Como pornografia faz com que a desigualdade seja um tesão

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Felinismo Radical
Published in
4 min readDec 10, 2018

Por: Robert Jensen
Tradução: Carol Correia

Ano passado em meu escritório na Universidade de Texas, após ter resumido, a um grupo de jovens mulheres, a crítica feminista da pornografia (que elas nunca ouviram sobre), uma das alunas em seus vinte anos sugeriu que pessoas mais velhas (como eu, 57 anos) estão em desacordo com pessoas jovens, incluindo mulheres jovens. Sim, parte da pornografia é nojenta, ela disse, mas ela e suas amigas não ficam tão irritadas com isso — é apenas pornografia.

Eu ofereci uma hipótese para testar sua afirmativa: imagine ser chamada para sair por dois caras. Esses homens são equivalentes em todos os critérios que importam a você — senso de humor, inteligência, aparência — e a única diferença aparente é que um regularmente se masturba olhando pornografia online e o outro nunca olha para isso. Quem você prefere sair com?

A aluna estremece e reconhece que escolheria o que não utiliza pornografia.

Por que a disparidade entre o compromisso declarado de ser tolerável por pornografia e a preferência real nos parceiros? Outras conversas com essas estudantes e outras sugerem que as mulheres sabem o que é a pornografia e como os homens usam, mas sentem uma resignação sobre a cultura pop contemporânea.

Os pornógrafos comerciais querem que acreditemos que seu produto é apenas atividade sexual rotineira no cinema. Embora exista uma variação considerável no material gráfico sexualmente explícito, a pornografia mais comum oferece o domínio masculino sexualizado na tela, com o gênero gonzo ‘quebrando’ os limites da degradação e crueldade para as mulheres. Além do material extremo produzido pela indústria de pornografia “legítima”, os gêneros são ainda mais severos que sexualizam todas as desigualdades que você pode imaginar, especialmente a pornografia racista. No seu núcleo, isso é o que a pornografia faz: faz com que a desigualdade seja excitante sexualmente.

Sim, as mulheres também usam pornografia — mais agora do que no passado –, mas ainda muito menos do que os homens. Basta perguntar aos pornógrafos para quem eles fazem filmes: Os consumidores primários são homens e, em uma sociedade patriarcal, é lucrativo erotizar a subordinação das mulheres ao poder masculino, que então se torna parte da rotina de masturbação masculina. As mulheres heterossexuais querem parceiros cuja imaginação sexual tenha sido moldada, tornando a subordinação das mulheres um tesão?

Muitas mulheres jovens me disseram que a pornografia é tão onipresente que se resignam a namorar homens que a usam. “Não há sentido em pedir-lhes para não fazer”, uma mulher me disse, “porque eles não vão parar“. Talvez algumas mulheres professam não serem incomodadas por pornografia quando, na verdade, sentem que não têm opções.

A partir da década de 1970, uma crítica feminista radical da pornografia ofereceu uma alternativa. Para melhor compreender e desafiar a violência masculina contra as mulheres, as feministas analisaram e atacaram o sexismo e a misoginia não só na pornografia, mas também na televisão, no cinema, na publicidade e na música — que apresentam rotineiramente os corpos femininos objetivados para o prazer sexual masculino. Em todas essas frentes de mídia de massa, perdemos terreno nas últimas décadas, à medida que a cultura cresceu mais corrosiva e a exploração sexual das mulheres mais rotineira. Ironicamente, a trajetória da pornografia hardcore das margens para o centro da cultura pop provou que as feministas radicais das décadas anteriores estavam certas.

Esta alternativa feminista está disponível para homens e mulheres. E à medida que os homens acham cada vez mais que o uso habitual de pornografia prejudica sua capacidade de experimentar a intimidade, dificultando a realização sexual sem um loop de pornografia na sua cabeça, essa alternativa deve ser atrativa para todos.

Este não é um apelo para reafirmar o controle conservador da sexualidade das mulheres, mas um argumento contra a exploração masculina das mulheres e para a educação sexual saudável. É um apelo para lutar contra o que a Culture Reframedchama de “crise de saúde pública da era digital”.

Nos primeiros 30 anos de minha vida, eu era um “cara normal” que usava pornografia, embora, no mundo pré-internet, de forma contida e sempre me senti desconfortável com a forma com que o material moldava minha imaginação sexual. Feminismo me deu um vigamento para não apenas superar a pornografia, mas também desafiar como o domínio masculino define tanto nossa interação sexual. À medida que ressoa 30 anos vivendo com esse vigamento feminista, posso dizer sem hesitação que nunca mais voltaria a ser “normal”.

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