequeno contributo nesse processo.

Proteção dos colaboradores

A resposta a este desafio implica alterações severas ao estilo de vida da sociedade. Para as empresas, manter o mesmo modelo de funcionamento não é opção. O papel ativo das empresas no combate à propagação do COVID-19 é no entanto fundamental. Existem várias medidas que as empresas devem tomar para protegerem os seus colaboradores:

1. Criação de uma equipa interna de gestão do COVID-19 responsável pela implementação e gestão de medidas, e por garantir uma comunicação clara e bidirecional sobre o assunto dentro da empresa, de forma a garantir não apenas o combate à transmissão do COVID-19, mas também assegurar um clima emocional de conforto no desempenho das funções;

2. Desenvolvimento de um plano de contingência que inclua medidas de gestão da situação de crise, tais como sessões de formação sobre o COVID-19 aos colaboradores, a implementação de materiais de divulgação das medidas, ou o uso de redes sociais (WhatsApp, Messenger, etc.) para garantir a boa comunicação interna;

3. Reforço da higienização das instalações, aumentando o serviço de limpeza da empresa e criando rotinas de lavagem das mãos periódicas de toda a equipa;

4. Promover uma boa higiene respiratória no local de trabalho, promovendo o distanciamento mínimo de 1 metros no contacto entre colaboradores, evitando aglomerações de pessoas, por exemplo alterando a prática de refeições em cantina por catering nos locais trabalho de cada colaboradores;

5. Restringir as viagens dos colaboradores, e nos casos essenciais, promover o esclarecimento dos mesmos dos cuidados a ter;

6. Promover o princípio da monitorização voluntária regular da temperatura pelos colaboradores, definindo a regra de que ninguém com mais de 37,5 C deve ir trabalhar, ou continuar em funções no local de trabalho;

7. Definir uma área de isolamento dentro do espaço da empresa, para onde uma pessoa com sintomas possa ser encaminhada, enquanto entra em contacto com as autoridades da área da saúde e aguarda instruções;

8. Passar para tele-trabalho o maior número de pessoas dentro da empresa, de forma a minimizar as possibilidades de contágio;

Gestão empresarial

O impacto do COVID-19 na economia tem muito de imprevisível, mas será seguramente bastante negativo. Dentro deste impacto existem setores mais expostos que sofrerão maiores consequências do ponto de vista da procura, tais como o do turismo ou o dos transportes aéreos, enquanto noutros isso tenderá a acontecer menos dada a sua necessidade ser permanente, tal como o é exemplo o setor alimentar.

Os desafios no entanto não são apenas do ponto de vista do mercado, mas decorrerão também da exposição das empresas a problemas dentro da cadeia de valor do setor, podendo enfrentar muitas vezes situações de ausência de matéria-prima, ou mesmo de sistema de distribuição.

Apresentam-se aqui um conjunto de ideias sobre a gestão empresarial neste cenário:

9. Olhar para o futuro e planear permanentemente. Neste contexto imprevisível, a atualização de conhecimento e informação deve ser diária, tendo como objetivo permitir as melhores tomadas de decisão sobre produção, distribuição, gestão financeira, etc. A realidade estará em permanente mudança, será diferente de mercado para mercado, e diferente no tempo pelos diferentes estádios do desenvolvimento do COVID-19, e também das medidas legais que entrem em vigor;

10. Precaver a liquidez da empresa para enfrentar meses de dificuldade. Dependendo de setor para setor, e mesmo de geografia, as empresas na sua globalidade irão enfrentar fortes desafios de liquidez. Neste cenário, as empresas devem desenhar e atualizar permanentemente cenários económicos e financeiros, que tenham em consideração custos de produção que poderão sofrer alterações, o impacto nas receitas pela diminuição da procura, e também os tempos de cobrança e de pagamentos a efetuar.

Além disso, manter o contacto com parceiros financeiros para estudar opções de financiamento existentes, ou novas que existirão em resposta ao desafio, poderá ser fundamental.

Fazer um bom controlo destas variáveis será chave na manutenção da viabilidade da empresa, e dos postos de trabalho existentes;

11. Pensar reduções de custos fixos. Nesta fase excepcionalmente difícil, poderá haver espaço para acordos com fornecedores que permitam a redução dos custos fixos ao longo de um determinado período de tempo.

Sejam com senhorios na questão do eventual arrendamento dos imóveis, seja nas avenças com contabilistas, advogados, etc., poderão haver suspensões ou reduções de custo temporárias, que ajudarão a equilibrar as contas durante este período de crise;

12. Gerir com flexibilidade e criatividade os recursos humanos. Haverá setores que terão estagnação total ou quase total da atividade. Haverá outros que terão um pico de procura, como é exemplo parte do setor alimentar, ou da saúde. As empresas devem olhar para as suas equipas, e nos casos em que tenham recursos subaproveitados devem pensar em aloca-las a atividades geradoras de maior valor, como sejam as atividades de planeamento da recuperação pós-crise. Outra possibilidade é a de em cooperação com outras empresas que tenham um pico de trabalho nesta fase, reforçando as suas equipas temporariamente.

Estas são algumas das ideias a explorar, de forma a minimizar soluções socialmente mais pesadas como o layoff ou os despedimentos;

13. Estabilizar cadeia de valor. Neste cenário as cadeias de valor sofrerão muita instabilidade, que dependerá das medidas implementadas em cada país, e da respetiva evolução da situação localmente, e da logística nacional e internacional.

Atendendo a esta realidade, as empresas devem planear permanentemente as suas compras, tentando fortalecer a sua resiliência através do alargamento da rede de potenciais fornecedores e clientes, e também da gestão de stocks.

