Videoarte: Letícia Parente

Patrick Coelho
Arte em Debate
Published in
4 min readMar 4, 2021

Letícia Tarquinio de Souza Parente nasceu em Salvador, Bahia, no ano de 1930. Foi artista, professora, pesquisadora e pioneira da videoarte no Brasil, tendo trabalhado também com pinturas, gravuras, objetos, fotografias, projetos audiovisuais, arte postal, xerox e instalações. O corpo e a casa são a base da sua obra, estabelecendo um diálogo entre a vida íntima e o mundo.

Formou-se em química em 1952 e se dedicou à educação, atuando em Salvador, Rio de Janeiro e Sabinópolis (Minas Gerais). Em 1959, fixou residência em Fortaleza com a família e tornou-se professora de química na Universidade Federal do Ceará (UFC).

Letícia foi iniciada na arte tardiamente, aos quarenta anos de idade (1971), quando se mudou para o Rio de Janeiro para fazer o mestrado em química na Universidade Católica Romana (PUC-RIO). Conheceu a prática artística por meio de cursos realizados no Núcleo de Atividades Criativas (NAC) de Botafogo e passou a fazer gravuras. Em 1973, retorna a Fortaleza, onde ganha o prêmio do Salão de Abril, e realiza sua primeira exposição individual no Museu de Arte da Universidade Federal do Ceará (MAUC), intitulada Monotipias, composta por 29 obras em gravura.

Exposição no MAUC, 09/08/1973.

Em 1974, retorna ao Rio de Janeiro para dar continuidade às pesquisas acadêmicas na área de química, com um doutorado, ao mesmo tempo em que realiza pesquisas com a artista Anna Bella Geiger (1933), em seu ateliê. Elas foram as primeiras a usar a câmera Sony Portapak, a primeira câmera de vídeo portátil, para produzir trabalhos em vídeo no Brasil. A câmera foi trazida dos Estados Unidos pelo cineasta Jom Tob Azulay (1941).

Seu vídeo Marca Registrada (1975) tornou-se um emblema da videoarte no país. É um vídeo de 10 minutos que mostra Letícia Parente costurando na planta dos pés a expressão “MADE IN BRASIL” com agulha e linha. O corpo é entendido como uma mercadoria e não mais um estado físico pessoal. Pertencer a um país durante a violenta ditadura militar-civil é doloroso. Para quem observa a imagem ao longo do plano sequência, a pele é marcada ponto a ponto e produz uma sensação dolorosa - esse é um elemento estético essencial da artista em outras obras de vídeo, que prioriza o tempo da ação.

Letícia Parente, “Marca Registrada”, 1975, vídeo.

Letícia Parente também utilizou o audiovisual como meio artístico, apresentando a obra Eu Armário de Mim (1975). Nela, fotos de seu guarda-roupa contendo cadeiras, sapatos, exames médicos, especiarias, itens de culto, todos os seus cinco filhos e outras imagens com elementos da casa são encadeadas ao som de um reza, cujo refrão é “Eu, armário de mim”. Por meio da construção de uma estrutura cotidiana, pode-se ligar o cotidiano e o pensamento da artista ao mundo em que ela vive, formando uma abordagem poética de classificação muito próxima ao cotidiano.

Letícia Parente, Eu Armário de Mim

Muito do que o Brasil produziu em arte e mídia na década de 1970 se perdeu. A maioria dos trabalhos de xerox, arte postal, vídeo e vídeotexto foram perdidos, seja por serem materiais frágeis, ou devido a equipamentos obsoletos, ou devido à preparação insuficiente das instituições de arte brasileiras (incluindo museus, colecionadores e artistas). Mais de um terço dos vídeos que Letícia produziu foram perdidos, pois ela não tinha como fazer cópias de suas obras e as enviava para exposições.

Letícia Parente, da série Mulheres

As diversificadas obras de arte de Letícia Parente refletem a vitalidade que ela demonstrou ao longo de sua vida: um foco fixo na descoberta, experimentação e razão é uma forma de orientar a descoberta, aproximando arte e vida. Letícia faleceu no Rio de Janeiro, em 1991.

REFERÊNCIAS:

LETÍCIA Parente. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2021. Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa216185/leticia-parente>. Acesso em: 03 de Mar. 2021. Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978–85–7979–060–7

https://istoe.com.br/146730_CARTOGRAFIAS+FRONTEIRICAS/

PARENTE, André. “ALÔ, É A LETÍCIA?”. eRevista Performatus, Inhumas, ano 2, n. 8, jan. 2014. ISSN: 2316–8102.

--

--