“Quanto custa a tua alma?”

Tahila Pimentel
ArtPensante
Published in
1 min readNov 15, 2017

“Quanto custa a tua alma?” — perguntou-me ele. O poder a fumegar-lhe pelas narinas.

“A minha alma não tem preço” — respondi.

“Todas almas têm preço, mulher. Diz-me quanto, e eu pago essa merda”.

“Não tenho preço” — repeti, um bocadinho mais alto, e um bocadinho mais insegura, imperfeita e impura.

“Mentes. Eu já comprei várias almas, muitas delas mais puras que a tua. Mais caras. Conheço bem o teu tipo. Adorarias ter uma alma sem preço, lutas por isso, mas não consegues. Olha para ti. Deves chorar quando chegas a casa. Deves gritar no silêncio deste espaço. Mas voltas sempre, todas as manhãs estás aqui. Trabalhas, trabalhas, trabalhas, e esperas de mão estendida. Portanto, pergunto pela última vez. Quanto custa a tua alma?” — disse ele. O tom mudava devagarinho para algo mais autoritário. Agora já não só fumegava pelas narinas, mas o poder era tanto que espumava pela boca.

Silêncio.

Vi-lhe o meio sorriso a aparecer ligeiramente, o sorriso de vitória. Aquele sorriso tão familiar, do homem que respira como se fosse um deus, só porque é homem.

Levantei-me bruscamente. Ele tinha razão, a minha alma tinha preço. Vendi-a tantas vezes, durante meses, anos talvêz. Foi tão barata que já nem alma era. Tinha vendido tudo, só restava corpo e dor. Peguei na minha mochila vazia e despedi-me, literalmente.

“Não tem preço, porque não tenho alma. Vendi-a toda, já não tenho nada a oferecer. Talvêz agora seja tempo de construir uma nova.”

Virei-lhe as costas e fui-me embora.

--

--