O Silêncio dos Outros

Humberto Nunes de Santana Crispim

Humberto Crispim
Araetá
4 min readMar 11, 2019

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Pôster em inglês do longa
Pôster espanhol do filme

Vencedor dos prêmios de Melhor Documentário (Goya), Prêmio do Público e Prêmio Cinema pela Paz (68° Festival de Berlim), o documentário espanhol O Silêncio dos Outros (El silencio de otros) conta a luta pela justiça de pessoas que sofreram brutalmente na ditadura de Francisco Franco.


Dirigido por Almudena Carracedo e Robert Bahar e produzido por Pedro Almodóvar, o longa centra-se em quatro figuras: Maria Martín, uma senhora cuja mãe foi executada há 80 anos, durante a Guerra Civil Espanhola, e enterrada numa vala comum, que hoje se encontra debaixo de uma estrada; María Mercedes Bueno, uma mulher que teve um filho declarado natimorto em 1981, porém não recebeu nenhum documento médico para provar o óbito e nunca viu o corpo do bebê; José María “Chato” Galante, que foi cruelmente torturado pela ditadura por sua militância republicana e vive a metros da pessoa que o torturou; e Ascensión Mendieta, outra senhora cujo pai foi executado e enterrado em uma vala comum.

“Chato” Galante, um dos quatro protagonistas, em sua antiga cela
Maria Martín no local onde o corpo de sua mãe foi desovado

Francisco Franco chegou ao poder após a vitória da sangrenta Guerra Civil em 1936. “Reinou” até 1973 e, em 1977, finalmente houve eleições gerais na Espanha. Também em 1977, foi aprovada a Lei de Anistia, que libertou os presos políticos e permitiu a volta dos exilados, mas garantiu impunidade a todos que cometeram crimes contra a humanidade e violaram os direitos humanos durante a Guerra Civil e a ditadura franquista. Essa lei instituiu o “pacto do esquecimento”, decisão de não comentar as atrocidades cometidas pelo Estado espanhol.

Francisco Franco em 1939
Francisco Franco em 1975, ano de sua morte

Carracedo e Bahar foram os únicos componentes da equipe de filmagem numa produção que durou 7 anos. Isso, de acordo com eles, foi feito para criar intimidade, e se provou extremamente eficaz. As histórias são mostradas como gritos de socorro para que não nos esqueçamos delas. Além da intimidade, o filme faz uso da poesia visual para contemplação e reflexão, frequentemente utilizando o monumento às vítimas da ditadura localizado no Vale do Jerte, um dos poucos que existem no país.

O Silêncio dos Outros é um filme de extrema importância. Ele representa o que o documentário é em sua totalidade ao revelar histórias trágicas e poderosas, que são combatidas ferrenhamente por aqueles que dizem se satisfazer com o esquecimento. Porém, vemos ao longo do filme que há uma grande celebração por uma parcela da população no que se refere a Franco e seus seguidores. Ao passo que as vítimas buscam justiça, torturadores andam livremente e possuem monumentos, ruas e praças em sua homenagem. É agonizante escutar os relatos das sessões de flagelação, da dor de não poder enterrar um ente querido com dignidade ou da incerteza da existência de um filho vivo.

Vala comum com restos mortais de mais de 200 pessoas vítimas do franquismo
Abadia da Santa Cruz do Vale dos Caídos, monumento em memória aos nacionalistas mortos na Guerra Civil Espanhola e local de descanso de Franco

O documentário consegue tocar o espectador com uma montagem inteligente e fotografia refinada que sustentam as histórias trágicas. A todo momento somos lembrados da dificuldade que é tal odisseia pela justiça, mas pontuais vitórias nos fazem sair da sala de cinema com um pouco de esperança.

Onde: Espaço Itaú de Cinema — Augusta
Quanto: Meia — R$ 17,00; Inteira — R$ 34,00
Quando: Sessões — 14:30 e 21:30
Até quando: 13/03 (de acordo com o site Ingresso.com no momento em que essa crítica foi escrita)

Humberto Crispim, autor da crítica

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