Spes

Dando vida a um Indie Game

Bruno Imai
Apple Developer Academy PUCPR
11 min readNov 1, 2022

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Criar um jogo não é uma tarefa fácil, são diversas etapas que se iniciam na idealização, com a criação do conceito e no que será abordado no seu jogo seguido da sua história, arte, mecânicas, programação, marketing, etc. E como se tudo isso já não fosse suficiente, quando colocamos a palavra Indie nessa história as coisas se complicam ainda mais, pois para se obter um produto final que se destaque em meio a um mar de outros jogos, que na maioria das vezes possuem um orçamento e uma equipe muito maior, é necessário ter mais carinho e atenção com a sua criação e isso demanda tempo e empenho.

Mas mesmo com isso em mente e um prazo de apenas 6 meses, eu e minha equipe, Alis Frentzel, Caroline Revay, Thiago Medeiros e Luísa Trabulci, da Apple Developer Academy, decidimos aceitar esse desafio e criar um jogo mobile que fosse completo, tanto em sua jogabilidade quanto na sua beleza, e assim criamos a Caramel Studios, o nosso estúdio para desenvolvimento de jogos Indie, para assim seguirmos a nossa jornada.

Os Primeiros Passos

O inicio de tudo

Para ter as primeiras ideias a respeito do que seria o nosso projeto utilizamos o método do CBL (Challenge Based Learning), que, explicando de maneira breve, se trata de uma metodologia cíclica baseada em desafios para a resolução de um problema, e seguindo cada uma das suas etapas chegamos a esse resultado:

Processo de Engage utilizando o método CBL

Após completar a primeira parte do CBL tínhamos já concretizado em nossa equipe que gostaríamos de retratar um problema ambiental contemporâneo, mas tínhamos em mente que teríamos que achar o balanço entre o educacional e o divertido, se pendêssemos demais para o lado educativo ele poderia ficar "entediante", dessa forma, se não fizéssemos uma história impactante e uma gameplay divertida acabaria passando a impressão de ser somente um slideshow educacional interativo. Do outro lado, se pesássemos a balança para o lado da diversão o nosso jogo poderia se tornar somente um jogo casual simples, uma diversão momentânea que não agregaria em nada ao nosso jogador.

Para resolver isso chegamos a conclusão que deveríamos focar em satisfazer ambos os lados, iriamos retratar algum problema ambiental em nosso jogo, mas com uma camada de fantasia para nos dar mais liberdade para desenvolvermos mecânicas, ambientes e personagens que fugissem das amarras do mundo real. E assim nos sentimos preparados para começar o desenvolvimento do nosso pequeno universo…

A Narrativa

Fantasia e realidade em paralelo

Uma narrativa bem construída para o nosso jogo é um ponto de extrema importância, é com ela que vamos sensibilizar e prender a atenção do jogador, assim facilitando seu aprendizado e permitindo que a nossa mensagem não se torne algo maçante.

Desde o princípio nós já sabíamos que iriamos criar um novo mundo para dar um aspecto mágico a ele, queríamos algo fantástico. Mas ainda não havíamos decidido qual seria o problema que seria retratado, passamos por inúmeras ideias que foram desde poluição nos oceanos até a destruição do habitat natural de animais, porém tudo parecia vago para nós além de que já havia muitas outras obras que retratavam tais problemas, queríamos mostrar um problema que estivesse fora dos holofotes mas que fosse igualmente relevante e assim chegamos após muita pesquisa em um tema que agradasse a todos. Espécies Invasoras.

Falando de forma breve, espécies invasoras são grupos de indivíduos de uma determinada categoria de seres vivos que são levados, normalmente de forma artificial por humanos, a um outro ambiente que não é o seu natural. Isso traz inúmeros desequilíbrios na fauna e flora do local, pois esses animais não vão possuir predadores naturais e assim poderão destruir todo o ecossistema do local.

O Peixe-Leão é um exemplo de espécie invasora que tem se tronado um grande problema no litoral brasileiro.

Desta forma esse problema encaixou muito bem em tudo que queríamos, é um problema extremamente relevante, é pouco conhecido e poderíamos escrever uma história boa sobre ele. E assim já havíamos decidido qual era o nosso problema mas ainda faltava o ponto de como seria retratado esse tema para que o jogador entendesse a sua importância? Como faríamos se envolver com esse problema? Para resolver essa questão, buscamos formas de criar o nosso mundo de maneira que todos todas as consequências a respeito de espécies invasoras poderiam ser abordadas de uma perspectiva diferente, e assim decidimos que íamos botar o jogador na pele da vítima desse problema.

E assim ficou mais claro como a nossa história iria se seguir, teríamos que criar um personagem principal que fosse a vitima de alguma consequência das espécies invasoras, mas ainda possuísse alguma representatividade humana em si, para que assim fosse mais fácil de se ver em nosso personagem e afeiçoar-se a ele. E assim criamos o nosso pequeno protagonista.

