Dimitri Bastos

Gabriel Freire
Art Journey
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18 min readApr 9, 2018

D epois de um hiato nosso, mas também de centenas de jobs urgentes do nosso entrevistado, o menino que é tão criativo, que criou até uma academia, dá o ar da graça em nossas humildes dependências literárias. Creative Designer mais advogado que existe em Fortaleza, Dimitri Bastos.

Dimitri Bastos — Fundador da Academia Criativa e Creative Director

Dezenas foram ás vezes que ouvi dizer que “ensinar é o melhor jeito de aprender”. Acredita nisso e porque? Ser professor te mudou como profissional? Qual contraindicação?

“Olha, eu acho que isso é verdade. Ser professor significa ser aluno.
É preciso estudar, elaborar, prever e até teorizar. É um trabalho em múltiplas frentes: pesquisar um assunto, revisá-lo, elaborar o conteúdo, analisar se ele está dentro da proposta ou dentro do nível do aluno, e até mesmo antever tendências e comportamentos de mercado. Dar aula na área criativa é um mar de emoções porque todo ano as coisas mudam bastante: há novos programas, novas atualizações, novos motores de render… então a contraindicação é estar à par de tudo isso e seguir novamente para as etapas de estudar, elaborar e etc.

Então virar professor, há mais de 4 anos, me ensinou a ver a área criativa além da superfície e buscar entrar na razão de ser das coisas. Isso, principalmente, porque essa é a minha personalidade e também porque nunca fui muito criativo mesmo rs.”

Como foi sua caminhada até virar freelancer e algum tempo depois, professor?

“Depois do ensino médio, fui diretamente para a área jurídica. Cursei a faculdade de direito quase por inteiro até largar e seguir na área criativa. Eu trabalhei muito pouco em parceria com outros colaboradores e chefes; passei um tempo em veículos de comunicação e alguns meses em estúdios.

Recebi propostas para outros estúdios nacionais e até internacionais, mas, nessa época, eu já fazia freelances para o mercado local, nacional e internacional. Eu ganhava bem mais. Não via sentido algum em trabalhar em algum estúdio, quando eu poderia ganhar mais sendo freelancer, especialmente porque uma das boas razões para ser freelancer é aprender bastante.

Outra delas é ter mais tempo para colocar pra fora minha paixão, que é ensinar. Meu primeiro emprego, aos 18, foi como professor. Hoje, com quase 32, eu continuo sendo professor. Dar aula online é difícil e diferente de dar aula para crianças, meu primeiro emprego, mas é algo que sempre quis fazer. Mas nunca quis ser apenas professor, porque acho que quem passa conhecimento precisa passar teoria e prática. É por isso que sou freelancer enquanto estúdio independente de um homem só e também como professor que dá aulas na Academia Criativa. Hoje eu tenho mais de 5 anos como freelancer. Tirando um período sabático de 1 ano na minha carreira de quase 10 anos, eu já tenho mais tempo de freelancer do que de empregado.”

Segundo a Lei 8731, inciso 629–3/2017 do Blablaísmo Polemicista Artístico, o futuro é especializado ou generalizado?

“Eu acho que generalizado. Ano após ano, os softwares vão ficando mais fáceis, mais baratos, mais automatizados. A quantidade de conteúdo gratuito não para de crescer graças ao YouTube. Conhecimento (gratuito) é uma commodity para ganhar exposição e relevância. No exterior, os grandes canais ensinam para vender produtos para a área criativa, vide Video Copilot ou Greyscalle Gorilla. Aqui, não há produto a ser vendido. No máximo algum curso online a ser ofertado. As pessoas ensinam para serem vistas e conseguirem trabalho.

Não bastasse a saturação dos grandes centros criativos do mundo, aqui no terceiro mundo a gente enfrenta um problema pior: economia fraca, em crise, com uma oferta de mão de obra gigante porque o profissional só precisa acessar o Vimeo e o You Tube para estar no mercado de trabalho. Eu não acho que isso seja um problema per si, nem acho que essas pessoas estão erradas, embora tenha minhas reservas quanto a quem oferta conhecimento em troca de exposição.

O meu ponto é que:

“Certos mercados vão ficando cada vez mais saturados e isso significa que quanto mais conhecimento e diferenciais você tiver, melhor.”

Com exceção de minorias que são excepcionais no que fazem, a maioria, e eu estou incluso nisso, não tem aquele 1% de diferencial para ser um especialista de sucesso e estar sempre com dinheiro para sobreviver e ter uma família. Um outro problema é a Inteligência Artifical.

