Posso usar assets de outras pessoas no meu app? Introdução a Creative Commons e Direito Autoral

Rodrigo F. Gonzatto
Apple Developer Academy PUCPR
6 min readApr 13, 2022

Ao desenvolver um app, é normal sentirmos necessidade de utilizar outros materiais e recursos (assets, por exemplo). Mas é comum ficarmos em dúvida: o que eu posso e o que eu não posso usar?

Se eu fizer um app usando assets de terceiros, vou ter problemas?

Em geral você não vai conseguir publicar em lojas, como a App Store (embora possa ser que consiga enviar para o TestFlight) se você utilizar conteúdo de terceiros no seu app, sem ter autorização para tal. Basicamente porque isso significa que pode estar infringindo o direito dos autores/as de determinar os usos de suas obras.

Por isso, em geral, ao usar conteúdo de terceiros, a recomendação é: não use se não tiver alguma forma de garantir que pode ser usado.

Porém, nem todos os recursos criados por terceiros significam “problema” com Direitos Autorais. Pelo contrário: existe muito conteúdo foi feito para ser usado por qualquer pessoa, ou seja, que QUER ser usado, reutilizado e as vezes remixado.

Alguns repositórios e acervos onde você pode encontrar milhares de recursos (imagens, fotos, vídeos, ilustrações) que podem ser utilizados:

Ou, ainda, usando a busca do Google Imagens, por exemplo, com o filtro para mostrar apenas resultados com “Licenças Creative Commons”.

Captura de tela apresentando pesquisa no Google Imagens com filtro “Licenças Creative Commons”

Como eu sei realmente quais são os assets e recursos que “querem ser usados”? Bem, os mais confiáveis são os que possuem licenças públicas, ou seja, os que possuem uma explicação que diz exatamente que eles podem ser utilizados. São, por exemplo os que tem licenças Creative Commons.

Licenças Creative Commons

Esse vídeo é bem legal para explicar uma solução pro problema acima e para entender o que são Creative Commons: https://creativecommons.org/licenses/?lang=pt_BR

As licenças Creative Commons são licenças públicas justamente porque elas aparecem junto com as obras para deixar claro para outras pessoas o que elas podem fazer com a obra. Elas surgiram exatamente pra ajudar pessoas que querem que suas criações sejam usadas por outras pessoas. Com uma licença pública uma pessoa pode dizer, previamente, o que permite que outras pessoas podem fazer com sua obra criativa, e as outras pessoas, podem saber isso sem precisar pedir diretamente (toda vez) ao autor ou autora.

Abaixo, tem uma listinha dos principais liberdades e restrições dessas licenças, mas vale a pena aprender a ler as licenças CC no site da Creative Commons:

Six licences for sharing your Work. Creative Commons [Fonte]

Creative Commons é igual a gratuito?

Veja que as licenças Creative Commons estabelecem diferentes graus de liberdade de uso de uma obra criativa. Isso não tem necessariamente a ver com ser gratuito ou não. O importante é saber que algo que é gratuito não significa que é livre para uso.

E, apesar de geralmente ser gratuito, eu posso cobrar ou pagar por algo com licenças Creative Commons (obviamente, isso só vale para as licenças que não possuem restrição comerciais, ver a lista acima). Por exemplo, posso pagar para alguém fazer e deixar livre para todo mundo, posso cobrar para ter conveniência de acesso e usar depois o quanto eu quiser e até compartilhar.

Breve introdução ao Direito Autoral (e suas limitações)

Vamos a uma introdução. A lei do Direito Autoral regula, no Brasil, as questões de autoria para “obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro”.

Quando menciona essas tais “criações do espírito” está falando de obras literários, artisticas, científicas, sejam de teatro, música, audiovisual, fotografia, pintura, desenho… até sermões e programas de computador.

Atenção, direito autoral não exatamente o mesmo copyright, e bem diferente de patentes ou de registro de marcas. Todos fazem parte do que é chamado de propriedade intelectual, mas são outros mecanismos que regulam cada um desses.

Direitos morais e patrimoniais

Uma distinção básica ao se falar em direito autoral são os direitos direitos morais e patrimoniais. Toda obra e autor/a lida com os dois. Direitos morais é o reconhecimento de que quem é autor/a é autor/a. Isso é inalienável: não pode ser vendido ou transferido.

