O Frenético Dancin’ Days

Por Bianca Valéria Martingo Vizzotto

Bianca Valéria M Vizzotto
Araetá
6 min readMay 14, 2019

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“Abra as suas asas, solte suas feras, caia na gandaia, entre nessa festa!”¹. Não há nada como a alegria e a farra das discotecas… Mais ainda, não há nada como a liberdade e a felicidade encontradas na Dancin’ Days dos anos 1970… Pelo menos é isso que se conta da lendária boate carioca. Também é isso que é mostrado no mais novo musical de Nelson Motta e Patrícia Andrade, dirigido por Deborah Colker, “O Frenético Dancin’ Days”. Com a sua estreia no Rio de Janeiro em 24/08/2018, veio para São Paulo em 14 de março deste ano no Teatro Opus (que fica no shopping Villa Lobos) e pretende ficar até 19 de maio — com chances de ter sua temporada estendida.

Cartaz do musical “O Frenético Dancin’ Days”

“O Frenético Dancin’ Days” conta a história por traz da discoteca homônima, com seus fundadores e sócios Nelson Motta, Scarlet Moon, Djalma, Dom Pepe, Leonardo Netto e a fictícia Dona Daisy (apesar de ser inspirado em fatos reais, há diversos elementos dentro da peça de caráter ficcional). Mostra a trajetória da casa, com a sua fundação, crescimento, auge e seu fechamento apenas 4 meses depois. Expondo os percalços que tiveram que atravessar sempre com alegria, o musical foca principalmente na liberdade existente dentro da boate. Permitir a experimentação dessa tal liberdade — em plena ditadura militar — era o principal objetivo dos donos e, em realidade, o próprio conceito por trás da estrutura da casa noturna (“Na nossa festa vale tudo; vale ser alguém como eu, como você!”¹). Além disso, mostra a criação do grupo musical Frenéticas e como elas ficaram conhecidas por causa da Dancin’ Days. É interessante frisar também a sub-trama que envolve Motta e a sua paixão pela esposa de seu empregador (o dono do shopping no qual a boate estava localizada), pois rende as cenas mais belas do espetáculo inteiro.

Elenco da peça (Foto: Leo Aversa)

A direção, as atuações e o canto estavam simplesmente maravilhosos. Com vocais poderosos, os atores entregaram personagens extremamente carismáticos, divertidos e contagiantes — tudo que uma peça sobre uma discoteca precisa ter –, sempre rodeados de um ambiente escuro e cheio de luzes neon que remetiam realmente a uma boate. O cenário era simples, mas satisfatório: tudo, desde palanques que simulavam o salão da casa noturna até um Empire State Building no meio do palco ou um globo espelhado gigante, criava uma atmosfera de sonho e de idealizações de um passado que não volta mais (seja de uma festa da noite passada, seja de uma nostalgia de uma época especial — os anos 1970). O figurino também merece considerações: apesar de não ser fiel ao período retratado (podemos ver apenas algumas referências históricas, como a clássica calça boca de sino), são coloridos, alegres e passam a ideia da tal liberdade tanto defendida ao longo da trama de forma clara e divertida. As Frenéticas, no entanto, têm trajes muito semelhantes a roupas usadas em seus shows.

As Frenéticas, Scarlett Moon, Dom Pepe, Djalma e Dona Daisy (Foto: Leo Aversa)

O roteiro é interessante, cativante e animado, mas pouco elaborado (apenas peca na falta de profundidade). Não que um musical de comédia necessite de um enredo extremamente aprofundado, mas, em alguns aspectos, “O Frenético Dancin’ Days” se mostra excessivamente raso. Qualquer questão discutida com um propósito maior é entregue literalmente pela boca das personagens, através de diálogos ou monólogos. A escolha das músicas também poderia ter sido feita com mais cuidado. Quase todas foram hits dos anos 1970, o que deu à trama mais ainda aquele ar nostálgico que tanto a caracteriza e que tanto amamos. Entretanto, houve momentos em que é sentido um excesso. Diversas vezes, ao longo dos dois atos, foi possível notar números musicais completamente desnecessários (como algumas músicas dos anos 1950 cantadas pela Dona Daisy) ou simplesmente extensos em demasia, que, em vez de ajudarem a contar a história, apenas dificultavam a sua progressão. O elemento mais decepcionante da peça, não obstante, foi a coreografia. Preparada pela aclamadíssima Deborah Colker (que também foi responsável pela direção geral) junto com Jacqueline Motta, era de se esperar danças inovadoras, bonitas e diferentes, mas não foi isso que pudemos ver. Em uma tentativa fracassada de trazer demais a trama para o presente, as coreógrafas esqueceram o ponto mais central: os passos tradicionais de discoteca. Apontar para cima e para baixo, cruzar em X os olhos com as os dedos ou girar os punhos em círculos de um lado para o outro são coisas que vemos muito pouco durante as danças. Isso, em um musical que se passa entre 1976 e 1977, é algo que faz muita falta. O que salva a coreografia são os números — belíssimos — em que são exibidos os dotes da contorcionista Natasha Jascalevich (Bárbara, esposa do dono do shopping).