Antigamente, dando um exemplo, texturizar um modelo 3D era um processo absurdamente complicado. Hoje em dia softwares fazem isso com dois ou três cliques. Não tenho dúvidas de que no futuro, a facilidade de uso das ferramentas será tanta que um profissional especialista numa única área do conhecimento criativo vai se tornar escasso ou ainda descartável. Por outro lado, o tomador de decisões, que precisa ter um conhecimento em várias áreas para dirigir uma peça, no fim, é um generalista. E só ele sobreviverá.

Quais os maiores aprendizados da sua caminhada como professor de um curso online você passaria como conselho para aqueles que desejam o mesmo caminho?

“Acho que o maior aprendizado é que não importa o que você faça, ainda não está bom o bastante.

Dar aula para si mesmo, sendo gravado, é um desafio e tanto.

Especialmente quando não há pessoas assistindo e você não tem certeza se entenderam ou não porque ninguém faz perguntas. Ainda estou aprendendo e melhorando, quem não está?

Porém, a principal coisa é:

“tenha experiência de mercado no que quer ensinar, antes de ensinar. “

É desonesto aprender um programa ou técnicas apenas para ensinar os outros, sem nenhuma ou pouca experiência prática.

Ensine a sua história, não a história dos outros. Seja mais real e menos marketing.

Acho que essa é a principal coisa que qualquer pessoa precisa seguir, na minha opinião.”

Qual foi o pior cenário que já viveu até hoje como freelancer? E como isso influenciou o psicológico, o familiar e o financeiro?

“Acho que o pior cenário foi de ficar 4 dias acordado fazendo mudanças para um projeto de uma agência, que era nova, e estava com uma conta grande no mercado norte e nordeste. Aquela coisa de impressionar, dar várias opções, oferecer mais do que é o pedido. Isso sempre tem um custo: e o custo é de quem está na linha de produção.

Há uma confusão entre profissionalismo e exploração na área criativa que é constantemente borrada e invertida. As pessoas pensam que se matar de trabalhar é profissionalismo, ignorando totalmente limites, necessidades e até saúde. Não estou falando de entregar algo no prazo. Eu falo da total e completa falta de planejamento estratégico e, principalmente, da situação onde sutilmente fica implícito que você não precisa dormir porque é legal, século 21 e espertão (?) trabalhar de madrugada. E, pra mim, foi ainda pior, porque um freelancer precisa ter bom relacionamento com os clientes. Como dizer não?

Eu também era novo como freelancer, e o medo de dizer não prejudicou a minha vida e a forma de ver o mercado e profissão pra sempre. Para ser sincero, eu achei que fosse morrer de tanto trabalhar, porque realmente estava me sentindo mal e com dores no peito. Isso não é vida. Ninguém deve ser colocado em condições insalubres, e até desumanas, apenas para um projeto ser concluído com sucesso e um cliente estar satisfeito. Eu sempre me perguntei o que acontece quando alguém tiver uma parada cardiorespiratória num escritório de madrugada e morrer com a cara enfiada numa pizza.

Quem será o responsável? A concorrência está exigindo cada vez mais esse comportamento voraz no dia a dia. Eis um dos motivos porque quero sempre continuar como freelancer: essa realidade é muito comum nas agências e produtoras/estúdios. Claro, não deve acontecer de ficarem 4 dias acordados, mas não são raras as madrugadas em claro e finais de semana no trabalho para atender clientes e prazos.

A área criativa é uma área com um requisito invisível que só se aprende na prática do mercado, que é a resiliência física e mental. Hoje em dia, com 32 anos, às 22h meus olhos já estão pesados. Não aguento mais esse ritmo. Acho que não sou geneticamente evoluído e não estou apto ao mercado de trabalho. O que mudou de principal mesmo é que eu aprendi a entregar o que dá pra fazer, no prazo e no orçamento que foi aprovado, sem testar os limites da condição humana, física e mental — porque eles existem. Se isso não for o bastante para me deixar numa posição sadia no mercado, então paciência.”

Algumas vezes ouvimos que o “dar mais de si”, “estudar mais” resolve… O esforço tem esse poder todo?

