O Mestre da Escravidão

Ninka
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21 min readAug 13, 2018

Como a pornografia droga & muda nossos cérebros.

Enquanto alguns têm evitado usar o tempo “vício” no contexto de de compulsões ‘naturais’ como a sexualidade descontrolada, o hábito de comer além do necessário, ou participação em jogos de azar, vamos considerar evidências científicas no que diz respeito ao cérebro e ao vício.

Esse artigo vai procurar responder a duas perguntas: (1) Biologicamente, o cérebro é afetado pela pornografia e por outros vícios sexuais? (2) Se sim, e se esses vícios forem difundidos, eles podem ter também um efeito social?

A história da mariposa-cigana

Vamos começar com uma aparente digressão. Em 1869 a mariposa-cigana foi trazida para a América em uma tentativa de impulsionar a indústria da seda. Raramente boas intenções deram tão errado, quando o apetite imprevisto das mariposas por árvores deliciosas como os carvalhos, bordos e ulmeiros devastou florestas durante 150 anos. Várias tentativas foram feitas para destruir essa peste, mas o maior avanço veio nos anos 60, quando os cientistas notaram que os machos da espécie encontravam as fêmeas para o acasalamento seguindo o perfume que elas emitiam. Esse perfume é chamado de feromônio, e é extremamente atrativo para os machos.

Em 1971 foi publicado um artigo na Nature que descrevia como os feromônios eram usados para prevenir que as mariposas acasalassem. Os cientistas produziram esse feromônio em massa e permearam o ambiente das mariposas com ele. Esse perfume inaturalmente forte dominou a habilidade natural das fêmeas de atraírem os machos, e os machos confusos ficaram incapazes de encontrar as fêmeas. Um próximo artigo descreveu como o controle de população das mariposas foi alcançado ao “prevenir os machos da espécie de acharem parceiras”.

As mariposas-ciganas foram o primeiro inseto a ser controlado pelo uso de feromônios, que funcionam através de dois métodos. Um deles é chamado de ‘método da confusão’. Um pequeno avião espalha um número ambientalmente insignificante de pelotas de plástico embebidas com o perfume do feromônio. Então, como a jornalista científica Anna Salleh descreve, “o macho ou fica confuso e não sabe em que direção seguir para encontrar a fêmea, ou se torna dessensibilizado aos pequenos leveis de feromônio que as fêmeas naturalmente exalam e perdem o interesse de acasalarem com elas”.

O outro método é chamado ‘método da armadilha’: armadinhas embebidas no feromônio são armadas, e delas as mariposas não conseguem escapar; a mariposa macho entra à procura de uma fêmea, apenas para achar uma substituta fatal.

As duas Falácias

E o que isso tem a ver com a pornografia? A pornografia é um feromônio visual, uma droga poderosa de $100 bilhões de dólares por cabeça, que está mudando a sexualidade humana ao ‘inibir sua orientação’ e ‘desabilitar a comunicação pré-acasalamento entre os sexos ao permear a atmosfera social’, o que se dá especialmente através da internet. Eu acredito que estamos atualmente lutando contra a pornografia porque muitos ainda acreditam em duas falácias-chave:

  • Falácia número 1: A pornografia não é uma droga.
  • Falácia número 2: A pornografia portanto não representa um vício real.

Como uma ilustração da falácia número 1, considere a seguinte declaração de um executivo do Wall Street cuja principal companhia discretamente lucra com a pornografia: “Eu não sou um cara estranho ou um pervertido, esse não é meu jeito. Eu tenho filhos e família. Mas se eu posso ser um segurador de pessoas saindo por aí e fazendo dinheiro com pessoas sendo estranhas, hey, dinheiro é dinheiro. Eu não estou vendendo drogas. Esse aqui é o Wall Street”.

