Boston e as vantagens comparativas

Cleber Veiga
Análise Normativa
Published in
3 min readAug 29, 2019

Os primeiros assentamentos humanos que podem ser considerados cidades, ou algo próximo disso, surgiram na região do crescente fértil, entre a Mesopotâmia, no Oriente Médio e o vale do Nilo, no norte da África. Isso aconteceu principalmente porque, como o próprio nome da região entrega, as terras eram férteis, permitiam o cultivo e o fornecimento de comida para muitas pessoas, além dos ganhos de comércio com a venda do excedente.

Ao longo da história, as cidades surgiram por muitos motivos: Defesa do território, questões religiosas, administrativas, mas o principal motivo sempre foi a questão econômica: Fosse acesso a recursos vegetais, minerais ou uma posição que favorecesse o comércio.

Mas existe um tipo diferente de cidade: A cidade consumidora, esse tipo de cidade surge simplesmente porque as pessoas, por algum motivo, querem morar ali: Qualidade de vida, uma bela paisagem, segurança, e foi por esse último motivo que surgiu Boston, na Nova Inglaterra.

Na primeira metade do século XVII, imigrantes puritanos começaram a ocupar a região, fugindo de perseguições religiosas no velho continente.

Obviamente, os colonos poderiam plantar sua própria comida e construir seus abrigos, mas não só de pão vive o homem, mas da palavra de Deus, e nesse caso, a passagem bíblica assumia sentido literal, já que os pioneiros precisavam comprar suas bíblias (além de armas, é claro, e outros produtos manufaturados vindos da metrópole), no entanto na região não existia ouro e prata como havia em abundância na América Espanhola, e o clima frio, parecido com a Inglaterra impossibilitava o cultivo do açúcar, tão valorizado pelos europeus.

Nas primeiras décadas, a economia de Boston girava em torno de um verdadeiro esquema de pirâmide que faria Charles Ponzi morrer de inveja: Novos imigrantes chegavam trazendo ouro, compravam terras e isso fazia a economia girar.

No entanto, na década de 1640, com a eclosão da Guerra Civil Inglesa, a situação mudou drasticamente, além da instabilidade econômica e social causada pela guerra, a ascensão ao poder de Oliver Cromwell fez com que não fosse mais necessário atravessar um oceano para aproveitar dádivas do puritanismo, como a proibição do uso de maquiagem ou da celebração do Natal.

Com o fim do fluxo de imigrantes, os colonos tiveram que buscar um novo modelo econômico sustentável, e a solução estava mesmo no Novo Mundo.

Barbados era, na época, a verdadeira joia da coroa britânica nas Américas, principalmente pela produção de açúcar, acontece que pela lucratividade alcançada na produção de açúcar, simplesmente não valia a pena para os produtores locais produzir comida ou criar gado, o problema foi percebido pelos colonos da Nova Inglaterra, e desde então teve início um fluxo comercial triangular entre Boston, Barbados e a metrópole: Os colonos do norte vendiam peixe, gado e madeira aos colonos da ilha, que produziam açúcar para a coroa britânica, que por sua vez, vendia produtos manufaturados a ambos.

O comércio fez de Boston, por muitos anos, a maior cidade e principal centro comercial das colônias, posteriormente essa posição foi perdida para Filadélfia e Nova Iorque, cidades com melhor localização, mas Boston continua sendo uma das principais cidades da América do Norte.

Temos aqui um exemplo do funcionamento das vantagens comparativas, conforme explicitado por David Ricardo, o senso de oportunidade e compreensão dos ganhos do comércio fez com que as colônias inglesas na América do Norte se desenvolvessem a ponto de criar a nação mais poderosa do planeta atualmente.

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Cleber Veiga
Análise Normativa

Administrador, Especialista em Inteligência Financeira, estudante de economia, músico (wannabe) e mestre de RPG nas horas vagas.