“Eu acho que não. Ser casado com uma psicóloga especialista e expert em recursos humanos, me ensinou que os recursos humanos, como o nome sugere, são os recursos das pessoas. O RH surgiu para formar bons times, alinhados aos valores das empresas, mas também para proteger as pessoas da empresa e do próprio trabalho. Parece contraditório, né? Isso porque de algumas décadas pra cá se levantou muito a bandeira da qualidade de vida no ambiente de trabalho.
Não é ter um videogame (que nunca é usado) no escritório, mas sim dar valor ao recurso humano da empresa. Isso significa respeitar os limites da pessoa, respeitar os horários do contrato de trabalho, respeitar que existe vida fora do trabalho, respeitar a necessidade social do indivíduo ter algo a fazer além de trabalhar. Oras, imagina se as pessoas não transassem e as mulheres não engravidassem? Que problemão para as empresas, países e a sociedade em geral quando faltasse mão de obra, né?

É um exemplo tosco, mas que serve para justificar um ponto. A gente é mão de obra e ferramentas e ferramentas precisam estar em boas condições para serem usadas. Então, também é papel do RH, para manter o equilíbrio das pessoas em ordem, ajudar na estratégia da empresa. Isso significa ajudar na formação de times, em práticas para melhorar o relacionamento, em medidas para melhorar a produtividade. Muito tempo atrás eu achava que estudar muito e o tempo todo disponível era a melhor solução. Hoje eu acredito que estudar e me esforçar de forma melhor e mais inteligente, respeitando minhas outras necessidades como indivíduo, é o ideal. Eu tenho uma esposa a quem tenho que fazer companhia (ou o Ricardão o fará) e em breve quero ter um filho para criar. Então a meta é encontrar formas ainda mais inteligentes de fazer melhor em menos tempo.”

O Brasil tem passado por um tempo de gurus que pregam o “empreendedorismo de jardim”, onde tudo são flores, onde “trabalhe apenas 4 horas por dia” é o mantra diário e sempre ter orgasmos fazendo seus jobs é quase que obrigatório. Mas sabemos que na guerra da vida real, o “empreendedor raiz” é muitas vezes tal qual prisioneiro dentro de sua própria criação, para que a mesma não morra, ou seja engolida pelos predadores do mercado, ou soterrado pelas enxurradas de impostos e tantos demônios que afugentam seu sono toda noite. Sabemos também que a paixão pelo trabalho é quase sempre deixada para trás, quando o Apocalipse de boletos se inicia. É fato que todo freelancer é um empreendedor, e você como um já deve ter se visto nesse cenário ou pensado no mesmo. O que acha disso tudo?

“Eu acho que um empreendedor que nunca pensou em desistir é um mentiroso. Sério mesmo. É impossível alguém ter uma constituição mental inabalável diante dos problemas que você mostrou. Impostos são o menor deles. Eu tenho reais dúvidas se as pessoas que reclamam dos impostos estão mal o bastante para reclamar até do imposto. Digo isso não por defender imposto, mas porque há um monte de outros problemas mais graves antes: clientes e concorrência. Se eu tiver reclamando só dos impostos, então a coisa tá MUITO BOA HAHA.

Ser freelancer e professor de um curso online não é fácil. Primeiro porque
o freelancer, historicamente, é visto como um quebra-galho.

Eu tive sorte de ter encontrado agências que me respeitaram e me colocaram como estúdio para os clientes finais. Ajuda o fato de eu me posicionar como uma empresa e não como um cara informal, coloquial e “gente boa” que tá disponível para resolver algum problema. Um curso online também tem suas dificuldades: com um país em crise, dar aula na internet virou uma bela forma de ganhar dinheiro. Está todo mundo querendo sobreviver, no final das contas. Então eu sou bem pragmático e prático quanto a isso. Trabalhar sozinho significa enfrentar o mundo sozinho também. É claro que isso leva a muitas questões, sendo ansiedade uma delas. Não há flores, não é fácil, especialmente por causa do meu estilo de encarar as coisas. Eu tento ser mais real do que marketing online, o que significa que eu me coloco mais à frente das coisas e menos nome do meu negócio.”

Muitos conclamam que Dimitri Bastos é uma referência em Motion Design em Fortaleza. Deixando a modéstia de lado, e abraçando a sinceridade, você crê nisso? Já se viu impotente frente a “crise do impostor”?

“Eu não acredito nisso e nunca me vi impotente frente a nenhuma crise. Eu já passei por crise de ansiedade em relação ao mercado e futuro profissional, mas em grande parte acho que isso é normal de quem trabalha sozinho e cuida de toda a parte criativa, financeira e estratégica do próprio negócio. Eu talvez já tenha sido no passado, mas desde que resolvi me tornar generalista, o espaço se abriu para outros profissionais enquanto eu comecei a abarcar outros tipos de projetos também. Recentemente, até roteiro para um projeto pra TV eu criei rs.”

