O Baú do Diabo

Samuel De Carvalho Hernandez
ARKHI
Published in
5 min readDec 20, 2022

Texto: Gustavo Páscoa
Arte: IA

“O que eu vou fazer com isso? Como abrir essa coisa?”

Sentado na relativa segurança de uma cabana de pedra em meio às areias negras, Calango se debate com uma missão quase impossível. O seu baú de prata. Ele já tinha mexido e remexido nele, e sabia que haviam moedas…e outras coisas mais dentro daquele recipiente de mistérios. Mas, como acessar seu interior, e a promessa de riqueza e itens que ele continha? O guerreiro já havia reparado em algumas coisas: Marcas chamuscadas por fora, em partes específicas…havia saído fogo dali de dentro. Uma armadilha! Seria muito fácil arrebentar ele contra uma parede, ou jogá-lo do alto da casa para quebrá-lo…mas era um baú feito de prata! Ele deveria valer alguma coisa!

Foi quando ele se deu conta dos companheiros à sua volta: Rupert, o pequenino que estava com ele quando caíram no buraco que servia de toca pro Diabo branco que era dono do baú; Penkay, o Ladrão que já e fazia famoso entre os andarilhos do deserto…e um anão, novato como ele. Penkay logo se interessou pelo problema de Calango e, examinando o baú, se deu conta que seria muito mais difícil abrir aquilo do que aparentava. A fechadura estava semi aberta: Alguém tentou abrir o baú anteriormente, e caiu na armadilha de fogo, das aberturas. E havia mais: líquido, por dentro do baú, mais ou menos na direção dos chamuscados. Seria o combustível do fogo? Além disso, o ladrão, usando suas ferramentas, sentiu algo dentro do baú: uma pedra de sílex…uma pederneira! Seria o que faz a faisca que acende o líquido, e ativa a armadilha? Muitas perguntas sem resposta…

A essa altura, o problema de Calango se tornou o problema do grupo. Todos viram ali uma oportunidade de ganhos. Então, resolvemos nos dedicar ao desarme e abertura do Baú do Diabo.

“E se nós só quebrássemos o baú?”
“Mas ele é valioso, é feito de prata!”
“ Como vamos fazer pra desarmar a armadilha, Penkay?”
“Se eu não conseguir, essa coisa vai explodir na minha cara!”
“E se…você estivesse protegido?”

Esse foi o momento em que alguém percebeu o seguinte: A cabana de pedra em que eles estavam tinha uma abertura, apenas uma fenda larga o suficiente para se apontar uma besta e atirar em um alvo diretamente à frente. Penkay poderia desarmar a armadilha e abrir o baú pelo outro lado da parede! Para pormos o plano em prática, juntamos areia até fazer um pequeno monte, para apoiar o baú dentro da casa, enquanto Penkay usava suas ferramentas pelo lado de fora para exercer sua arte. Mas tinha um problema: a fenda era muito estreita, e as ferramentas de Penkay muito curtas para a espessura da parede. Ele não conseguiria acessar o baú…a não ser que a parede ficasse mais fina.

Enquanto Rupert e Penkay ficavam de guarda, eu e o anão usamos nossos fêmures como martelos e os pinos de escalada como cinzéis, para alargarmos e aprofundarmos a seteira para facilitar o trabalho de Penkay. Cada golpe e o raspar da pedra contra pedra ameaçavam tornar o grupo alvo de criaturas escondidas nos arredores. Mas insistimos, primeiro os dois pelo lado de fora, e depois um de cada lado para facilitar o serviço. Nesse meio tempo, Penkay e Rupert sugeriram:

“Por que não enchemos o baú de água, pra encharcar a pedra de sílex e dificultar as faíscas de acenderem o fogo?”
“Se for pra ser assim, porque não tombamos o baú pra deixar a pedra encharcada de vez? Melhor ter certeza do que ficar na dúvida”.

