Sobre a sombra da extinção: Um retrato das aves ameaçadas na Amazônia
A diversidade de aves na floresta amazônica é imensa, sendo um dos biomas com o maior número de espécies no Brasil. Elas desempenham funções cruciais em vários processos ecológicos importantes como a polinização, a dispersão de sementes, o controle de conversão e a reciclagem de nutrientes. De acordo com o instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade estima-se que existam em torno de 1.3000 espécies para a Amazônia (ICMBio, 2022). Porém, muitas das espécies têm sofrido declínios populacionais nos últimos anos. Segundo a lista vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN,2021), 14% das aves em todo o mundo estão em risco de extinção. Só na região Amazônica esse número é de cerca de 224 espécies, o que representa 3,3% das aves da região (IUCN,2022). Em 2023, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade realizou uma avaliação que acordos pelo menos 74 espécies de aves ameaçadas de extinção no bioma amazônico brasileiro (ICMBio, 2023). No entanto, os especialistas alertam que atualmente esse número pode ser ainda maior. Isso porque ameaças comuns como o desmatamento continuam na região impactando mais espécies. Apesar do grande número de espécies conhecidas, estima-se que ainda exista uma proporção significativa de aves não descritas pela ciência principalmente em áreas naturais com regiões pouco exploradas como a Amazônia. Esse é um fato que pode contribuir para a possível extinção dessas espécies, uma vez que o desconhecimento sobre sua existência, hábitos e ameaças dificulta a implementação de medidas de conservação.
As aves da Amazônia enfrentam diversas ameaças, como o desmatamento, a caça ilegal, tráfico e outras ações humanas que constituem as principais ameaças para a sobrevivência das espécies. Entre as aves que sofrem com a mudança de seu habitat, podemos citar a majestosa azulona (Tinamus tao), que tem um porte elegante e plumagem azul-acinzentada; e o aracuã-pintado (Ortalis guttata), que tem um canto melodioso e plumagem marrom com pintas brancas. Para se ter uma ideia, só em 2020, o bioma amazônico perdeu 729.781,76 km² de área devido à ação humana segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE, 2020). Essa devastação é resultado de atividades como desmatamento para fins agropecuários, exploração madeireira, expansão urbana e garimpo. Outra atividade prejudicial que também aumentou foi o comercio ilegal de animais, um levantamento de dados realizado entre 2012 e 2019 a partir do relatório Wildlife Trafficking in Brazil revelou que durante este período cerca de 160 espécies de animais foram vítimas do tráfico na Amazônia brasileira, o que representa aproximadamente 34% do número total de espécies. A Renctas (Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres) afirma que o tráfico é a terceira atividade ilegal mais lucrativa do mundo e movimenta US$ 2 bilhões anualmente, o que dificulta muito seu combate. O desmatamento desenfreado, a caça ilegal e o tráfico de animais silvestres se configuram como sérias ameaças à conservação das aves amazônicas, exigindo medidas urgentes e eficazes para protegê-las.
O que fazer para conservar as aves ameaçadas e evitar sua extinção?
Para cada espécie, é essencial adotar ações específicas de conservação, as quais variam de acordo com as ameaças enfrentadas. Diversas medidas podem ser implementadas para contribuir em sua conservação, como a criação de áreas protegidas, que garantem a proteção do ambiente natural das aves. Até o momento, cerca de 1,6 milhão de quilômetros quadrados do território nacional brasileiro são reservados para unidades de conservação, correspondendo a 18% da área terrestre e 1,5% da área marinha sob legislação de proteção (FRANCO, 2022). Uma das formas de conservar a biodiversidade, mas não excluir as pessoas nativas da região são as unidades de conservação de uso sustentável que permitem a presença de populações humanas, dentro de determinados protocolos de atividades. Essas unidades de conservação promovem a coexistência de populações humanas desenvolvendo atividades de subsistência e sustento em consonância com a conservação da biodiversidade. Essa abordagem contribui para proteger a biodiversidade, regular a ocupação do território e garantir a utilização sustentável dos recursos naturais, representando uma estratégia eficaz para conservar ecossistemas e envolver as comunidades na preservação ambiental.
Diversas iniciativas e organizações em todo o mundo visam proteger as aves como a BirdLife International e a Wetlands International, que coordenam ações globais para conservação das aves, inclusive no Brasil. Outra ação importante é a criação de planos, grupos de trabalho e projetos governamentais com objetivos de pesquisa, compreender as ameaças e assim proteger os habitats e as próprias espécies de aves ameaçadas. No Brasil, o Plano de Ação Nacional para a Conservação das Aves da Amazônia, implementado pelo ICMBIO em 2023, foi elaborado considerando 74 táxons nacionalmente ameaçados de extinção. Este plano visa proteger espécies de aves amazônicas contra a perda de habitat, promover a restauração de áreas degradadas, sensibilizar a população sobre a importância da preservação das aves e monitorar o ecossistema, contribuindo assim para a recuperação de habitats e o retorno de espécies que foram encontradas extintas anteriormente na região (PAN Aves da Amazônia, 2023). Neste plano estão incluídas espécies em risco de extinção, como o mutum-pinima ( Crax fasciolata pinima ), o jacamim-de-costas-escuras ( Psophia viridis obscura ) e o bicudo ( Oryzoborus maximiliani), que se encontram em estado crítico de perigo.
Embora o plano de proteção para as 74 espécies de aves amazônicas represente um passo crucial, é fundamental ampliar o foco para as diversas outras que também se encontram ameaçadas. A Amazônia, com sua rica avifauna enfrenta sérios desafios, como desmatamento, caça ilegal e tráfico de animais. Manter um esforço contínuo e abrangente para proteger todas as aves da região é fundamental para garantir a preservação da biodiversidade e o futuro dessa avifauna tão diversa. Através de medidas como o combate ao desmatamento, a intensificação da fiscalização e o investimento em educação ambiental, podemos garantir que as futuras gerações também possam presenciar a beleza e a importância das aves amazônicas, desde o mutum-pinima até a harpia, em seu habitat natural.
Referências:
ALMEIDA, Poliana. Tráfico de animais é a terceira maior atividade ilegal no mundo. 2021. Disponível em: https://www.uninter.com/noticias/trafico-de-animais-e-a-terceira-maior-atividade-ilegal-no-mundo. Acessado em 25 jan. 2024.
Caridade, S., Ferreira, JM (2020). Tráfico de Vida Selvagem no Brasil. TRAFFIC International, Cambridge, Reino Unido.
FRANCO, D. Conservação de aves na Mata Atlântica brasileira: presente e futuro das mudanças climáticas em múltiplas escalas. lume.ufrgs.br, 2022.
ICMBio, 2023. Sistema de Avaliação do Risco de Extinção da Biodiversidade — SALVE. Disponível em: https://salve.icmbio.gov.br/. Acessado em 10 fev. 2024.
INPE. Quanto já foi desmatado na Amazônia? 2020. Disponível em: http://www.inpe.br/faq/index.php?pai=6. Acesso em: 05 fev. 2024.
Pan Aves da Amazônia, 2023. Disponível em: <https://www.gov.br/icmbio/pt-br/assuntos/biodiversidade/pan/pan-aves-da-amazonia>. Acessado em 03 fev. 2024.
REDE Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres: Renctas. 1999. Disponível em: https://renctas.org.br/. Acessado em 02 fev. 2024.
UICN. 2023. Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da IUCN. Disponível em: https://www.iucnredlist.org. Acessado em 02 fev. 2024.