Se alguém te dissesse agora que quer virar freelancer, o que diria?

“Para ter calma. A internet trouxe pra perto gente muito diferente, de variados perfis e incontáveis histórias. É muito fácil pegar um celular e ver o trabalho e o estudo dos outros. É muito fácil acreditar também que há um estilo de vida incrível ali esperando você: o do freelancer fodão que leva um vidão.

essa ideia do cara que trabalha pouco, ganha muito e vive de boa.
Isso é um mito.

Deixa eu explicar. Nossa área é bem nova. As pessoas estão entrando no mundo criativo cada vez mais cedo, com um mar de influências pelo Facebook, Instagram e Behance, então soa tentador seguir um cara que cria alguma arte irada e é uma potencial referência. Mas, na maior parte das vezes, o cara nem cobra muito.

Ele também pode viver com os pais. Ou tem no geral uma qualidade de vida bem baixa, dependendo dos padrões. O que estou tentando dizer é que a imagem que você passa na internet talvez não seja uma imagem adequada para outras pessoas, muito embora seja uma imagem vendável. Quando você bota na balança, talvez ele não seja a melhor das referências pra alguém se tornar freelancer. Mas, de novo, não dá pra saber da história de todo mundo. Porém, na internet, as pessoas adoram vender imagens de sucesso. É pra ter cuidado com o contexto dessas imagens… o que serve pra um pode não servir para outro.

Digo isso porque o freelancer precisa se preocupar com aluguel, comida, energia elétrica, telefonia e internet, transporte, licenças de software, o mínimo do mínimo do mínimo de lazer, saúde (que deveria estar em primeiro lugar).
Há também outras coisas, como impostos, aposentadoria, reserva financeira.
Há outras coisas que são ainda mais importantes, dependendo de quem você seja, como família e filho. Então, será que ser freelancer é tão fácil? Ao final do mês, você precisa ter ganhado dinheiro suficiente para cada uma dessas coisas não faltar, porque se faltar, não vale a pena ser freelancer. É isso que eu diria para quem quer virar freelancer.”

Milton Menezes da Lightfarm parafraseando um comentário que ouviu, disse: “Existe mercado pra todo mundo”. Essa frase é verdade ou a realidade dos freelancers/estúdios é mais dura que isso?

“Eu acho que é mais dura. Talvez eu concorde se você assumir que mercado significa qualquer condição de trabalho. Eu acho que um freelancer ou estúdio sempre vai ter trabalho, se partir do pressuposto que ele pode, digamos, ofertar prazos desumanos ou valores antiéticos para pegar os trabalhos. A pergunta que me interessa é se há um mercado bom, satisfatório e saudável para todo mundo. E por isso eu acho que não há. Os projetos que pagam bem e têm prazos decentes estão cada vez mais disputados. O que acontece com o resto? Eis a questão.

Porém, eu concordo que há muitos clientes locais, na sua cidade e no seu bairro, que podem ser uma boa e sustentável fonte de renda. Se “existe um mercado para todo mundo” incluir aqueles trabalhos que nunca vão ganhar destaque no Behance ou mover mares de likes nas redes, eu concordo. Na internet a gente só pensa nas grandes marcas, mas há espaço para os pequenos também e normalmente eles que pagam as contas da maioria das pessoas.”

O Ministério das Artes adverte: Largar Direito para ser Creative Designer causa …?

“O principal é desconfiança social HAHA.

Minha mãe disse algumas vezes, logo quando larguei, com um ar de desdém, que eu largara direito para ficar desenhando. Acho que essa é a percepção da sociedade: que a gente não trabalha e que o nosso ofício não é importante. Se fosse, talvez micreiros e sobrinhos não seriam uma coisa presente, né?
Tá certo que a gente reforça, e muito, essa imagem, mas é difícil ser apoiado numa decisão de 180 graus na sua vida profissional. Principalmente quando não havia motivos aparentes para tal, muito pelo contrário. Até hoje, quando comento isso, as pessoas me olham com ares julgadores. Quando falo que sou formado em design gráfico, capaz de me imaginar numa gráfica fazendo fotocópias numa xerox. O valor social e a percepção do nosso trabalho, falando
de Brasil, e em especial nordeste, é bem baixa.”

