Livro: The High Cost of Free Parking, Donald Shoup

Lucas Marchesini
Aprendi com o livro
4 min readNov 22, 2017

Toda eleição em Brasília é a mesma coisa: para resolver o problema da falta de vagas na capital do Brasil, candidatos prometem a construção de mais estacionamentos públicos e gratuitos. O senso comum nos diz que mais vagas resolvem o problema. Errado, defende Donald Shoup em “The High Cost of Free Parking” [O Alto Custo do Estacionamento Gratuito]. Baseado em muitas pesquisas, próprias e de outras pessoas, o acadêmico americano argumenta que oferecer gratuitamente vagas de estacionamento faz com que a sociedade (leia-se: eu, você e todo mundo) pague para quem tem carro ter onde guarda-lo quando sai de casa. É justo?

Em outras palavras, Shoup considera que oferecer vagas gratuitas é, no fim das contas, um subsídio para o uso do carro. Partindo da velha máxima de que não existe almoço grátis , ele aponta que se não é o usuário que está pagando pela vaga que ocupa, então somos todos nós. E como isso acontece? O preço é repassado escondido dentro de outros. Sabe, por exemplo, quando aumenta o imposto da gasolina e o preço na bomba aumenta também? O princípio é o mesmo.

O repasse do preço é feito porque a terra tem um custo e o custo da terra é um dos fatores que formam todo e qualquer preço (os produtos vendidos na internet podem ser mais baratos, em teoria, porque não precisam arcar com o custo de uma loja física, por exemplo). O problema é que não há diferenciação de preço para quem vai a pé ou de ônibus para algum lugar. Essas pessoas pagam o mesmo preço cobrado de quem vai de carro e usa um estacionamento. Pode se presumir com alguma segurança que quem usa o carro como meio de transporte tem uma renda maior do que os que optam por outros modos de transporte. Ou seja, quem tem mais dinheiro é subsidiado por quem tem menos.

Esse incentivo ao carro traz outras consequências, como congestionamento e poluição. Esses impactos são considerados custos sociais na economia porque impõem um dano que não é diretamente monetário. “Estacionamento gratuito em uma cidade congestionada cria um benefício pequeno e temporário para os poucos motoristas que são sortudos em um dia específico, mas cria custos sociais enormes para todo mundo, todos os dias”, aponta Shoup.

Ok, problema identificado, mas quais são as soluções? Shoup aponta três medidas que, usadas em conjunto, podem resolver o problema:

1) Cobrar pelas vagas que hoje são oferecidas gratuitamente. O preço deve ser regulado de acordo com a demanda, de modo a fazer com que a ocupação seja, em média, de 85% do total de vagas oferecidas. Esse número não é aleatório. Ele permite o uso eficiente do recurso enquanto mantém parte das vagas a disposição, o que diminuiria o tempo gasto na procura de lugares para parar o carro. Isso começou a ser feito em San Francisco com a participação do próprio Shoup.

2) Usar o dinheiro obtido na comunidade em que ele foi gerado. Além de justa, essa medida ajudaria, inclusive, a diminuir a resistência a uma proposta polêmica como a de cobrar por algo que até então era oferecido gratuitamente. Uma possibilidade, por exemplo, é usar o dinheiro para melhorar as outras formas de transporte.

-3)Acabar com o requerimento mínimo de vagas quando se constrói um edifício. Quase toda cidade tem isso e no DF não é diferente . Esses requerimentos, argumenta Shoup, transferem para o cliente do estabelecimento comercial, quer ele use carro ou não, o custo das vagas. E o custo é mais alto do que deveria ser porque os cálculos para a exigência mínima de vagas são mal feitos, arbitrários e levam em conta a demanda máxima, o que significa que ficam vazios a maior parte do tempo.

Para trazer essa discussão a Brasília, é necessário cuidado porque, pelo menos no Plano Piloto, a maior parte das vagas são em estacionamentos públicos. Pelo menos aqui, o debate deveria focar na cobrança pelo uso desses estacionamentos e no uso desses recursos.

Aumentar o número de vagas públicas, o que alguns candidatos com certeza prometerão nas próximas eleições, servirá apenas para piorar um problema que já é grande no DF. Enquanto no Brasil a média de carro por habitante é de 25 para cada 100, no DF é de 55 para cada 100. E como poderia ser diferente em uma cidade pensada para o automóvel?

Antes de reclamar da cobrança por vagas que hoje são gratuitas, pense se é justo alguém que não tem carro pagar para você ter onde parar o seu. Não adianta reclamar de tudo que há de errado e não fazer nenhum esforço para abrir mão de seus próprios privilégios. Um spoiler para quem topar: funciona.

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