Agora considere ambas as falácias elucidadas na seguinte declaração de um executivo da indústria pornográfica:

O fato é que “drogas, bebidas e cigarros” são agentes físico- químicos que são ingeridos e podem de fato ter efeitos mensuráveis, danosos e viciantes. A mera visualização de qualquer tipo de conteúdo dificilmente cai nessa categoria, e, na verdade, diminui as batalhas muito reais que os viciados encaram com as drogas, álcool e cigarros — todos os quais podem ser letais. Ninguém nunca morreu de assistir pornografia. Embora alguns tipos compulsivos podem ser “viciados” em qualquer coisa, como por exemplo em assistir suas séries favoritas, tomar sorvete ou ir pra academia, ninguém sugere que sorvete é a mesma coisa que cocaína, crack (..) e precisam ser regulados para proteger.. as pessoas delas mesmas — ao contrário, esses atos compulsivos são visto corretamente pela sociedade como defeitos de personalidades em um indivíduo.

Aqui eu vou revisar um pouco da ciência a que ele se refere, discutir se a pornografia é ou não é um agente “físico e químico”, i. e., uma “droga”, e também considerar as mais recentes pesquisas sobre os sistemas naturais de recompensa no cérebro humano e sobre se a pornografia pode ser considerada como um vício cerebral real.

A “Grama da Adrenalina”.

Antes, eu gostaria de compartilhar uma experiência que minha família teve há alguns anos atrás em um safári na África. Enquanto estávamos em um passeio de carro seguindo o Rio Zamberi, nosso guarda comentou sobre a ‘grama da adrenalina’ crescendo nas margens do rio. Eu o perguntei porque ele usava o termo “adrenalina”, e ele começou a dirigir bem devagar pela grama. Abruptamente, ele parou o veículo e disse, “Ali! você está vendo?”

“Vendo o quê?”, eu perguntei. Ele dirigiu até mais perto, e isso também mudou o ângulo da luz.

E então eu entendi. Um leão estava escondido na grama observando o rio, apenas esperando uma “fast food” vir e buscar uma bebida.

Nós estávamos sentados em uma Land Rover aberta, sem portas ou janelas. Eu então entendi porque eles chamavam aquilo de “grama da adrenalina”, e eu senti meu coração pular. Meu córtex cerebral viu e definiu o perigo, que se registrou na parte autônoma e automática do meu sistema nervoso. O cérebro, que é uma laboratório farmacêutico muito eficiente, produziu o componente químico adrenalina, fazendo com que meu coração pulasse e disparasse em preparação para a sobrevivência. Eu estava pronto para correr se fosse preciso (não que isso me ajudasse muito com o leão).

Foi nos dito que, se ficássemos em nossos assentos e permanecêssemos bem parados, o leão iria olhar para a Land Rover como um todo e não nos ver como indivíduos. Felizmente, foi o que aconteceu no nosso caso.

Uma droga é uma droga

Interessantemente a adrenalina, ou a também chamada epinefrina, é uma droga que nós médicos usamos em cirurgias e em emergências para reiniciar os corações dos pacientes quando eles estão batendo devagar demais, ou até quando eles param. Então aqui está a pergunta: será que a epinefrina não é uma droga se o próprio cérebro a produz (fazendo com que o coração pule e acelere), mas ao mesmo tempo é uma droga se essa mesma substância é nos dada por um médico?

Ou considere a dopamina. Esse químico é um primo próximo da epinefrina, ambos são neurotransmissores excitatórios que dizem para nosso cérebro “!”. A dopamina é importante nas partes de nosso cérebro que nos permitem nos mover, e quando as partes produtoras de dopamina estão danificadas, isso resulta na doença de Parkinson. Para tratar o Parkinson, os médicos prescrevem dopamina como uma droga, e isso ajuda o paciente a se mover de novo. Então, dopamina é uma droga apenas quando um laboratório farmacêutico a produz, e não se o cérebro a produz para o mesmo propósito?

É claro que ambas são drogas em todo o sentido da palavra, não importando onde foram produzidas. Pertinentemente ao nosso assunto, acontece que ambas essas drogas são importantíssimas na sexualidade humana — e na pornografia e no vício sexual. A dopamina, em adição ao seu papel no movimento, é um neurotransmissor integral, ou uma droga cerebral, que age no sistema de prazer/recompensa do cérebro humano.

