O Poço

Luísa Rezende
Araetá
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4 min readMay 8, 2020

Estamos passando por momentos difíceis confinados dentro de casa. Muitas vezes, sinto um vazio e necessidade de me ocupar. Porém, confesso que ao mesmo tempo que gosto de conteúdos mais “tolos”, também sinto a vontade de algo que me faça refletir. Sendo assim, eu e minha paixão por filmes, assistimos “O Poço”. É sobre ele que venho aqui escrever. Apenas escrever não, venho também trazer uma análise crítica dos dias de hoje.

Como estamos em casa durante o tempo todo, caso você tenha interesse, assista o filme no serviço de Streaming Netflix em qualquer momento do seu dia! Aposto que você irá gostar e fazer grandes reflexões.

Cuidado! Alerta de spoleir!!

As cenas de “O Poço” ocorrem em um futuro distópico e possibilitam uma metáfora com a nossa realidade. Em uma prisão vertical, duas pessoas habitam o andar e a cada mês são trocadas de nível, podendo subir ou descer. A comida é distribuída por uma plataforma que vem de cima, e só passa uma vez por cada andar. Logo, quem está acima come melhor, enquanto quem está abaixo fica com menos comida ou nem come, por conta do esgotamento.

O protagonista, Goreng, se depara com regras individualistas que criam intrigas e desigualdades entre as pessoas, despertando um lado primitivo em cada ser. Afinal, o filme, assim como nossa realidade é um “Salve-se quem puder”.

Fazendo uma correlação do filme com a sociedade capitalista, posso dizer que somos modulados a agir de forma egoísta, violenta e individualista, podendo até despertar a capacidade de matar o próximo à fim de garantir a nossa sobrevivência. O neoliberalismo, defensor da liberdade de mercado, contribui para que a autogestão de recursos seja liderada por poucos, e esses são considerados superiores que acabam com a parte mais farta, no filme, a comida.

Se pararmos para pensar, assim como no poço, a administração que gere o sistema mantém a ideia de que suas ações são positivas, porém não são suficientes, e por isso, um grupo é beneficiado. Isso se relaciona com o que Freud denomina como negação, em que o sujeito não aceita a verdade e nega sua existência. Nossa realidade é formada por aparências em que não se dá devida importância a verdade, mas sim ao que apenas parece ser, onde a qualidade prevalece sobre a quantidade.

O protagonista, influenciado pela solidariedade espontânea, olha para os níveis abaixo e é impulsionado a embarcar em uma missão para descer até os níveis superiores encarando as duplas, pensando em distribuir comida para os mais necessitados. As pessoas tomadas pelo egoísmo e medo, não alteram seus modos de enxergar a situação e permanecem ignorando todas as diferenças e desigualdades como se nada estivesse acontecendo. Mais uma vez, retrata a nossa sociedade, onde o cada um de nós é influenciado pela massa, ou seja, quando imersos na multidão nos sentimos mais poderosos e damos mais valores a atitudes destrutivas, alimentando uma diferenciação egóica. Onde está nossa individualidade? Somos seres místicos.

Nossas particularidades se perdem em meio a sociedade como uma tentativa de sobrevivência e adequamento aos padrões. No filme isso acontece, quando cada personagem tem de levar um objeto consigo para o poço. Goreng escolhe levar o seu livro Dom Quixote, enquanto outras pessoas levam espadas, facas e cordas. Entretanto, será que se Goreng soubesse o que iria encontrar, teria mesmo levado seu livro?

Através de aspectos profundos, sombrios e escuros o filme questiona as bases da civilização, deixa a mensagem sobre o nosso processo de individuação, sobre a luta desumana pela sobrevivência, mas também uma oportunidade de solidariedade.

O momento que estamos vivendo, a pandemia causada pela COVID-19, vai de encontro com o filme pois traz o clima de salve-se quem puder e faz com que isso penetre no nosso cotidiano e gere uma desconstrução da ordem social. Insufladas pela realidade, nós nos acostumamos com a desigualdade social, com os privilégios de classe, com a individualidade, com o egoísmo e com o medo. Diante de uma pandemia histórica, onde vamos parar?

Entretanto, gosto de pensar positivamente e procurar uma luz no fim do túnel. E isso é o que o filme também nos permite fazer, pois á uma criança no último andar que é a esperança, a mensagem de que é possível buscar outro caminho e resgatar nossa essência ferida em meio a tanta incerteza, medo e mortes.

Mais uma vez digo que vale muito a pena ver! Ficou curioso? Que tal dar uma lida no link a seguir:

O protagonista, Goreng assustado com o desespero de Trimagasi se alimentando para garantir o “dia de amanhã”.

A qualidade da comida se sobressai sobre a quantidade. Logo, uns tem muito, outros pouco.

A contraposição entre os objetos que cada um leva para o poço: faca versus livro.

Luta para sobreviver.

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Luísa Rezende
Araetá
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Meu nome é Luísa, tenho 19 anos e sou estudante de relações públicas na FAAP, em São Paulo. Usarei esse espaço para compartilhar meus pensamentos e anseios.