Gastamos uma boa porção dos nossos estoques preciosos de água, mas colocamos nosso plano em prática. Depois de tudo pronto, Penkay estala seus dedos, encaixa suas ferramentas, e começa a trabalhar. Todos nós estávamos atentos à nossa volta, receosos de atrairmos criaturas… e Calango se perguntava se o ladrão estava à altura do desafio do Baú do Diabo. Até que, um estalo e o som chiado de gás escapando indicaram que Penkay havia conseguido! Mas…a que preço? Assim que o som do gás acabou, o ladrão vai ao chão, desfalecido. Chegamos perto, preocupados…até que o ladrão começa a rir um riso debochado. Ele estava bem…e o baú estava aberto!
Corri logo pra dentro, para ver o que havia ali dentro, depois de tanto trabalho. A água no fundo do baú não deixava ver muito bem o que tinha dentro, então só meti a mão pra descobrir: Hmm, papel, dois rolos. Inútil. Jogo pra trás. Uma zarabatana, presa no corpo do baú…e algo pesado, circular. Levanto e vejo os objetos mais maravilhosos que meus olhos já vislumbraram: Um rubi…do tamanho da minha cabeça. O bicho brilhava, um carmesim que só me fazia imaginar o que eu poderia comprar com sua venda. E o escudo: Feito de um metal prata, com veios de um metal branco…Bridd, segundo o anão, um metal que não derrete. E suas tiras, feitas de couro de Diabo Branco. Era um broquel, e pelo seu formato e dimensões, ele poderia ser encaixado em um escudo maior, para maximizar a proteção. Era um tesouro inestimável. Além disso, haviam moedas de ouro e prata, de uma pureza incrível e uma cunhagem que nunca tinha visto. Nós tínhamos tirado a sorte grande. Naquele momento, Calango sentiu sua mão começar a formigar: Ela estava queimando, derretendo bem diante dos seus olhos. Gritando, ele observa enquanto ela fica em carne viva: Havia ácido no fundo do baú, ou algo que reagiu com a água que eles jogaram se tornou…ácido. Era o preço a se pagar pelos tesouros, parecia.

Depois de dividirem os espólios e cuidarmos de nossos ferimentos, decidimos voltar à Cidade Velada: Eu queria recompensar meus companheiros pela ajuda em abrir aquele baú: os tesouros deveriam ser divididos, especialmente o valor do Rubi imenso. E somente poderíamos fazer isso com os comerciantes de lá. O sol já estava alto, e depois de saciarmos nossa fome e sede, fomos em marcha acelerada pelos caminhos entre dunas até nosso refúgio. Fomos emboscados por…fadas azuis…?… que lançavam magias em nós. Despachamos elas rapidamente, e após levar seus corpos comigo, nos deparamos com um último desafio antes de chegarmos à segurança…

Gritos, e pedidos de ajuda, vindos do outro lado de uma duna próxima. Crianças. A Cidade Velada estava à vista, mas Rupert se decidiu em ajudá-los. Me arrependo de não tê-lo seguido: Estava pesado, e ansiava pela segurança e pelos ganhos da venda daqueles itens… então, deixei-o ir. Sozinho. O restante do grupo correu até o portão, e conseguimos buscar ajuda para o pequenino com a guarda da cidade. Ele conseguiu salvar mulheres e crianças, sobreviventes de um ataque. Ele não quis dar detalhes, mas de alguma forma…ele se sentia responsável por aquelas pessoas. E Rasmum permitiu que ele conseguisse sua intenção, e voltasse para a segurança.

Mais tarde, já depois de terem negociado os espólios, Calango meditava, planejando seus próximos passos. As moedas, conforme descobriu com um ancião Jaonida, era de origem Arkhimancista. Os Glomnianos se interessariam por elas. Era só encontrar o acampamento deles, a Sudeste. E, como seu povo deu origem e apoia as tribos nômades de Lumn, ele também o faria:

“Pelas areias de Lumn, serei o apoio. Ajudarei aqueles que, como eu, tentam sobreviver e ganhar seu sustento do deserto. Serei protetor e companheiro. Escudo e espada, guia e aprendiz. Aprenderei os caminhos do deserto, seus povos e suas histórias. Por Rasmum, mostrarei porque nós, os Jaonidas, fomos a origem e a base dos povos do deserto.

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