Como o casamento pode mudar profissionalmente um homem?

Depois de casar, especialmente com uma pessoa de um perfil profissional totalmente diferente, eu aprendi a me equilibrar mais. Daí, você precisa ponderar mais seu tempo e principalmente suas decisões, porque agora você não trabalha só pra si mas também para uma família. Hoje em dia eu sou ferrenho defensor da qualidade de vida na área criativa e, em grande parte, porque eu coloco minha família em primeiro lugar.

Sem papas na língua, é possível viver apenas da Academia Criativa hoje?

“É possível se você se dedicar a isso. Eu sou freelancer primeiro e professor depois, além de tocar a Academia Criativa 100% sozinho. Minhas noites são feitas para estar com minha esposa e dormir… esta é a minha religião.”

O ensino superior nacional tem padecido e se deteriorado quando pensamos em qualidade de ensino e conteúdo programático e atrelado a isso, vemos uma retroalimentação quando falamos sobre professores. Alunos mal formados deixam a academia, e tentam o mercado, mas pela sua frágil formação não se alocam e diante do desespero, encontram morada em vagas nas mesmas academias das quais saíram e com isso, o ciclo prossegue. Qual o futuro dessa história, principalmente pro Brasil? Como acha que isso afeta o mercado?

“Essa é uma pergunta boa e complicada. É alto o número de professores que nunca ou muito pouco atuaram no mercado de trabalho. E, se aturaram, são em experiências que sinceramente não o qualificam para ensinar outras pessoas. Se um professor for apenas uma pessoa que estuda livros e passa o que aprende com esses livros, então qualquer pessoa pode ensinar outras pessoas. Mas, onde está a experiência do professor? A Academia brasileira se concentra apenas em valorizar estudiosos, mas isso forma pessoas alheias ao que acontece no dia a dia profissional. A Academia forma pensadores ou mão de obra qualificada?
Se a ideia é formar mão de obra qualificada, então qual a qualificação de quem ensina? Mestrado e Doutorado mostram apenas a qualificação acadêmica, mas e a qualificação profissional e experiência de mercado?

Quando fiz direito, não havia um professor sequer que não fosse também advogado, juiz, procurador, defensor, promotor. Mas em Design e Publicidade, é aceitável você ter um doutorado e experiência profissional quase nula. Talvez porque quem atue no mercado não tem tempo (e nem dinheiro) para investir pesado na área acadêmica. Não obstante, tá cada vez mais comum os professores de faculdades e universidades virem de famílias abastadas que podem pagar por formações no exterior, que não são nada baratas. Hoje em dia, é quase como um plano de carreira:se formar, não trabalhar, entrar num mestrado e doutorado para ensinar. Eu acho isso bizarro. E, enfim…como você vai dar aula a noite estando na agência? HAHA.”

Jobs falava muito da morte como seu propulsor para realizar mudanças e achar o caminho daquilo que gostaria de estar fazendo verdadeiramente. Qual o seu propulsor?

“Eu só busco ser bom no que eu faço, respeitando os meus limites. E eu quero realizar alguns sonhos, como trabalhar num curta e quem sabe, um dia, trabalhar com livros infantis. Se eu pensar em morte, como ele, algo que pode acontecer a qualquer momento, significa que vou priorizar coisas que não acredito serem prioridades.”

Você se acha um cara um tanto polêmico. Fale e comente algumas opiniões suas que tem divergido da maioria e causado burburinho na web.

“Acho que esta entrevista já têm polêmica o bastante hahaha. Pouca se fala em qualidade de vida na área criativa. Parece um tabu, um dogma, ou talvez os outros profissionais não se importem no final das contas. Afinal, concluir jobs é uma sensação orgásmica e dá muito prazer. Então, viver em torno de jobs e estudos, é algo prazeroso no fim. Porque se questionar quanto a qualidade de vida se você tá tendo prazer no que faz, o tempo inteiro? Mas há mais na vida além de estar na frente do computador. Esse é outro ponto polêmico. Acho que a maioria dos profissionais hoje na nossa área são solteiros e não têm filhos…
deve ser por isso.

Sei que muitos se coçarão na cadeira agora. Mas invocando todo seus anos de estudo da advocacia e os poderes enebriantes da argumentação e retórica, é possível defender os micreiros e sobrinhos?

É sim. Eles são frutos de uma categoria profissional no geral desqualificada, indiferente e desorganizada.

