Um discurso nunca é apenas um discurso
Não sou uma pessoa orgulhosa, acho estranho na verdade me sentir orgulhoso, mas este ano finalmente me formei e foi me concedida uma honra que admito, pedi e queria muito ter, ser orador da turma na cerimônia de formatura ( ou graduação , como queiram) Nesse fim, em conjunto com a Patrícia Sperotto, amiga e colega , que também foi escolhida para realizar este função escrevemos uma poesia.
Creio que no geral ele foi bem recebido, teve olhares estranhos e momentos engraçados e em vários momentos avaliei a plateia pra ver como se sentiam e tive dificuldades de saber o que tanta gente estava pensando.
Enfim, compartilho aqui agora, desta forma porque assim fica público e não necessariamente restrito apenas aos meus amigos e pessoas que estiveram lá o discurso.
As falas foram alternadas exceto em 2 momentos que estão assinalados. Algumas falas foram feitas em conjunto.
(Introdução)
Boa noite, Ito, se nos permite
Convite nosso é ser diferente
Saindo daqui não haverá quem não comente
(Poema 1)
Chegamos por amor
Vencemos os temores com primor
De conhecer
Vidas, pessoas, amores
E a vós queremos agradecer
Por fazerem acontecer
Em todas nós (pessoas)
Mudanças carregadas por nós (vento)
Com vocês compartilhamos
Num conjunto de espaços lindos, achamos
Cúmplices que hoje são nossos alicerces
Irmãs, amigas, família
M: Biofilia que une nossas muitas faces
Essa amizade que nos auxilia
A crescer e a ser(mos) melhores para a sociedade
e um dia liderar a universidade
(Poema 2)
Na cidade, nos localizamos
E para ela, nos esforçamos
Com quem conversamos?
Quem formamos?
Olhamos para dentro, apenas
Nesse olhar descobrimos, um mundo (em)cenas
Entretanto nos focamos em Atenas
E de culturas americanas e sarracenas
Nos olvidamos
Tanta coisa para aprender e tanta coisa pra ensinar
E para nos atrever a dialogar
Nos falta ousadia para rosnar
Destronar, se torna necessário
Desconstruir este cenário
Revolucionário o processo
De realmente fazer
Uma universidade de sucesso
Que olhe para a sociedade
Sem superioridade
E com humildade e sagacidade se comporte, seu egresso.
(Poema 3)
O processo científico começa com uma dúvida
Uma questão que nos propomos a resolver
Mas será que isso isolado irá se suster?
Sinceramente, fico lívida
Suicida, é que nos torna esse isolamento
Inútil se torna nosso conhecimento
Quando nossa ciência apenas serve
Para inflar nossos egos
Cegos pela curiosidade
Deveríamos ser?
Desde que não nos esqueçamos da validade
E de que não devemos cegamente crer
Para conhecer
Aprender
Ensinar
E divulgar
E que todas nós, saindo daqui
Quando chegarmos a foz, digamos: Eu construí!
E que possamos contagiar
Nossas alunas
Com toda empatia, respeito e amor pelas fortunas
Que essa natureza de tirar o ar
Nos presenteia todos dias
E que as humanas etnias
Entendam que o respeito pela diversidade
Da natureza não é exclusividade
(Outro — Patrícia)
Em 2016, partiu da Argentina a expedição Homeward Bound, a qual foi, até então, a maior expedição à Antártida composta somente por mulheres. O objetivo, segundo a fundadora da iniciativa, foi reunir essas inteligentes e capazes mulheres que não são vistas, não são reconhecidas, e que em grande parte, de certa forma, são colocadas de lado.
Neste semestre, entre Bacharelado e Licenciatura em Ciências Biológicas, temos 55 pessoas formandas. Dessas 55, 40 são mulheres. Estamos fazendo ciência, somos independentes, somos competentes, somos responsáveis, somos fortes, somos capazes, tão capazes quanto qualquer outro. As nossas escolhas de paraninfa e homenageada que o digam: duas mulheres que nos inspiram, que são excelentes pesquisadoras e que nos conduziram com primazia na busca pelo conhecimento em suas aulas.
Essas tantas mulheres formandas são um pequeno mas importante passo para que, em eventos como a expedição citada, o “composta apenas por mulheres” não precise mais ser noticiado, pois será ordinário do fazer ciência. Precisamos valorizar o trabalho de nós mulheres, motivo pelo qual também homenageamos hoje uma funcionária excepcional.
Estamos buscando equidade e ocupando espaços que ainda não são nossos muito devido à sociedade patriarcal em que ainda vivemos.
Ainda vivemos.
(Poema 4 — Moshin)
Antes de recomeçar a poesia gostaria de explicar algumas coisas: o que vou dizer a seguir não vem de ódio ou raiva mas vem da crença de que podemos melhorar a sociedade como um todo, parafraseando James Baldwin: eu amo o Brasil quase tanto quanto amo a minha casa e porque o amo reservo o direito eterno de poder criticá-lo.
Sobrevivo, Todos dias, acordo e cultivo
Esperança que hoje não preciso ser assertivo
Criança interna em mim grita altivo
Quero Mudança em tom decisivo
Depressivo me torno, quando vejo
Quando percebo que meu desejo
Ainda é… ver meu povo livre
Lacrimejo pois neste espaço, não há nada que nos incentive
Ainda somos poucos, só preciso de uma mão
Para contar os loucos, que aguentam a duração
Desse lugar (universidade), onde bem vindos não somos
Querem nos rebaixar( a sociedade), mas se esquecem que criamos
De Al Quaraouiyine roubaram a academia
Vossa história a nós só aludia
Como escravos e submissos, conquistados
Não somos nem nunca fomos, algemados
Vocês nos mantêm hoje
Esperam que vosso governo nos desaloje
Aguardam vossa polícia que “pacifica”
Dizem que a gente trafica
Mas viemos traficados para cá
Quem paga por esse crime?
Nos dizem para voltar para lá
Quem paga a divida desse regime?
Que nos reprime, oprime e deprime
Hoje nossa cultura vocês querem
Requerem nossa criatividade
Vaidade vossa é apenas o que é
E digo com atitude
Povo que escraviza não tem virtude
Pessoas brancas não se ofendam
Tudo que falei é para que vocês aprendam
Que do povo negro, vocês não roubam
Nem mais uma gota de sangue.
(Poema 5)
Gangue de colarinho branco, que quer tudo retroceder
Neste país só lhes interessa o poder
A fazer temos muito, para inverter
Envolver nossas almas em viver
De luta
Quem desafia minha conduta?
Todos aqueles que se silenciam
Perante as injustiças que se procriam
Financiam golpes e desmontes
Cada semana , novos afrontes
Como se não soubessemos nosso papel
De lutar contra todo esse cartel
O que eu vou ser?
Com esse diploma que vou obter
Alguém que irá ceder? ou Destemer?
Fazer renascer o alvorecer
Florecer o novo viver
(Finalização)
Conseguimos ver
Que podem tentar nos limitar intelectualmente
Querem controlar nossa coletiva mente
Mas nunca teremos nada a Temer.”
Agradeço a todos que estiveram presentes e me ajudaram nessa caminhada. Finalmente posso dizer que a minha profissão é professor de biologia e biológo.