A perturbação na dopamina

Vamos revisar alguns componentes importantes do sistema de recompensa do cérebro. Do lado exterior está o córtex cerebral, uma camada de células nervosas que carrega pensamentos conscientes e volitivos. Na frente, atrás dos olhos, estão os lobos frontais. Essas áreas são importantes nos julgamentos, e, se o cérebro fosse um carro, os lobos frontais seriam os freios. Esses lobos têm conexões importantes com os caminhos do prazer, para que o prazer seja controlado.

No centro do cérebro está o núcleo accubens, ou NAc. Essa área do tamanho de uma amêndoa é o centro chave de recompensa por prazer, e quando é ativada pela dopamina e outros neurotransmissores, ela nos faz valorizar e desejar recompensas prazerosas. A dopamina é essencial para que os humanos valorizem e desejem o prazer apropriado durante a vida. Sem ela, não não teríamos incentivo para comer, procriar, nem mesmo para tentar vencer em um jogo.

É o uso exagerado do sistema de recompensa da dopamina que causa vício. Quando esses caminhos cerebrais são usados compulsivamente, ocorre um rebaixamento que na verdade diminui a quantidade de dopamina nas áreas de prazer que está disponível para o uso, e as células de dopamina começam elas mesmas a atrofiarem, ou encolherem. As células de recompensa no NAc estão agora famintas por dopamina e existem em um estado de necessidade por ela, enquanto um rebaixamento dos receptores de dopamina nas células do prazer também ocorre. Nesse estado viciante, a pessoa precisa agir sobre o vício para impulsionar os níveis de dopamina simplesmente para se sentir em um estado normal.

Enquanto a dessensibilização dos circuitos de recompensa continua, estímulos cada vez mais fortes são necessários para impulsionar a dopamina. Nos casos de vício em narcóticos, a pessoa viciada necessita aumentar a quantidade da droga para conseguir a mesma sensação. No vício em pornografia, são necessárias imagens progressivamente mais chocantes para estimular igualmente a mesma pessoa.

Danos nos lobos frontal

Como um tipo de feedback, os lobos frontais também atrofiam, ou encolhem. Pense nisso como como um desgaste nas borrachas de freio. Esse declínio físico e funcional no centro de julgamento do cérebro faz com que a pessoa fique prejudicada em sua habilidade de processar as consequências de agir sobre seu vício. Os cientistas do vício chamaram essa condição de ‘hipofrontalidade’, e notaram uma semelhança entre o comportamento de pessoas viciadas e o comportamento de pessoas com danos frontais no cérebro.

Neurocirurgiões frequentemente tratam de pessoas com danos nos lobos frontais. Em uma batida de carro, o cérebro do motorista frequentemente desacelera e se choca com a parte traseira de sua testa dentro dos ossos da cabeça, machucando os lobos. Pacientes com danos nos lobos frontais exibem uma constelação de comportamentos que chamamos de ‘síndrome dos lobos frontais’. Primeiramente, esses pacientes são muito impulsivos, no sentido que eles se engajam em atividades sem pensar, com pouca ou nenhuma preocupação com as consequências. Segundo, eles também são compulsivos; eles se tornam fixados ou focados em certos objetos ou comportamentos, e precisam tê-los, não importa o quê. Em terceiro lugar, eles se tornam emocionalmente instáveis, e apresentam mudanças de humor repentinas e imprevisíveis. E quarto, eles exibem um julgamento prejudicado.

Então a hiprofontalidade cortical, ou o encolhimento dos lobos frontais, causa também esses quatro tipos de comportamento, e estes podem resultar tanto de um acidente de carro quanto de um vício.

Um estudo sobre vício em cocaína publicado em 2002 mostra perda de volume, ou encolhimento, em diversas áreas do cérebro, particularmente nas áreas de controle frontais. Um estudo de 2004 mostra resultados muito similares para metanfetamina. Mas nós esperamos que as drogas danifiquem o cérebro, então esses estudos não nos surpreendem tanto.

