High Flying Bird
Arthur dos Santos Martinez
High Flying Bird (2019) é um longa dirigido pelo norte-americano Steven Soderbergh, e nele é possível perceber que seu objetivo é demonstrar o que acontece por “debaixo dos panos” da maior liga de basquete do país e do mundo (NBA). Porém, ao longo do filme são abordados temas que estão em evidência na sociedade como o racismo, por exemplo, e, nesses momentos, se pode perceber que não só o basquete está envolvido na história, mas sim verdadeiros preconceitos que se fazem presentes no esporte e como isso pode influenciar diretamente na vida de um atleta.
O filme em si apresenta uma proposta exótica e ousada, mesclando alguns momentos da história com entrevistas com jogadores reais — estes relatam pelo que passaram na mesma época em que o jogador retratado está passando, que é justamente essa passagem do basquete universitário para o profissional — e essa audácia de deixar o filme se assemelhando ao documentário se dá pelo fato do risco que esses jogadores podem causar à entidade esportiva, podendo denegri-la em algum momento, resultando em relatos não muito empolgantes.
Como tudo gira em torno do agente Ray Burke (André Holland) tentando satisfazer seu cliente Erick Scott (Melvin Gregg), o filme passa boa parte de seu tempo mostrando o quão difícil será desbancar os ‘ricos homens brancos’ e como Ray irá traçar seu caminho tratando seus clientes como pessoas e não como degraus para conseguir a maior quantia de dinheiro possível. Mas após toda essa luta contra as gigantes empresas, o filme acaba, sem dar ao espectador uma conclusão de tudo aquilo que foi abordado.
O lado do marketing também fica muito explícito, com a busca constante de acordos monetários por parte de Ray, que se encontrava em uma posição um tanto quanto complicada no que diz respeito à finanças.
Ao longo do enredo, percebe-se que o basquete em si não é o foco do filme, sendo pouco representado nas cenas, colocando em jogo muito mais a questão intelectual do que a física propriamente dita. Essa estratégia acaba por não chamar muito a atenção de audiência, mas sua intenção é extremamente válida e admirável, visto que não se sabe muito ou quase nada do que ocorre nas entrelinhas do esporte. A proposta de mostrar que nem tudo são mil maravilhas também pode ser encontrada no filme “Um Homem entre Gigantes”, estrelado por Will Smith. Nele, de uma forma mais explícita, é retratado como a liga de futebol americano (NFL) não presta nenhuma ajuda aos jogadores aposentados, que apresentam sequelas graves causadas pelas duras batalhas dentro de campo ao longo de suas carreiras.
Também vale mencionar que o primeiro cliente de Ray foi seu primo que, gay assumido, foi advertido pelo próprio agente a esconder sua orientação sexual para não afetar futuros negócios. Ray conta que seu primo — este não retratado no filme — desistiu do esporte precocemente e acabou morrendo cedo, não contando os motivos, dando a entender que homossexuais não têm espaço no mundo esportivo, fazendo com que muitas vezes o atleta esconda sua orientação sexual. Existem sim homossexuais no esporte, mas são pressionados a não mostrar essa parte da vida à mídia, dando a impressão de que esses não existem nos esportes. Vale mencionar o francês Olivier Giroud, campeão da última Copa do Mundo FIFA pela França, que, quando perguntado sobre essa questão, disse “é impossível se declarar homossexual no futebol”, e também cita que com alto índice de testosterona presente nos vestiários, com os chuveiros coletivos, por exemplo, fica realmente difícil expor a verdade.
O que se pode perceber juntamente às críticas sociais no filme é como o racismo é abordado. O personagem Spencer, representado pelo ator Bill Duke, faz o papel de um treinador de basquete para crianças do bairro em que reside, e sempre que alguém faz alusão à escravidão, imediatamente o autor do comentário há de dizer “Eu amo Deus e todos seus filhos negros”, pregando respeito e harmonia entre seus alunos.
Como já dito, o verdadeiro foco do filme não é o basquete, e isso fica bem claro no longa. O que é retratado é muito maior que isso, mostra que mesmo com o avançar do tempo e nossa constante evolução, pensamentos arcaicos ainda imperam na sociedade.
Levando isso tudo em consideração, o filme passa a impressão de ser um “teste” para futuros filmes, uma espécie de cobaia. Não é um filme ímpar no que se refere à qualidade, longe disso, mas faz você ver com outros olhos esses gigantes do entretenimento esportivo que parecem perfeitos e intocáveis. Tomara que esse seja um ponto de partida para mais longas com tons críticos e reveladores.
Onde o filme se encontra: Netflix (mensalidades à partir de R$19,90 até R$37,90). Serviço sob demanda, pode-se assistir em qualquer hora, em qualquer lugar.
Quando: 29 de janeiro de 2019 (estreia mundial). Sem previsão de saída do catálogo
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