Cena final de “O Frenético Dancin' Days” (Foto: Leo Aversa)

Apesar do roteiro simplório e da decepcionante coreografia, “O Frenético Dancin’ Days” é um espetáculo extremamente divertido e exuberante, que vale muito a pena ser visto. As discussões presentes relacionadas à liberdade (política, sexual etc.), que já existiam há quase 50 anos dentro da Dancin’ Days, são exploradas pela peça com propriedade, que as inova e as traz para os dias de hoje. Acima de tudo, o musical consegue transportar a alegria, que era a energia das discotecas dos anos 1970, o que torna a nossa experiência, como espectador, algo emocionante e memorável. “Dance bem, dance mal, dance sem parar! Dance bem, dance até, sem saber dançar! Dance bem, dance mal, dance sem parar! Dance bem, dance até, sem saber dançar!”¹.

Ficha técnica

Texto: Nelson Motta e Patrícia Andrade

Direção geral: Deborah Colker

Elenco: Bruno Fraga (Nelson Motta), Larissa Venturini (Scarlet Moon), Cadu Fávero (Djalma), Franco Kuster (Léo), André Ramiro (Dom Pepe), Stella Miranda (Dona Dayse), Ariane Souza (Madalena), Gabriel Manita (Geraldo / Inácio / Catarino), Natasha Jascalevich (Bárbara), Carol Rangel (Frenética Edyr de Castro), Ester Freitas (Frenética Dhu Moares), Ingrid Gaigher (Frenética Lidoca), Júlia Gorman (Frenética Regina Chaves), Larissa Carneiro (Frenética Leiloca), Ludmila Brandão (Frenética Sandra Pêra), Karine Barroso (Vera / swing feminina), Rômulo Vlad (Bailarino / Tenente Möeller), Andrey Fellipy (bailarino), Isadora Amorim (bailarina), Elio Barbe (bailarino / Capitão Matoso), Eddy Soares (bailarino), Júlia Strauss (bailarina) e Rogger Castro (bailarino e Tony Manero)

Direção Musical: Alexandre Elias

Coreografia: Deborah Colker e Jacqueline Motta

Cenografia e direção de arte: Gringo Cardia

Desenho de luz: Maneco Quinderé

Figurinos: Fernando Cozendey

Visagismo: Max Weber

Assistente de direção: Gustavo Wabner

Colaboração artística: Toni Platão

Produção de elenco: Cibele Santa Cruz

Produção geral: Joana Motta

Gerente de Produção Opus: Graziele Saraiva

Direção de Produção: Renata Costa Pereira e Edgard Jordão

Produção Executiva: Vanessa Campanari

Realização: Irmãs Motta e Opus

Serviços

Onde: Teatro Opus | 4º piso do Shopping Villa Lobos | Av. das Nações Unidas, 4777 — São Paulo

Quanto: Ingressos de R$37,50 a R$170,00

Quando: Sextas-feiras, sábados e domingos às 17h e 21h

Até quando: Temporada prevista até 19/05/2019

Link para a página do Teatro Opus:

Link para compra de ingressos on-line:

¹Trechos da música “Dancin’ Days

Artista: As Frenéticas

Álbum: Caia na gandaia (1978)

Composição: Nelson Motta e Rubens Queiroz

Gravadora: Warner Music Brasil

Eu indo em um bailinho com temática dos anos 1950 (2005)

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