Rodrigo Amarante faz show em São Paulo com a casa cheia, apresenta canções inéditas e deixa seu recado ao público que aponta o celular: “Acredita na memória, sem ela nada vai existir aqui”
Maria Júlia Giovanini
Rodrigo Amarante faz seu show solo em São Paulo, quarta-feira (24) no Estação Rio Verde, encanta a casa lotada na cidade que segundo o músico, é a que mais ouve suas canções, apresenta músicas inéditas e a cantora britânica Cornelia Murr.
O músico que mora em Los Angeles há quase 10 anos onde diz se reconhecer como estrangeiro, tendo se mudado após hiato da banda Los Hermanos, aproveita vinda ao Brasil e faz curta turnê de três shows solo no Brasil, em Salvador, São Paulo e Rio de Janeiro.
Cornelia abre o show e mostra suas composições ao público dividindo o palco com seu teclado e sua guitarra de seu primeiro lp “Lake Tear of the Clouds” lançado em dezembro de 2018. Antes, o público especulava “o show começa as 21h.” “não, o show começa as 21h30” “mas o Amarante começa as 22h”, a incerteza dos que ocupavam o lugar mais próximo do palco gerava ansiedade acompanhada de expectativa. Alguns testes no palco sendo realizados, os bastidores que quase nem eram bastidores aconteciam ao alcance da percepção do público, via-se o músico passeando pelo mezanino e quem estava embaixo inclinava o pescoço para acompanhar a inquietude de antes da apresentação com os olhos.
Rodrigo Amarante sobe ao palco para apresentar o show de abertura de Cornelia Murr. “Com vocês: a incrível Cornelia Murr”, que entra sorrindo no palco e cessa de vez as especulações de que horas iniciaria, 21h45. Cornelia canta sua primeira música e ganha a plateia que apreciava admirada a performance da artista desconhecida pela maioria, arriscando frases em português entre uma canção e outra, Cornelia confessa que passou o final de semana anterior todo a sua chegada ao Brasil treinando a língua portuguesa pelo aplicativo Duolingo, então acabou aprendendo poucas frases e algumas delas não sabia em que situação usar, mas em inglês mesmo fez questão de olhando envolta as cortinas e janelas arrojadas do local que tinha ares de uma caverna, dizer que aquele era o lugar mais bonito que ela já havia se apresentado, seguidos de muitos “obrigadas” conforme era ovacionada. Depois de cantar quase todas suas músicas de estreia como “Man on my mind” chamou ao palco sua “surpresa” para cantarem juntos a próxima canção “Tokyo Kyoto”, Rodrigo Amarante e Cornelia Murr dividiam o palco nesse momento, não as atenções, um acompanhando o outro, a canção se fez nessa junção, uma presença a parte.
Terminada a canção e com a saída dos dois músicos do palco, começam novamente as movimentações de preparo para a entrada de Rodrigo Amarante, trocadas as guitarras e mudados os pedestais de microfones de lugar, entra o músico, 22h30, fim dos burburinhos curiosos do público que fica extasiado e canta junto num francês não muito fidedigno, a música Mon Nom, do álbum Cavalo (2013), mais importante que saber pronunciar era participar da música. Amarante apresenta músicas novas que segundo ele estarão no seu próximo disco previsto para ser lançado no começo de 2020, qual não foi o espanto do músico ao perceber que um rapaz já sabia decor a letra de uma dessas composições novas. “Nem eu sei a letra, e o rapaz já sabe, agora já sei pra onde devo olhar quando esquecer alguma parte” disse Amarante cumprimentando o rapaz que estava localizado bem próximo do palco. Quando toca Um Milhão, resolve ali mesmo que vai enfim gravar a música e diz brincando, “vou atender esse pedido”, já que o público se animou e cantou junto. Enquanto se preparava para cantar e tocar no teclado a música Cavalo, Rodrigo Amarante percebeu muitos celulares posicionados fotografando e filmando inclusive do público que estava bem próximo dele, e incomodado perguntou “Filmar pra quê? Pra quem? O que é a fotografia sem a memória?”. Recebeu gritos vindos de vários lugares da plateia apoiando o questionamento do cantor, disse que quando se saca o celular, se ausenta do lugar onde se está e direcionou também a ele mesmo sua própria provocação.
O show tem que continuar, ainda mais um show como esse. Prossegue cantando músicas do seu álbum Cavalo e dedica uma delas, Maná, para sua irmã que estava ali “pra você Má”, composta para ela a música foi um dos momentos mais contagiantes do show e essa contaminação visualmente era percebida pela dançante plateia que acompanhava “hoje a dança te quebra o feitiço” e que até o momento estava mais para contemplativa. Outra música familiar e animada, intitulada não por definitivo de Pai e Mãe, Amarante dedica e aponta para seu pai que sorri de volta do mezanino. Depois da euforia, mas ainda sem sair desse estado de graça o qual se encontrava a plateia, e atendendo ao pedido do rapaz que sabia decor as músicas recentes, Amarante canta Tardei e crava aí, o ar emocionante que o cantor consegue criar em unidade com a plateia, e cantando, o músico se direciona para alguém que transborda em lágrimas essa emoção.
“Obrigada por cada um de vocês, que em algum momento decidiram estar aqui agora, ocupados comigo, isso é valioso, obrigado mesmo” diz Amarante estando para encerrar o show. Divide o palco novamente com a encantadora Cornelia e juntos performam I Found A Reason, balada romântica da banda Velvet Underground. Em tom de leveza e de um quase charme, um ar de agradecido pelo presente, pelo agora, e isso atingindo com intensidade o público, Rodrigo Amarante antes de sair do palco canta Evaporar e em uma parte que diz “aprender a dar, foi o que ganhei” com o rosto expressivo afirma com veemência sua frase musicada. Termina o show, 00h00, Amarante sai de fininho e deixa o público boquiaberto pedindo por mais.
R. Belmiro Braga, 119 — Pinheiros, Estrella Galícia Estação Rio Verde
24 de abril de 2019, abertura da casa: 21h.
Ingressos: R$160,00/R$80,00 (meia solidária)