Considere, no entanto, um vício ‘natural’, como comer exageradamente levando à obesidade. Você talvez se surpreenda ao saber que um estudo publicado em 2006 mostrou um encolhimento dos lobos frontais relacionados à obesidade que é muito similar do que foi encontrado no caso dos estudos da cocaína ou metanfetamina. E um estudo publicado em 2007, com pessoas que exibiam vícios sexuais severos, produziu resultados quase idênticos aos dos estudos sobre cocaína, metanfetamina e obesidade. (Encorajadoramente, dois estudos, um deles em vício em drogas [metanfetamina] e outro em um vício ‘natural’ ´[obesidade] também mostram um retorno aos volumes normais dos lobos frontais com o tempo de recuperação).

Então temos quatro estudos, dois sobre drogas e dois sobre vícios ‘naturais’, todos realizados em instituições acadêmicas diferentes com times de pesquisadores diferentes, e publicados em um período de 5 anos em quatro journals científicos revisados. E todos esses quatro estudos mostram que os vícios afetam fisicamente os lobos frontais do cérebro humano.

Vício é vício

Eu mencionei que os sistemas de dopamina não funcionam bem durante o vício, que eles ficam danificados. Esses danos, assim como os danos aos lobos frontais, podem ser vistos em escaneamentos cerebrais, como escaneamentos MRI, PET ou SPECT. Estudos recentes de escaneamentos cerebrais não apenas mostraram anormalidades nos casos de vício em cocaína, mas também em casos patológicos de vício em jogos de azar ou apetite exagerado levando à obesidade na sociedade.

Então ciência não-enviesada está nos mostrando que o vício está presente quando existe um comportamento destrutivo continuado não levando em conta as consequências adversas. Assim como foi declarado na revista Science, “quando falamos sobre o cérebro, uma recompensa é uma recompensa, não importante se ela vêm de um componente químico ou de uma experiência”.

E sobre a pornografia e o vício sexual? Dr. Eric Nestler, chefe das pesquisas de neurociência em Mount Cedar Sinai em Nova Iorque, e um dos estudiosos sobre vício mais respeitados no mundo, publicou um artigo na Nature Neurociência em 2005 com o título “Existe um caminho comum para o vício?”. Nesse artigo, ele diz que o sistema de recompensa da dopamina media não apenas o vício nas drogas, mas também “o que vínhamos chamando de ‘vícios naturais’ (isso é, consumo compulsivo de recompensas naturais) como o hábito patológico de comer exageradamente, compulsão patológica por jogos de azar, e vícios sexuais”.

A prestigiada Royal Society de Londres, fundada em 1660, publica a mais antiga revista científica do mundo, a “Philosophical Transactions of the Royal Society”, ou “Phil. Trans.”. Uma edição recente dedicou 17 artigos para o atual conhecimento sobre o vício. Interessantemente, dois dos artigos tratavam especificamente de ‘vícios naturais’, participação compulsiva em jogos de azar e apetite exagerado.

Aprendizado frenético

Drs. Robert Malenka e Julie Kauer, em um artigo referência na Nature em 2007 sobre os mecanismos das mudanças físico-químicas que ocorrem nas células cerebrais dos indivíduos viciados, disseram, “O vício representa uma forma patológica mas potente de aprendizado e memória”. Nos agora chamamos essas mudanças nas células cerebrais de “potenciação de longo prazo” e “depressão de longo prazo”, e falamos sobre o cérebro ser um órgão plástico, sujeito à mudanças e re-condicionamento.

Dr. Norman Doidge, um neurologista de Columbia, em seu livro “The Brain That Changes Itself” [traduzido como “ O Cérebro Que Se Transforma” n.d.t.], descreve como a pornografia causa um re-condicionamento dos circuitos neurais. Ele aponta que em um estudo de homens usuários de pornografia online, os homens se pareciam “assustadoramente” com ratos de laboratório puxando alavancas para receber cocaína nas caixas experimentais. Como esses ratos viciados, os homens estavam desesperadamente buscando a próxima dose, clicando com o mouse assim como os ratos puxavam as alavancas.