Nosso protagonista em sua versão mais atualizada

Ele possuí uma estética mais agradável e de certa forma fofa para gerar um apego imediato ao jogador, que ao explorar o nosso mundo conhecerá muito mais a respeito da sua cultura e do seu mágico mundo. É através dos olhos do nosso pequeno que o jogador irá presenciar o lado de uma espécie que tem seu lar destruído por uma criatura que não deveria haver ali. É através das vivencias do protagonista que os paralelos com o nosso problema real serão traçados.

Mecânica de jogo

Uma jogabilidade pautada em sua história

Uma boa mecânica de jogo não pode ser apenas divertida, ela tem que transmitir para o jogador a principal mensagem do jogo, mesmo que o jogo não possua uma história propriamente dita, um bom exemplo disso é o clássico jogo Pong. Por mais que não possua linhas narrativas, diálogos e nem mesmo personagens, em Pong fica claro que o objetivo central de sua mecânica é transmitir para o jogador a sensação de competição de um jogo esportivo, é botar você contra o outro em uma competição cada vez mais frenética.

Imagem do clássico Pong (1972)

Da mesma forma que o Pong, gostaríamos que a nossa narrativa fosse refletida em sua jogabilidade, para ressaltar o lado de vitima do personagem principal chagamos a conclusão que uma mecânica de combate ou algo semelhante não faria tento sentido, queríamos passar a ideia de uma presa que tem como sua principal forma de sobreviver a fuga. Com isso em mente chegamos a conclusão que o jogador deveria ter mecânicas que envolvessem agilidade e pudessem transmitir a identidade de uma criatura que utiliza de movimentos rápidos para fugir de seus perigos e assim o nosso protótipo de jogabilidade começou a tomar forma.

Havíamos definido que agilidade seria um dos nossos focos, mas como fazer isso se encaixar em nosso jogo? Um animal ágil é algo comum, temos muitos exemplos na natureza, se usássemos apenas isso deixaríamos de usufruir de uma das nossas ferramentas, o conceito de fantasia e magia de nosso mundo. Pensando nisso resolvemos trazer a magia para a jogabilidade, e se o principal responsável pela destreza do nosso protagonista fosse um elemento que não pertencesse ao mundo real? E foi com essa indagação que resolvemos realçar a fantasia e colocar como principal mecânica do nosso jogo a manipulação do vento.

Prototipação das mecânicas envolvendo a manipulação do vento.

Esse "poder" incumbido ao nosso personagem justificava sua mobilidade, nos possibilitando inserir mecânicas mais comuns a jogos plataforma como, salto duplo e"dashes" em diferentes direções e além disso, possibilitava formas únicas de interação do vento com outros objetos (como utilizar ele para velejar ou para se propulsionar com planadores).

Exemplo de animação envolvendo a manipulação de vento

E assim tínhamos a nossa principal mecânica planejada, mas incorporar isso a um smartphone é uma tarefa difícil: como possibilitar tantos comando em um dispositivo que era ao mesmo tempo o controle e a tela? Para resolver isso buscamos ao máximo deixar os comando simples, definimos que uma das metades da tela seria responsável para a movimentação (com um joystick invisível), e a outra, para controlar toda a nossa gama de habilidades, aceitaria o toque como forma de pulo e o "swipe" para corresponder ao vento, assim, na direção que o jogador fizesse o deslizar na tela (se o jogador estiver no chão) o vento corresponderia e seria mandado na mesma direção, porém se o jogador já estivesse no ar o vento o impulsionaria o personagem para manda-lo para a mesma direção, assim configurando o "dash".

Demonstração de pulo e dash em nosso ambiente de teste in-game (Versão Alpha)

Level Design

Pavimentando os caminhos da jornada

A criação de um level design normalmente é subestimada, a maioria das pessoas não tem ideia da dificuldade que é criar e desenvolver o caminho que será trilhado pelo jogador. A primeira visão que a level-designer tem é a mesma de um pintor olhando para uma tela branca, onde começar? Em que ponto parar? Quais serão os obstáculos? está muito fácil ou difícil demais? Todas essas perguntas rodeiam a mente no início dessa etapa do projeto e são respondidas somente após (Muitos) testes.

Criar e recomeçar é parte do cotidiano de um level-designer é necessário haver de antemão um certo desapego com o próprio trabalho, pois mesmo a primeira ideia do formato do mapa pode parecer completa na mente de seu criador, mas após um simples teste várias falhas que não foram percebidas brotam por todo lado. No caso do nosso jogo não foi diferente, mudamos o mapa inúmeras vezes, cada uma das vezes visando uma melhoria. Assim chegamos a conclusão que essa etapa só teria um ponto final após todas as outras etapas serem concluídas, pois a cada modificação de mecânica, design e até mesmo de narrativa pode ocasionar em uma mudança no mapa e no caminho do jogador.