O contacto permanente com o setor logístico será também fundamental;

14. Testar e aplicar tecnologias e procedimentos de trabalho remoto. Esta medida tem caráter duplo, uma vez que para além de proteger os colaboradores, permite à empresa adquirir uma nova resiliência para o cenário em que as restrições à circulação de colaboradores se levantem, e estes tenham mesmo de permanecer em casa.

Desenvolver uma cultura de trabalho remoto, os processos de colaboração neste contexto, e o uso de ferramentas digitais, não apenas contribuirá para a produtividade da empresa, como também será uma nova competência com valor para o futuro;

15. Ponderar a passagem de business to business (B2B) para business to consumer (B2C). Muitas empresas enfrentarão graves dificuldades em vender a outras empresas que também enfrentarão diminuições drásticas da procura. De forma a mitigar a menor procura, e atendendo à presença das pessoas em casa e tendencialmente mais conectadas à internet, o marketing digital direcionado ao cliente final pode ser uma boa medida para alguns setores manterem atividade, sobretudo se for articulado com distribuição porta a porta;

16. Procurar oportunidades na adversidade. No caso chinês muitos segmentos de mercado conseguiram aumentar as suas vendas neste contexto, nomeadamente relacionados com serviços de entrega ao domicílio, mas também nas áreas do marketing digital, ou dos produtos de higiene. A capacidade das empresas se adaptarem poderá permitir que alcancem novos mercados e complementem o negócio.

Importante ter em consideração que esta realidade, de tão marcante para todos os consumidores e empresas, gerará novas necessidades e novos hábitos de consumo. Nestas alterações existirão também novas e potencialmente boas oportunidades para a fase de recuperação da economia;

17. Reforçar o envolvimento com os colaboradores. Empresas e seus colaboradores enfrentam riscos financeiros. A generalidade das empresas enfrentará grandes dificuldades para honrar compromissos, manter postos de trabalho, e a sua viabilidade em geral. De forma a preservar a economia a colaboração entre empresas e pessoas será fundamental, devendo haver compromissos de parte a parte, que serão necessariamente duros para ambos.

Por exemplo, a contagem como férias dos colaboradores de dias em que a produção não seja possível, deve ser uma medida considerada entre as partes. Outra ideia, mais extrema, será a possibilidade de uma parte dos pagamentos salariais ser feita em equity da empresa. Esta medida permitirá não apenas financiar o funcionamento da empresa, como também aumentar o sentimento de pertença dos colaboradores perante a mesma.

18. Extrair aprendizagens desta situação. Após a resposta à crise importa ás empresas refletirem naquilo que tenham descoberto estar melhor e pior na organização das mesmas, de forma a planear o futuro onde voltarão a existir desafios, e onde as conclusões agora retiradas poderão ser importantes.

Responsabilidade social

Enquanto entidade, compete às empresas em primeiro lugar proteger as suas pessoas, e assim também as suas famílias, mas também proteger o seu negócio, garantindo tanto quanto possível que após a crise de saúde pública que enfrentamos, a economia possa manter o máximo de postos de trabalho, de forma a minimizar a crise económica que se seguirá.

Além destas prioridades, que em si já são um comportamento de responsabilidade social empresarial, este é um momento ímpar na nossa história contemporânea, pelo que também as empresas, sobretudo as mais capazes, têm um papel fundamental no enfrentar esta pandemia.

Partilham-se aqui algumas ideias:

19. Demonstrar propósito. As empresas são mais fortes quando as suas comunidades também o são. Neste momento as empresas devem pensar como participar na resposta à emergência, seja partilhando know-how, recursos, ou equipamento;

20. Participar nos esforços globais de cuidados de saúde das pessoas, que por norma têm dificuldades de financiamento da aquisição de novos equipamentos e outros dispositivos. Sobretudo a nível local as empresas devem refletir, em articulação com as entidades do setor da saúde que devem definir as necessidades e prioridades de aquisição, se podem ter um papel no financiamento de equipamentos necessários ao cuidado à população;

21. Vários são os setores económicos que são imprescindíveis para a segurança e conforto das pessoas e das organizações (alimentar, energia, distribuição, etc.), e até para o bom funcionamento da resposta global à emergência. As empresas devem assegurar o seu papel dentro destas importantes cadeias de valor, mas devem ter especial sensibilidade para os grupos mais vulneráveis e desfavorecidos, tais como idosos ou pessoas com fatores de risco, adequando a sua oferta, prestando assim novos serviços que têm em conta as necessidades especiais destes;

Mensagem final

A crise económica que o Coronavirús está a provocar gerará a perda de muitos postos de trabalho, e mesmo o encerramento de muitas empresas viáveis. A sua extensão não é possível de estimar nesta fase, porém, dado que esta é provocada por um fenómeno de saúde público, também se espera que a recuperação económica seja substancialmente mais rápida do que aquela que o mundo enfrentou após 2008/2009.

Este é um tempo em que todos somos poucos, mas que juntos valemos por muitos mais. Os empresários e os empreendedores serão certamente fundamentais para a recuperação mundial da nossa segurança, saúde e estilo de vida contemporâneo.

Votos de sucesso!

Notas

· Sendo um fenómeno novo e imprevisível os conteúdos deste artigo devem ser entendidos como ideias formuladas no contexto da informação disponível em 15/03/2020, devendo ser atualizadas continuamente com a evolução da realidade.

· Este artigo deve ser entendido como colaborativo, pelo que novas ideias, sugestões de melhoria, ou conteúdos complementares serão bem-vindos, e usados na sua atualização em benefício dos leitores do mesmo.

Fontes

Entrepreneur.com

Harvard Business Review

Mckinsey & Co

World Economic Forum

World Health Organization

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Tiago André Ferreira
Aliados Consulting

I’am an impact strategist, interested on subjects as entrepreneurship, social innovation, and local economic development.