O problema é o fã clube.
Se eu tenho opinião sobre a foto?
Não posso ter. Eu viro alvo.
Seja me desautorizando, seja me esculhambando pura e simplesmente, e depois sai falando mal dos salgadinho porque eu ̶n̶ã̶o̶ ̶g̶o̶s̶t̶o̶ ̶d̶e̶ ̶s̶e̶r̶ ̶e̶s̶c̶u̶l̶h̶a̶m̶b̶a̶d̶o̶, digo, de diálogo.
Se vocês tem limitações, eu tenho as minhas. E confesso que eu não entendo muitos de vocês. Não sei se, quando escrevem, o fazem para serem entendidos mesmo, ou só pra dar uma gozada.
Então, não.
Poderia estar roubando, poderia estar matando, poderia dar opinião, mas prefiro falar de outra coisa.
Uma coisa que pode ajudar, como argumento, pra quem quiser refletir no “retrato” da injustiça e desigualdade brasileira,
que pode ser impressa e vendida, entregue por Sedex ou até pessoalmente, no crédito ou no débito.
Veja:
eu não acredito em Deus.
Eu acredito naquilo que eu penso que Deus é.
Obrigado a todos, bom dia, até amanhã.
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Ok.
É o seguinte:
Eu peguei minha câmera e fiz uma foto avulsa, lançando o braço artisticamente, assim, como uma pluma solta nas mãos de Ru Paul, e cliquei uma criança aleatória-artística no cenário macro-delirante-glamour-porém-não-sei-poderia-tocar-um-Jorge-Vercilo-pra-eu-alinhar-as-ideias?
Aí, artisticamente, lanço um preto e branco, como Picasso desenhando no ar, eu clico em enter, e rodopio no quarto. Fim. Arte pronta. Jogo no Face.
Comentários, e me refiro não a todos, mas a ESMAGADORA MAIORIA:
-Nossa. Que terrível. Essa criança…
-Oi. Eu que fiz a foto.
-Sim, olha…você é um artista. Essa menina…triste…na estrada…parece a avenida Brasil, altura da passarela 24, mas eu poderia dizer que é uma estrada…
-Claro. Arte permite transcendência.
-Essa menina é puta. Puta menor de idade, prostituição infantil. A mãe colocou ela lá pra ganhar dinheiro e a mãe explora ela, bate na menina, a mãe não botou ela na escola, uma menina de 9 anos, coitada. Certeza que é puta explorada pela mãe. Que mundo é esse, Senhor Jesus?! Lula tem que voltar pra acabar com isso!! Jesus e Lula precisam voltar!! E ela fuma crack!! Ela estava nessa foto pensando no pai que não teve e no seu irmão, que no grupo do face já disseram que é um famoso impostor ladrão de butijão de gás em Luziânia, Goiás. Que família destruída!!!
-Ó.
-Me vende? Faz por quanto? Aceita débito?
-Claro. Já te passo o valor.
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Eu não acredito em Deus.
Eu acredito naquilo que eu penso que Deus é.
Por isso que as igrejas estão lucrando comigo.
Porque eu não vejo o que é. Eu não PROCURO SABER sobre o que é. Eu não simplesmente reduzo meus desejos de fetiche, que habitam em mim, para lidar com uma coisa do jeito que ela é.
Eu desejo aquilo que EU penso que é.
Logo, as pessoas não estão comprando Deus, e as ideias de Deus, mas estão comprando aquilo que pensam que Deus é. Porque elas estão no fundo comprando a elas mesmas e nada mais narcísico e ao mesmo tempo cruel que isso. Porque estamos falando de uma criança que, neste momento, está na vitrine demoníaca das redes e ela, que apenas estava lá, agora é alvo de todas as nossas — eu disse NOSSAS — vozes. Não não queremos Deus, queremos um Deus feito por nós, segundo nossa imagem e semelhança.
Um Deus da prosperidade. Que vai dar casa, casamento, saúde.
As pessoas não estão comprando uma foto pelo que ela é, elas estão comprando a materialização dos seus fetiches sobre o que elas acham que a realidade é. A sociedade brasileira ainda não tem estudo ou maturidade para entender o que foi a escravidão nesse país, mas essa mesma sociedade se sente capaz de criar um roteiro de filme nas suas cabeças para explicar uma imagem, e pior: há quem tente capitalizar isso para fins partidários.
E assim, elas vão seguir as vidas, com um quadro pendurado na parede da sala, pra ficarem olhando praquilo com um copo de cerveja Colorado e um pratinho de tofu defumado, sentindo as pulsões eróticas em sua genitália,
porque olhar para uma imagem e fetichizar, ter tesão por uma ideia minha própria, isso tudo é melhor que ser racional e buscar entender tudo que há na frente, atrás, em volta de uma imagem.
Black Mirror, temporada 2, último capítulo.
Netflix, manda meu dinheiro, fiz uma propaganda de vocês.
No mais, queridos,
não se matem.
No fim do dia, quem ganha com tudo isso é um homem branco, chamado Mark Zuckerberg.
Preciso ir trabalhar, só consigo responder a noite.
Peguem leve com ̶s̶u̶a̶s̶ ̶b̶o̶c̶a̶s̶ ̶d̶e̶ ̶e̶s̶g̶o̶t̶o̶ ̶q̶u̶e̶ ̶m̶e̶ ̶x̶i̶n̶g̶a̶m̶, digo, com suas opiniões.