O vício em pornografia é um aprendizado frenético, e talvez esse seja o motivo pelo qual muitos dos que lutaram contra múltiplos vícios reportam que esse foi o mais difícil para eles superarem. O vício em drogas, mesmo que poderoso, é mais passivo no que diz respeito ao “pensamento”, enquanto a utilização da pornografia, especialmente na internet, é um processo bem mais ativo neurologicamente falando. A busca constante e a avaliação de cada imagem ou vídeo na sua potencia e efeitos é um exercício de aprendizado neuronal, limitado somente por um cérebro progressivamente mais condicionado. As curiosidades dessa maneira são fundidas com a compulsão, que a necessidade por uma maior dose de dopamina leva a pessoa da pornografia “soft-core” até a “hard-core” até a pornografia infantil — e coisas ainda piores. Um artigo publicado no Journal of Family Violence (“Revista de Violência Familiar”) em 2009 revela que 85% dos homens presos por pornografia infantil também tinham abusado sexualmente de crianças.

Sexualidade desumanizada

Em adição à hipofrontalidade cortical e o rebaixamento dos sistemas mesolímbicos e dopaminérgicos, um terceiro elemento parece ser importante nos vícios sexuais e em pornografia. A oxitocina e a vasopressina são hormônios importantes no cérebro no que diz respeito a performance física da sexualidade humana. Estudos mostram que a oxitocina é também importante para aumentar a confiança entre humanos, na criação de ligações emocionais entre parceiros sexuais, e em ligações parentais. Nós somos construídos para nos ligarmos ao objeto de nossa sexualidade.

É uma excelente coisa quando essa ligação ocorre em uma relação de casamento comprometido, mas existe um lado sombrio. Quando a gratificação sexual ocorre no contexto de uso da pornografia, isso pode resultar na criação de um tipo de “amante virtual”. Dr. Victor Cline, em seu texto “Pornography’s Effects on Adult and Child”(ou “Efeitos da Pornografia em Adultos e Crianças”), descreve esse processo da seguinte maneira:

Na minha experiência como um terapeuta sexual, qualquer indivíduo que regularmente se masturba com a pornografia corre o risco de se tornar, com um tempo, um viciado sexual, assim como corre o risco de se condicionar a ter um desvio sexual e/ou perturbar uma relação de ligação emocional com uma esposa ou namorada.

Um efeito colateral frequente é que isso também dramaticamente reduz sua capacidade de amar (por exemplo, resulta em uma dissociação marcada do sexo de uma relação de amizade, afeição, carinho, e outras emoções saudáveis normais e traços que ajudam e fortalecem relações conjugais). Seu lado sexual se torna, em certo sentido, desumanizado. Muitos deles desenvolvem um “estado de ego alien” (ou “lado negro”), cujo núcleo é uma luxúria antissocial destituída da maioria dos valores.

Com o tempo, a sensação obtida ao se masturbar com a pornografia se torna mais importante do que os relacionamentos da vida real…

Esse processo de condicionamento masturbatório é inexorável e não se retrai espontaneamente. O caminho tomado por essa doença pode ser devagar e quase sempre é escondido das visões alheias. Essa é usualmente uma parte secreta da vida de um homem, e como um câncer, ela continua crescendo e se expandindo. Raramente ela se auto-reverte, e é também difícil de tratar e curar. A negação por parte do homem viciado e a sua recusa a confrontar o problema são típicos e previsíveis, e isso quase sempre leva a uma desarmonia nos casais, algumas vezes ao divórcio e algumas vezes a quebra de outros relacionamentos íntimos.

Dr. Doidge nota, “Os pornógrafos prometem um prazer saudável e um alívio da tensão sexual, mas o que eles frequentemente entregam é um vício, e um declínio eventual da sensação de prazer. Paradoxalmente, os pacientes homens com os quais eu trabalhei frequentemente almejavam por pornografia mas não gostavam dela. No livro Pornified, Pamela Paul dá inúmeros exemplos disso, e descreve uma pessoa que decide limitar seu uso de pornografia, não por uma perspectiva moralista ou baseada na culpa, mas por causa de um desejo de novamente experimentar prazer em um relacionamento físico real com uma mulher.