Primeiro esboço do level design da DEMO do jogo

A principal obrigação da arquitetura do mapa é ensinar o jogador suas mecânicas e cobrar que o jogador as domine para passar obstáculos e chegar ao seu fim. Na primeira idealização ja tivemos isso em mente ao monta-la e mesmo antes da sua produção tivemos os primeiros problemas, o primeiro dele foi que se fosse colocado os itens na escala correta precisaríamos de uma DEMO muito maior que o planejado, e necessitaríamos fazer que ela fosse feita para ensinar todas as nossas mecânicas base de maneira divertida e ainda introduzisse o mundo e o nosso personagem. Então decidimos que a nossa DEMO retrataria o lar do protagonista, criando o contexto para seus poderes, mostrando mais a respeito de sua espécie e dos seus costumes para assim ficar mais natural o aprendizado do jogador.

Primeira versão revisada de média fidelidade

Após alguns testes chegamos a um mapa mais refinado que já trazia para si uma expressão das necessidades que precisávamos que ele resolvesse. Já haviam áreas respectivas para cada mecânica, uma maior verticalidade, e o fato dele ser cíclico, o que foi um ponto muito importante, pois queríamos que o jogador tivesse liberdade de escolha para usufruir e explorar a vila da maneira que quisesse.

Mas mais uma vez, após testes, chegamos a alguns problemas, a câmera do jogo estava com um comportamento estranho em algumas áreas, outros terrenos estavam muito apertados ou difíceis demais, porém o maior de todos os problemas foi a falta de objetivos, a exploração do mapa estava extremamente monótona, não havia objetivos que estimulassem a exploração ao redor de tudo, e mais uma vez voltamos a mesa de planejamento para chegar a uma resolução para esse problema.

Versão revisada da Vila

Percebemos, com os ajustes do level design, que a precisávamos revisar e evoluir outros aspectos do jogo, percebemos que deveríamos inserir mais NPCS (personagens não jogáveis) no jogo para trazer uma parcela maior da narrativa em recompensa do jogador achar esses personagens, teríamos que inserir uma mecânica de dialogo melhor no jogo e vimos a necessidade de dar recompensas em locais que só são acessíveis com maior domínio dos comandos e exploração do jogador.

A produção do level-design ainda não foi encerrada, mas todo tempo gasto em sua produção não foi em vão. Após a bateria de testes de gameplay, percebemos várias fragilidades que estavam presentes no nosso jogo, foi por conta dela que observamos a necessidade de novas mecânicas e mudanças na narrativa do nosso jogo.

A Arte em Spes

Os primeiros esboços de um novo mundo

A face de um jogo é pautada pela sua arte, é ela que vai ter a obrigação de chamar a atenção no primeiro olhar do jogador, ela tem o poder de deslumbrar ou intrigar. Sendo assim definimos que possuir um estilo de arte chamativo seria um dos principais chamarizes do nosso jogo, seria a arte o principal suporte da nossa narrativa.

Sendo assim as nossas ilustradoras tiveram um importantíssimo e difícil papel, elas teriam que imaginar um jeito de transmitir a nossa história na tela de um smartphone. O processo não foi simples e demandou muito tempo e esforço para ser realizado, e definir como seria esse mundo foi o primeiro passo.

Moodboard para definição da estética no Mapa

Após muita pesquisa de referências e discussões vários pontos que deveriam ser destacados na estética foram levantados: Deveríamos trazer a magia e a natureza para o mundo sem se prender a amarras lógicas ou a escalas do mundo real, o ambiente deveria se muito vivo, e a vila em si deveria ser um ambiente acolhedor, etc. Tudo isso foi criado já pensando com base na narrativa, no mapa e na gameplay, sendo assim os primeiros esboços foram produzidos.

Evolução do processo da criação de um fragmento do mapa

Foram feitas várias modificações para corresponder as necessidades que foram surgindo ao decorrer do projeto, tudo para melhorar a forma com que o jogador observa o mundo, a ideia de parallax foi utilizada para dar uma impressão de profundidade ao nosso jogo, cada camada tem a sua responsabilidade e todas elas compõem entre si um mundo mais completo.

Esboços da criação do nosso protagonista

Entretanto a arte do nosso jogo não se limita a apenas ao mundo, todo um trabalho foi feito no personagem para passar as ideias já apresentadas na narrativa, cada parte dele desenvolvida teve uma razão para ser criada; Seus chifres demonstram a idade de sua espécie, sua bandana oferece uma personalidade única a ele, sua capa é uma folha herdada de seu irmão, ele é magro e esguio para demonstrar a sua destreza e etc.

As animações no nosso mundo foram um dos nossos enfoques, um dos pilares do nosso personagem é a sua destreza e leveza, isso deveria ser refletido em suas ações. Assim muito tempo foi gasto pensando em fazer as animações serem mais fluidas, para que a velocidade seja mostrada da melhor forma e o vento ser representado.

Em breve

Esse post será atualizado conforme o desenvolvimento do projeto, muito obrigado pelo seu tempo.

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Bruno Imai
Apple Developer Academy PUCPR

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