Livro: Diários de Bicicleta, David Byrne

Lucas Marchesini
Aprendi com o livro
3 min readAug 9, 2017

David Byrne é conhecido do grande público por ter feito parte dos Talking Heads. Se você gosta de sair a noite, provavelmente já escutou Psycho Killer. Aquela voz é do David Byrne.

Talvez você não goste de música internacional e conhece Byrne por conta do seu envolvimento com Tom Zé (ele basicamente redescobriu o baiano) e Caetano Veloso.

E não é que parece um diário mesmo?

Ou então você é ligadx em arte contemporânea e já viu algum trabalho dele por aí.

Todos esses assuntos são abordados no livro dele (prefaciado por Tom Zé, olha lá), mas no fim das contas, “Diários de Bicicleta” fala de urbanismo. Inspirado no formato de Verdades Tropicais (de Caetano Veloso), ele faz reflexões pessoais baseadas na sua experiência de ciclista urbano, que começou na década de 80 quando, segundo ele, os bacanas da cidade (NY) achavam bicicleta uma coisa cafona.

Ao relatar como é usar uma bicicleta em cidades tão diversas quanto Nova York, Buenos Aires, Manila e Berlin, os pensamentos de Byrne se encaminham naturalmente para o urbanismo e na adoção da bicicleta como um meio de transporte válido.

Aqui, um aparte: se você torceu o nariz para a última frase, não desista. Não se trata de falar que a bicicleta é a redenção da humanidade, o único caminho possível para o nirvana ou um atalho para a erradicação da fome. Trata-se de buscar soluções para problemas prementes da humanidade. Se você pretende estar vivo nos próximos quinze anos, ou ama alguém que estará vivo, sugiro que passe a se preocupar com isso. Parto do pressuposto que qualquer pessoa com o mínimo de espírito coletivista já pensa no assunto.

Voltando: Em meio a suas experiências e reflexões, Byrne apresenta uma série de argumentos lógicos que já estão na mesa em prol do incentivo ao uso de bicicletas. São tanto benefícios individuais (saúde, ganho de tempo, economia) quanto sociais (menor emissão de poluentes, melhoria do trânsito). Entretanto, o ponto principal, para ele, não é nenhum desses.

Para ele, o maior ganho é a sensação de liberdade e pertencimento a um espaço. O argumento parece um tanto abstrato e maluco quando apresentado assim, mas ele faz sentido após duzentas páginas de construção, vai por mim.

Uma experiência pessoal: tem alguns meses que eu tenho tentado usar a bicicleta como principal meio de transporte. É uma adaptação, até porque a minha cidade (Brasília), mesmo contando com ciclovias mais ou menos decentes (mais para menos), ainda não é lá muito amigável ao ciclista. A sensação de liberdade e pertencimento é real. Andar de carro simplesmente não se compara com andar de bicicleta (ou a pé).

O carro não te dá a sensação de estar no lugar. Você flutua de um ponto a outro. Já de bicicleta ou a pé, você faz parte do ambiente e os problemas do ambiente se tornam seus problemas, você está em contato. Esse contato naturalmente leva a pensamentos e percepções apenas possíveis para quem está presente ali, ou seja, para quem não está em um carro.

Enfim, não se trata de obrigar todo mundo a andar de bicicleta. Inclusive porque cada realidade tem a sua solução e é necessário levar em conta aspectos como renda e densidade habitacional. Trata-se de dar igualdade de condições na escolha de como se locomover. E se você pensar que o carro custa um bom dinheiro e, por consequência, não é acessível a toda a população, valorizar outros meios de transporte — transporte público de massa, principalmente — torna-se uma obrigação moral.

--

--