“A impotência por pornografia”, onde um homem experiencia uma sexualidade preferencialmente na pornografia do que com uma mulher, é um fenômeno real e crescente. Quando o ímpeto sexual de um homem foi desviado de sua esposa dessa forma, escreve Dr. Cline, a esposa “pode facilmente perceber isso, e frequentemente se sente muito solitária e rejeitada”.

Um artigo do Journal of Sex and Marital Therapy (“Revista de Terapia Sexual e Marital”) descreveu um estudo mostrando que muitas mulheres vêem as atividades pornográficas de seus parceitos como “uma forma de infidelidade”:

O tema que percorre todas as suas cartas é que o homem levou todo o aspecto íntimo do relacionamento, da sexualidade, que é algo que deveria expressar a ligação de amor entre o casal e ser confinado exclusivamente para dentro da relação, e compartilhou isso com incontáveis mulheres fantasiosas. A vasta maioria das mulheres nesse estudo usou palavras como “traição”, “infidelidade” e “caso” para descrever a significância que o envolvimento de seus parceiros com a pornografia tinha para elas.

Um gancho triplo

Me deixe usar uma analogia com a pescaria para ilustrar alguns desses conceitos. Todo mês de agosto, se possível, eu tento estar no rio Unalakleet no Alaska pescando salmões prateados. Nós usamos uma isca em particular, um gancho triplo chamado de “Blue Fox pixie”. Como um pescador deve saber, é importante manter a corda solta logo depois de fisgar o peixe, quando ele ainda pode lutar muito. Quando o peixe se cansa, no entanto, nós puxamos a corda e aumentamos a resistência. Dessa maneira o peixe é puxado até o barco e preso na nossa rede.

De forma similar, a pornografia é um gancho triplo, consistindo da hipofrontalidade cortical, do rebaixamento dopaminérgico, e da ligação via oxitocina/vasopressina. Cada um desses ganchos é poderoso, e eles são sinérgicos. A pornografia libera esses ganchos bem rapidamente e profundamente, e enquanto o vício progride, ela progressivamente aumenta a tensão na corda da dopamina até que não exista mais jogo. A pessoa é puxada cada vez mais pra perto do barco, e da rede que a espera.

Desastre demográfico

Por que é essencial entender a natureza viciante da pornografia? Porque se a virmos como apenas um mau hábito, e não darmos àqueles que procuram cura o suporte completo que eles precisam para vencer qualquer tipo real de vício, nós vamos continuar sendo desapontados, como indivíduos e como sociedade. A pornografia é o tecido usado para tear uma tapeçaria de permissividade sexual que mina as própria fundações da sociedade. Biologicamente, ela destrói a habilidade de uma população de se sustentar. Ela representa um desastre demográfico.

A autor Tom Wolfe disse, “quanto maior a pornografia ficar, menores as taxas de nascimento ficarão”. Será que ele tem um ponto? Nos anos 50 todos os países que agora fazem parte da União Européia tinham uma taxa de fertilidade acima dos 2.1 necessários para se sustentar uma população. Agora nenhum deles apresenta essa taxa, e vários estão perto da taxa de 1.3 que é chamada de “a menor das taxas baixas de fertilidade”, da qual é perto de impossível de se recuperar. Foi no final dos anos 60 e início dos 70 que esse declínio começou, e isso corresponde exatamente aos primórdios da revolução sexual. Existe uma correlação direta entre uma crescente dominância cultural da revolução sexual e a diminuição das taxas de nascimentos, e enquanto uma relação de causa-efeito pode não estar provada, ela é fortemente suportada pelo ‘efeito feromônio’ da pornografia.

O declínio demográfico é, claro, multifatorial. Urbanização, mulheres no mercado de trabalho, adaptação dos papéis de gênero, e até mesmo uma maior expectativa de vida são alguns fatores importantes para as pirâmides populacionais invertidas. Mas os fatores primordiais, ou biológicos da sexualidade humana e estabilidade familiar são primários e, na minha opinião, não estão sendo pesados apropriadamente nas discussões.