Você vai chamar para operar você um cara que aprendeu a tratar de um fígado através de tutoriais no YouTube? Um advogado para processar alguém que aprendeu a fazer uma petição inicial num guia comprado em banca? Ou talvez um arquiteto que tem experiência comprovada em reformar a pròpria casa? Onde estou querendo chegar? Se você aprende fácil, é lógico que as pessoas não vão dar valor. Se qualquer um pode aprender qualquer coisa, o valor daquilo é naturalmente reduzido e subestimado. É assim que a sociedade funciona, especialmente no setor de serviços onde a busca por mão de obra barata, para satisfação de orçamentos no geral baixos, sempre se fará mais presente.
Se alguém prefere recorrer a um sobrinho e micreiro, não é por culpa destes,
mas por culpa da gente que se coloca socialmente como
FazedoresDeArteDeQualquerJeito.

“Mas Dimitri, a medicina, o direito e a arquitetura são coisas muito mais difíceis e complexas que o design, o motion e 3D”, você pode dizer.

Olha, se você acredita nisso, então nossa área está perdida para sempre.
A gente lida com negócios, que geram riquezas, empregos, circulação de bens e moeda. Atender as necessidades de um negócio, através da publicidade, design e entretenimento, as grandes forças motoras do capitalismo, é algo importante socialmente e economicamente; ainda que essa importância seja bem invisível. Nosso trabalho é importante e fazer a sociedade acreditar nisso é o que diferenciou o médico do curandeiro, o advogado do argumentador e o engenheiro e arquiteto do mestre de obras. Os meios de se fazer essa importância ser notada eu não sei. Já deve ter sido tentado. Mas no fim acho que a gente não se importa muito também. E é aí que eu acho que falhamos.

Então, viva os micreiros e sobrinhos!

Bastos Motion Studio é parte de um futuro distópico ou checkpoint de um futuro próximo?

“Olha, um estúdio de MOTION eu não sei. Por ser generalista, queria fazer um estúdio que ofertasse várias coisas. Ilustração, Motion, Animação… então essa é a minha ideia. Eu não sei bem se está num futuro longe ou próximo.

SE acontecer, eu quero estar preparado. Em grande parte, é por isso que tenho me dedicado a aprender Blender também. Porque já penso em pipelines e redução de custos, até porque eu acho que isso será uma tendência do mercado… em especial os emergentes. Por exemplo, não faz sentido pagar licença de Cinema 4D para um computador usado por um profissional cujo trabalho poderia ser feito num software gratuito e que atenderia sem problemas as demandas.”

Como professor você deve escutar centenas de perguntas diariamente… Contudo, qual a pergunta mais importante que os alunos menos fazem?

“Acho que a pergunta que menos fazem é como podem aprender a criar. Há uma ideia de que o trabalho “artístico” de Motion ou 3D é algo relacionado a um dom e que o software é apenas um meio para externar esse dom. O aluno entra num curso porque já trabalha na área e quer meios para melhorar sua performance ou relevância profissional, ou, ainda, ele entra num curso porque quer começar a aprender do zero. Mas, na maioria das vezes, ele se atém mais à ferramenta do que os princípios básicos de criação. O que acontece é que ele termina o curso e não sabe criar nada do zero. Isso é algo que estou mudando drasticamente na minha didática, porque não quero isso. Não quero que o aluno entre e saia apenas sabendo apertar botões.

Eu tenho experiência em 3 programas de 3D, por exemplo, e com isso eu posso dizer que o que importa é o seu conhecimento fora dos programas. Essa é uma visão que não é nada popular, porque desmistifica a ideia de criação.
Hoje em dia eu estou mais interessado em estudar design, direção de filmes, do que comandos de programas. O principal é saber contar uma história. Quando você sabe a história que quer contar, e como é a melhor forma de contá-la, o resto é mais fácil. Por exemplo, eu recentemente concluí um trabalho de motion feito totalmente no Blender. O programa padrão da indústria pra Motion não é o Cinema 4D? É. Mas eu quis usar outra ferramenta para externar a história que eu quis contar, especialmente para dominá-la rapidamente e também para provar um ponto: o programa é o que menos importa para criar algo.”

E não é que o garoto é criativo mesmo?
Pra ter aula com Dimitri basta se matricular na
Academia Criativa.
Mas se quiser apenas trocar uma idéia, chama ele lá no
perfil do facebook.
E pra ver alguns de seus jobs, eles estão no seu
portfólio do Behance.

E valeu, Dimitri!

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