Art. 24. São direitos morais do autor:
I — o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria da obra;

Já os direitos patrimoniais dizem que você, que é o/a autor/a, pode vender a obra, que é sua, mas pode se tornar patrimônio para outra pessoa explorar comercialmente, por exemplo.

Exemplo: se você bateu uma foto e vendeu pra outra pessoa os direitos, você pode dizer que é a autor/a e a outra pessoa não pode negar isso, mas se vendeu os direitos, não pode revender por exemplo, você não tem mais esse direito.

Art. 28. Cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica.

Art. 29. Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades (…)

Direito autoral já está “funcionando”, agora mesmo!

O direito autoral tem caráter compulsório, ou seja, o/a detentor/a de direito autoral (autor/a) não precisa licenciar ou registrar: se criou, está protegido pelos Direitos autorais. Sim: no momento que você fez um desenho, ele é de sua autoria (Se alguém duvidas ou negar, a questão, é claro, é provar que você fez… dai começam os problemas rs)

Bem, como tudo que é criado é de alguém, se eu utilizar algo que é de direito de outra pessoa ela tem o direito de reinvidicar o direito (famoso processo). O problema é que com o passar dos anos, a complexificação dessas relações na sociedade, junto a difusão dos computadores e da internet, cada vez todas as pessoas precisam utilizar coisas criadas por outras para coisas básicas: escrever um texto ou fazer um convite de aniversário, ou para criar um site ou um aplicativo.

Acesse o PDF dacartilha O que você precisa saber sobre Licenças CC

Para entender melhor sobre como funciona o Direito Autoral, recomendo essa cartilha introdutória acima, O que você precisa saber sobre Licenças CC, que explica bem legal sobre direitos autorais.

Direito autoral e Creative Commons

Para usar algo feito por outra pessoa eu preciso de uma autorização dessa pessoa para utilizar a obra. Esse uso pode ser pago (direitos patrimoniais) ou não. Um problema maior ainda surgiu: ter que pedir para os/as autoras/es se eu posso utilizar toda vez… e é por isso que surgiu o Creative Commons!

Creative Commons não estabelece nenhuma regra diferente das que já constam no Direito Autoral. Basicamente é uma forma de facilitar com que pessoas exerçam seus direitos, dentro da lei. Só que facilitando para quem quer compartilhar, ao invés de restringir acesso (já que restrição é o que vem por default).

As licenças Creative Commons explora várias possibilidades das limitações já estabelecidas pela Lei de Direito Autorais, como por exemplo, consta capítulo IV — Das Limitações aos Direitos Autorais da lei. Por exemplo:

III — a citação em livros, jornais, revistas ou qualquer outro meio de comunicação, de passagens de qualquer obra, para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, indicando-se o nome do autor e a origem da obra;

VIII — a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos de obras preexistentes, de qualquer natureza, ou de obra integral, quando de artes plásticas, sempre que a reprodução em si não seja o objetivo principal da obra nova e que não prejudique a exploração normal da obra reproduzida nem cause um prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores.

Art. 47. São livres as paráfrases e paródias que não forem verdadeiras reproduções da obra originária nem lhe implicarem descrédito

Claro, existem em outras questões… e esta é só uma introdução a um tema difícil! Para curiosas e curiosos, o capítulo IV — Das Limitações aos Direitos Autorais da lei é bem interessante, porque mostra várias coisas que não são infrações aos direitos autorais: você sabia que não é problema aos direitos autorais adaptar qualquer obra para braile? Ou que lá também tem um item que explica porque jornais copiam noticias de outros jornais? Vale a pena dar uma olhada diretamente na própria lei!

Este artigo foi apoiado pelo programa PPI Softex/, Convênio nº 0200–12/2021/SOFTEX/PPI/PUCPR/Res TIC5, financiado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações com recursos da Lei nº 8.248, de 23 de outubro de 1991.

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Rodrigo F. Gonzatto
Apple Developer Academy PUCPR

palavras-chave: Design de Interação, Tecnologia & Sociedade, Mediações para a Liberdade, Culturas Digitais