Em 1934 o antropólogo de Cambridge, Dr. J. D. Unwin, publicou o Sex and Culture(“Sexo e Cultura”). Nesse trabalho ele examinou um total de 86 culturas, abrangendo 5.000 anos em respeito aos efeitos de ambos a contenção sexual e abandono sexual. Sua perspectiva era estritamente secular, e seus achados não foram baseados em dogmas morais. Ele descobriu que, sem exceção, as culturas que praticavam monogamia estrita nas relações maritais exibiam o que ele chamou de energia criativa e social, e atingiam o zênite da produção. Culturas que não tinham nenhuma restrição na sexualidade, sem exceção, se deterioravam na mediocridade e no caos. Na Houposia, “The Sexual and Economic Foundations of a New Society”(“As Fundações Sexuais e Econômicas de uma Nova Sociedade”), publicada postumamente, ele resumiu:

Nos registros humanos, não existe instância de uma sociedade retendo sua energia após uma geração completa ter herdado uma tradição que não insiste em uma continência pre- ou pós-nupcial.. A evidência é de que no passado uma classe se levantou a uma posição de dominância política por causa de sua grande energia e que nesse período em que se levantou, suas regulações sexuais sempre eram estritas. Ela reteve sua energia e dominou a sociedade enquanto suas regulamentações demandaram continência pré- e pós-nupcial…

Eu não conheço nenhuma exceção à essas regras.

A pornografia como um lança-chamas

Unwin também descreveu o que pode ser chamada de “distração dopaminérgica”, onde a procura do prazer domina e a produtividade é diminuída. Will Durant, em “The Lessons of History”(“As Lições da História”), escreveu que “o sexo é um rio de fogo que deve ser bancado e resfriado por uma centena de restrições se não for consumir em caos tanto o indivíduo quanto o grupo”.

Se “o sexo é um rio de fogo”, a dopamina e outras drogas cerebrais são o combustível. Como os astronautas da Apollo11, podemos usar esse combustível para alcançar o firmamento, ou sermos consumidos por seu fogo, dependendo de se estamos acima das engrenagens e em comando do módulo espacial ou debaixo dele, onde estamos expostos às chamas. O Dr. Henry A. Bowman disse, “nenhuma pessoa realmente inteligente vai queimar uma catedral para fritar um ovo, mesmo que seja para satisfazer um apetite voraz” — no entanto o lança chamas da pornografia está queimando muitas catedrais do amor marital, parental e familiar hoje em dia.

Eu aplaudo os esforços agora em progresso para fortalecer as leis, mas no nosso atual ambiente social e cultural, não podemos esperar pelo governo para as restrições. Nós precisamos encarar a realidade de que a pornografia vai afetar praticamente todas as famílias e pessoas de alguma forma. Dr. Jason Carroll e seus colegas publicaram um artigo muito citado no Journal of Adolescent Research que traz à luz o escopo desse problema. De acordo com esse artigo, que revisou dados provenientes de cinco universidades, 87% dos colegiais do sexo masculino e 31% das do sexo feminino vêem pornografia. Esses dados cruzam todas as barreiras religiosas, educacionais e sociais.

A pornografia se tornou o local de educação sexual para a maior parte da próxima geração, uma loja de doces na internet, e ela ensina que o sexo é daquela forma, inofensivo fisicamente e emocionalmente, sem consequências negativas. Homens e mulheres são meras drogas visuais para serem usadas e descartadas, e o sexo serve somente para seu prazer pessoal. A verdade, é claro, é que aqueles que estão performando sexualmente para fazer a pornografia são consumidos e depois descartados pelos pornógrafos; elas são “pessoas descartáveis”, como as chamou Dr. C. Everett Koop.

Ajuda para a cura

A descrição do Dr. John Mark Chaney sobre o vício em pornografia entre adolescentes é igualmente verdadeira para os adultos:

Os profissionais algumas vezes falham em entender o poder da compulsão que os jovens estão enfrentando, e não é incomum que profissionais escolares, religiosos ou do setor-privado advoguem sobre um plano de tratamento que é baseado em força de vontade e caráter moral. Como a pornografia pode ser um vício, essas abordagens de “apenas diga não” podem provavelmente criar mais frustração e ideações auto-destrutivas.. a modalidade de intervenção e de tratamento precisa reconhecer o problema como um vício completo, e tratá-lo com a mesma consideração dada aos vícios em álcool ou outras substâncias químicas.

