Ideação: como fugir do brainstorming
“Para onde vamos?” — é uma pergunta que você já deve ter escutado alguma vez na vida. Ou qualquer variação de pergunta que abre o espaço para mil possibilidades que um grupo de pessoas pode dar como resposta. E isso desde de quando éramos crianças. O processo de geração de ideias é constante em nossas vidas e, consequentemente, o brainstorming também.
Por mais que você não tenha ouvido esse nome antes, essa tal da tempestade de ideias (tradução do termo apresentado acima) é uma técnica contínua, por vezes imperceptível e, certamente, intrínseca ao ser humano. Estamos cotidianamente aplicando ela, mesmo quando não tão perceptível como em um processo de design.
Desta vez, estou em um time desenvolvendo Naturia, uma solução para iPad que objetiva ensinar e conectar pessoas com a flora através da ilustração. E tomamos a decisão de colocar em foco o aprendizado de cada pessoa do time lado a lado com a construção do produto. Assim, por querer aprender sobre diferentes técnicas de estimular a criatividade, iniciei uma pequena revolução: fugir da tempestade de ideias durante a ideação.
Novos meios de estimular a criatividade
Afinal, não só de brainstorming se vive um processo de geração de ideias! Nessa busca por novos meios de estimular a criatividade, me deparo com a coletânea de ferramentas idealizada por David e Tom Kelley, fundador e parceiro da IDEO: Build Your Creative Confidence (ou do português, Construa Sua Confiança Criativa).
Essa coletânea sintetiza exercícios do livro — de quase mesmo nome — que baseia a coletânea, Creative Confidence. Que traz como propósito estimular qualquer pessoa a liberar seu potencial criativo. E foi assim que achamos a ferramenta "A Sessão de Sonhos e Queixas".
Sessão de sonhos e queixas
The Dream/Gripe Session, originalmente, é uma ferramenta que auxilia na definição de um problema para se trabalhar. Mas que ao invés de focar em conversas que falem apenas de desejo como as coisas fossem ou apenas dos problemas em si, ela tenta traduzir essas discussões em desafios de pensamento criativo. Desse modo, ela ajuda a escolher qual problema enfrentar.
Para sua aplicação, como instruído pela IDEO, é necessário um grupo em número par, podendo ser te qualquer tamanho, artefatos para anotação (mais especificamente papel e caneta) e de 15 a 30 minutos para se dedicar à dinâmica.
Diferentemente da proposição da ferramenta, o time de Naturia já não estava a procura de definir um problema, mas sim em estabelecer quais funcionalidades o nosso produto precisaria ter. Por isso, adaptamos a dinâmica de sonhos e queixas para nosso contexto.
1º passo
Decida um tópico para a discussão. Este que tanto pode ser para resolver questões internas, como a falta de comunicação entre setores, quanto sobre questões externas, como a dificuldade em conseguir um meio de transporte para pequenas viagens.
No caso de Naturia, por já estarmos imersos na criação do produto, focamos o tema do debate na necessidade de ter um meio criativo para relaxar.
2º passo
Escolha sua dupla e decidam quem será a primeira pessoa a falar. A outra pessoa, consequentemente, será responsável pelas anotações.
3º passo
A primeira pessoa fala de seus sonhos e reclamações por 5 a 7 minutos, enquanto sua parceira ouve e toma notas do que foi dito.
Adaptação: Pelo nosso time ser composto por um número ímpar de pessoas, tomamos a decisão de fazermos sessões de pitchs, onde cada uma de nós iria ter a sua vez enquanto todas as outras faziam o papel de escuta-la e tomar notas.
Outra alteração necessária para nosso uso foi que, em cada um dos pitchs, a pessoa do time não falava de seus sonhos e reclamações, mas sim os da persona criada durante nosso processo de imersão e pesquisa da criação do produto.
Assim, tivemos resultados como:
Sonho: “Gostaria de ter mais atividades fora de casa que me ajudassem a relaxar.”
Reclamação: “Minha rotina é tão caótica que sinto dificuldade em ser criativa no dia a dia.”
4º passo
A parte da dupla responsável por anotar reformula os sonhos e reclamações em desafios de inovação. Ao final, espera-se que seja escrito de 3 a 5 desafios para compartilhar com sua dupla.
Uma dica para essa parte é iniciar a frase com “Como podemos… ?”. Por sua vez, uma boa pergunta de “Como podemos” foca no problema sem enviesar para uma solução, tendo que ser abrangente na medida certa para que inúmeras ideias possam ser geradas.
Por exemplo:
Sonho: “Gostaria de ter mais atividades fora de casa que me ajudassem a relaxar.”
Desafio: “Como podemos estimular pessoas a saírem de casa como um meio de relaxamento?”
Reclamação: “Minha rotina é tão caótica que sinto dificuldade em ser criativa no dia a dia.”
Desafio: “Como podemos propor atividades rápidas que estimulem a criatividade?”
5º passo
A dupla troca de papéis. Quem estava responsável pelos sonhos e reclamações, agora anota e, quem estava escrevendo os desafios de inovação, fala.
6º passo
Ao final, compare as listas de todos os desafios de inovação criados. Procure por temas semelhantes, assuntos em comuns e padrões. Isso vai ajudar na decisão de qual desafio escolher.
Adaptação: Após a comparação e seleção dos desafios de inovação que mais faziam sentido com o contexto de nosso produto, iniciamos uma fase extra de responder a cada um desses “Como podemos… ?” com possíveis features.
Durante esse processo de identificar qual seria a melhor solução para entrega de desejo e de solução do problema, discutimos como cada ideia de feature se encaixava na jornada do produto e da pessoa usuária, e de que modo trazia valor para ela.
Considerações
Ao final da dinâmica, não saímos apenas com uma lista de funcionalidades — bem embasadas — para Naturia, mas com duas experiências que o produto iria propor para as pessoas. O que transformou todo o resto de nosso processo de criação em uma busca para transmitirmos criatividade, relaxamento e curiosidade para nosso público alvo.
E isso, sim, se deve ao fato de termos nos proposto a experimentar e adaptar a ferramenta idealizada pela IDEO e termos escapado, nesse exato momento de ideação, de mais um brainstorming — que naturalmente nos acompanhou em inúmeros outros instantes.
Assim, essa (fuga, ou melhor…) experimentação não trouxe apenas uma satisfação pelo resultado obtido, mas ainda mais pela descoberta de um novo meio de estímulo ao nosso potencial criativo.
