Ao Mar Morto
Mar. Morto. Não me leves contigo.
Para essa tua imensidão desprezível.
Para a ilusão de que no teu flutuar sou leve. Não sou.
Carrego o peso da água reluzente que me reflecte de cabelos esgrenhados e de lágrimas perdidas no teu sal.
Eu, que neste teu mar, sou só o que sou aos olhos dos teus.
Sou imigrante.
Sou mulher. Africana. Negra com algumas gotas de brancura.
A minha pele tem a cor da terra.
O meu cabelo luta contra a força da gravidade.
Olhas para mim e hesitas.
Deconheces-me.
Incógnita.
Encarnas-me no exoticismo do desconhecido.
Afogas-me.
Não sou das tuas, mar, e não irei ser.
Não falo a tua língua.
Rejeito a imposição da tua religião sobre o meu ser… Ou o que resta dele.
E tu matas almas. Mas não a minha.
Portanto luto, de corpo nú e alma pura.
Penso.
Nasceste o meu homem.
Alguma coisa boa as tuas águas terão que ter.
Grito. Resisto. Sorrio.
E tu, hesitante, enfim, abres os braços que não são teus de abrir
E aceitas-me.