Sobre a cura, Dr Victor Cline diz,

Eu descobri haverem quatro fatores principais que mais predizem o sucesso na recuperação. Primeiramente, o indivíduo deve estar pessoalmente motivado a se ver livre desse vício e possuir a disposição de fazer o que quer que custe para alcançar esse sucesso.. Você nunca pode forçar alguém a ficar bem se ela mesma não quiser.. Em segundo lugar, é necessário criar um ambiente seguro, que drasticamente reduz o acesso à pornografia e outros gatilhos sexuais.. Terceiro, a pessoa deve se afiliar a um programa de suporte de doze passos… E, em quarto, o indivíduo precisa selecionar um conselheiro ou terapeuta que possui treinamento especial e sucesso em tratar de vícios sexuais.

Vamos alcançar com nosso entendimento e empatia aqueles que já estão presos, que vivem em vergonha e segredo. Envergonhá-los não irá curá-los. Como Jeffery R. Holland disse quando era presidente da Universidade Brigham Young, “Quando um nadador abatido e cansado tenta bravamente alcançar as margens do mar, depois de ter lutado contra ventos fortes e ondas violentas que ele nem deveria ter desafiado em primeiro lugar, todos nós que podemos ter tido um julgamento melhor da situação, ou talvez só termos dado sorte, não devemos ir até ele e o espancar com nossos remos, ou empurrar sua cabeça de volta para a água”.

A filosofia secular também não irá curá-los, e o governo não pode também salvá-los. O segundo passo do programa de doze passos para viciados sexuais diz que aqueles que se curaram “começaram a acreditar que um Poder maior do que eles poderia os restaurar à sanidade”. Interessantemente, estudos revisados suportam o sucesso desse programa, que são baseados na ajuda de um Poder Maior.

De fato, a pesquisa de Unwin, conduzida por uma perspectiva secular, demonstrou que todas as sociedades avançadas estudadas, quando em seus ápices produtivos e culturais, construíram templos para quais que fossem os deuses que adoravam. Foi nessa subjugação do secular ao sagrado, do límbico para o lóbo, que eles tiveram um pico em auto controle e, portanto, na auto-determinação. Will Durant, que se descreve como agnóstico, também descobriu que não existe um “substituto moral” para a religião em prover esse temperamento do límbico.

A luta é ingressada

“Pessoas ‘são diferentes de’ produtos” — Fight The New Drug.

A pornografia é uma droga que produz uma armadilha neuroquímica viciante , “ Perdida a razão, e logo esquecida, Odiada razão, como isca lançada”, como Shakespeare colocou em seu Soneto 129. E sim, como vimos, sorvete e sexualidade podem ter similaridades com crack e cocaína.

Enquanto devemos continuar a lutar a boa luta legalmente e socialmente, estamos muito além de ter o “evitar” como nossa única defesa. A pornografia quer você, quer sua esposa ou esposo, quer seu filho ou sua filha, seus netos, seus agregados. Ela não compartilha bem, e ela não se vai facilmente. Ela é um mestre cruel, à procura de mais escravos.

Abraham Lincoln, quando confrontando uma guerra similar pela liberdade, disse, “Se todos não nos juntarmos agora para salvar o bom e velho barco da União nessa viagem, ninguém mais terá a chance de o pilotar em outra viagem”. Todas as mãos aos convés. Essa batalha é por sanidade e serenidade, paz e prosperidade, e por hoje, e por todos os nossos amanhãs. •

Donald L. Hilton, Jr., M.D. é um neurocirurgião praticante e associado clínico no Centro de Ciências da Saúde do Departamento de Neurocirurgia da Universidade do Texas em San Antonio. Ele e sua esposa, Jana, trabalham como missionários no LDS Serviços à Família trabalhando com vício em pornografia e vícios sexuais.

Link para o texto original. Texto traduzido livremente por mim ❤ Nina Cenni.

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Ninka
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Cursando PhD em Física. Lutando contra a exploração e violência sexual evidente e inerente à pornografia, prostituição e tráfico humano nas horas vagas.