Um testemunho escrito

Leonardo Vacaro

Leo Vaccaro
Araetá
3 min readMay 31, 2020

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A Written Testimony” é primeiro álbum do artista Jay Electronica, lançado em 2020. Álbum este que era esperado à anos e acabou gerando certas controvérsias. Contendo apenas 10 músicas e uma duração de quase 40 minutos, suas músicas refletem sobre racismo, morte, fama, família e algo que está estampado na capa do próprio álbum, sua religião.

A Written Testimony (Um Testemunho Escrito)

O álbum foi principalmente criticado por não cumprir as expectativas criadas por mais de uma década, a participação de JAY-Z também não foi algo que agradou os fãs, que trouxeram a tona a parcela que este teve no álbum, e como que o projeto se encaixaria mais em um grupo do que algo individual.

A primeira faixa do álbum é, na verdade, um monólogo do ministro Louis Farrakhan, líder da “Nação do Islã”, acompanhado de um piano e um orgão que remetem a músicas soul de igreja. Ele fala da origem do povo negro e sua relação com o Islamismo e Israel, refletindo também sobre racismo e supremacismo branco, mas o que poucos devem saber, é que ele também é abertamente crítico ao judaísmo, sendo considerado por alguns como antisemita.

A partir da segunda música o artista entra em campos mais comuns do hip hop atual, em Ghost of Soulja Slim, os dois Jay’s falam sobre violência policial e a morte do rapper Soulja Slim, assassinado em 2003 com 4 tiros, 3 na cabeça e um no peito. Em The Blinding, sobre um beat agressivo, ambos falam sobre sua posição na indústria, sua ancestralidade e sua espiritualidade. Shiny Suit Theory é quase uma conversa sobre o sucesso que um homem negro realmente pode ter. Universal Soldier, na minha opinião uma das piores, começa com um sample de notícias sobre alguns oficiais que seriam responsáveis pelos ataques atômicos no Japão. Flux Capacitor, uma clara referência à “De Volta para o Futuro”, eles falam sobre si mesmos, suas origens e suas verdadeiras facetas. Fruits of The Spirit e Ezekiel’s Wheel são as músicas mais calmas do álbum, a primeira sendo um único verso e a única música solo de todo o álbum e a segunda com uma produção tão serena que remete ao um sonho, ambas mostram uma certa paz de espírito com sigo mesmo, fazendo múltiplas referências em ambas e com ritmo extremamente fluído. Por fim em A.P.I.D.T.A., sigla que significa All Praise Is Due To Allah ou “Todo Louvor é Devido a Deus”, ambos fazem suas homenagens, JAY-Z faz à seu amigo Kobe Bryant (a música foi gravada no dia de sua morte) e Jay Electronica faz à sua mãe, a música demonstra tanto em sua produção como na voz de ambos um certo desgaste, uma sensação de cansaço, como quem caminha muito e vê alguns ficando para trás.

O que chama mais atenção no álbum definitivamente é a constante relação com Islamismo, não apenas na relação com o divino mas também com palavras e termos, Jay Electronica traz à tona a comunidade muçulmana negra presente nos Estados Unidos, onde a religião é tratada como tabu e acaba sendo extremamente marginalizada. Ele faz parte de uma lista extensa mas pouco conhecida de outras celebridades que fazem parte da comunidade islâmica e, apesar de somente Electronica ser praticante da religião, JAY-Z usa dessa relação do negro com uma doutrina à margem da sociedade cristã americana. Isso acaba trazendo para pessoas menos esclarecidas, e me incluo nisso, uma nova forma de enxergar a comunidade negra nos EUA e como a falta de liberdade de expressão para alguns grupos os cala diante de outros que tomam tanto espaço.

É possível encontrar o álbum em todas as plataformas de streaming de música, como Spotfy ou Apple Music, também é possível adquiri-lo tanto em forma digital quanto física.

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