Personalidade Jurídica Natural

Direito Civil

niva
Anotações de Direito
4 min readApr 28, 2016

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Entendemos por pessoa natural, ou pessoa física, em termo equívoco, o ser com aptidão genérica para adquirir direitos e contrair obrigações e deveres. Este é um atributo exclusivo aos seres humanos. Como já visto, não existe Direito sem sociedade, e a sociedade é constituída de pessoas que se relacionam. É destes relacionamentos, chamados relações jurídicas, que nascem os direitos e obrigações, e apenas seres humanos podem ser seus titulares. Animais e seres inanimados podem ser objetos do Direito, até mesmo no sentido protetivo, mas nunca sujeitos.

Diz o Código Civil vigente, em seu artigo 1º:

Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil.

Esta nem sempre foi a realidade. No curso da História, escravos, assim como outras minorias, tiveram sua aptidão a envolver-se em relações jurídicas, isto é, sua personalidade jurídica, restrita.

Distingue-se aqui a personalidade da capacidade. Sendo todos sujeitos de direitos, como definido no art. 1º, somos todos dotados de personalidade jurídica. A capacidade é um elemento deste conceito, e confere limites a esta aptidão, de acordo com fatores referentes à idade e ao estado de saúde da pessoa. Quando mitigada, preserva a capacidade de direito mas restringe o seu exercício em alguns atos da vida civil.

Começo da Personalidade Jurídica Natural

Dispõe o art. 2º do Código Civil:

A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.

Observa-se que a personalidade é adquirida ao nascimento, não a partir do registro civil, devido ao seu caráter não-atributivo. Por não-atributivo entende-se que o Estado não atribui personalidade jurídica às pessoas naturais, e sim a reconhece, sendo esta inerente. Não é o caso, por exemplo, com as pessoas jurídicas, cuja personalidade é atributiva. Pessoas naturais não registradas são plenamente capazes em seus direitos e deveres.

Dá-se o nascimento com a separação completa da criança do corpo da mãe, com o corte do cordão umbilical, não importando se o parto ocorre natural ou artificialmente. Até este momento, partindo da concepção, considera-se o ente como nascituro. Embora este receba proteção legal, tanto em âmbito civil quanto penal, como nos casos de aborto, não se pode considerar esta capacidade para alguns atos como personalidade. Por ser prole eventual, seus direitos se encontram sob condição suspensiva, aguardando o nascimento.

Ausência

A questão da ausência será importante no tópico seguinte, de fim da personalidade jurídica natural, que aborda a morte presumida. Diz o artigo 22:

Desaparecendo uma pessoa do seu domicílio sem dela haver notícia, se não houver deixado representante ou procurador a quem caiba administrar-lhe os bens, o juiz, a requerimento de qualquer interessado ou do Ministério Público, declarará a ausência, e nomear-lhe-á curador.

O ausente é a pessoa que deixa seu domicílio e não há mais notícias de seu paradeiro. Para efeitos jurídicos, recorre-se a um processo trifásico da ausência, de declaração, sucessão provisória e sucessão definitiva, da qual cuidam os art. 744 e 745 do CPC/2015.

Dada a constatação do sumiço, o ausente deve ser declarado como tal pelo juiz, que mandará arrecadar seus bens e nomear-lhes-á curador para administração temporária. Como previsto no art. 25 do CC, este curador será preferencialmente o cônjuge. Feita a arrecadação, são publicados editais em diferentes plataformas por um ano, anunciando-a e chamando o ausente a entrar em posse de seus bens.

Findo este prazo de um ano, poderão os interessados requerer a abertura da sucessão provisória, na qual o patrimônio é entregue aos sucessores como posse, não propriedade, permitindo usufruto mas não alienação. Esta poderá ser convertida em sucessão definitiva apenas após decorridos dez anos, ou cinco, para maiores de 80, e então a titularidade dos bens será transferida em caráter total.

Fim da Personalidade Jurídica Natural

Consta do art. 6º:

A existência da pessoa natural termina com a morte; presume-se esta, quanto aos ausentes, nos casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva.

Seguindo o axioma latino mors omnia solvit, a morte tudo resolve, findando a personalidade jurídica natural. Traça-se uma distinção, no entanto, entre a morte de fato e a morte presumida, atribuída a certos ausentes.

Morte de fato, ou biológica, é aquela comprovada, com atestado médico e registro civil de óbito. Ocorre com a paralisação da atividade cerebral, circulatória e respiratória. Esta definição é recente e foi reformulada em favor dos transplantes, já que anteriormente se declarava a morte quando da cessação de atividade cardíaca, o que prejudicava o procedimento e não é, tanto quanto a encefálica, equivalente ao óbito.

Além do disposto no art. 22, examinado no tópico anterior, também o art. 7º trata da morte presumida, porém sem decretação de ausência, nos seguintes casos:

I — se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida;

II — se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até dois anos após o término da guerra.

Portanto, é presumida a morte quando do desaparecimento em situação de perigo ou, sendo comum, decorridos dez anos do sumiço. Esta presunção de morte ocorre com fins patrimoniais, de Direito sucessório.

Tudo que é presumido no Direito é altamente provável, mas não constitui certeza. Existe a possibilidade, portanto, de que o declarado morto regresse; nesse caso, não terá perdido seus direitos, e torna-se novamente titular de seu patrimônio.

Considerações sobre a Personalidade Jurídica Natural

A personalidade jurídica natural é a aptidão para titular relações jurídicas de direitos e deveres, obtida por todos ao nascimento, quando nos tornamos pessoas. Não é atribuída pelo Estado e sim reconhecida, sendo inerente ao ser humano, e cessa no evento de morte, seja fática ou presumida.

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