Namíbia — A cultura ofuscada pelo mundo.

Luiza Moreira
As Artes de Viajar
Published in
5 min readJun 7, 2018

Quando se pensa nos maiores referenciais de cultura e inspiração no mundo, entre os 193 países que compõem a civilização terrestre, destacam-se facilmente a França, Itália e Espanha. Se explorado mais ao fundo ainda é possível encontrar a Grécia, Reino Unido, Japão e a Índia. Entretanto, acua-se uma imensa riqueza, um continente dividido em várias parcelas coloridas e únicas, por detrás das cortinas do espetáculo artístico promissor explorado pelo mundo, a África. O continente africano acolhe uma grande variedade de descendências, caracterizadas cada uma delas por um idioma próprio, tradições e formas artísticas. Como um reflexo de mitos, crenças e filosofias internas, a arte africana configura uma das mais exóticas e incompreendidas manifestações já encontradas. Dentro desse contexto, pontuam-se diversos países com potencial não explorado, sendo um deles a Namíbia. Oficialmente, a República da Namíbia, ganhou independência da África do Sul no dia 21 de março de 1990. Para um país independente um tanto quanto novo, é participante da SADC (Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral) e já se faz presente como um dos destinos mais cobiçados por ecoturistas, que buscam por vivenciar um dos cenários mais diferenciados e belos do mundo, como o Deserto do Kalahari e as planícies orientais. Sendo o turismo uma das principais bases da economia.

Fish River Canyon

Apesar de sua atual posição, o país retém um histórico desolado e de exploração .Anteriormente à época em que chegaram os colonizadores europeus, o território foi área de ocupação principalmente dos povos Khoisan, bem como os Hereros. Em meados do ano de 1480, os navegadores que vieram de Portugal foram os primeiros a explorar a terra. Séculos depois, a demanda passou a vir pelo Reino Unido e, pouco a pouco, os países baixos foram os ocupantes do território. Por fim, a terra passou a ser dominada pela Alemanha, ou pelo menos até a 1ª Guerra Mundial. Passada de mão em mão, a Namíbia foi administrada pelo Reino Unido até que lhe foi concedia a permissão de ser “retomada” pela África do Sul, libertando-se apenas depois de anos de guerra e desavenças, graças ao acordo feito pela Angola. Deixado a própria sorte, o país se reergueu com sua primeira eleição, optando por um membro da organização popular, Samuel Nujoma. Apesar da recuperação do poder por um indivíduo de tradições e sangue do antigo povo, marcas profundas foram deixadas em sua base populacional. Hoje, o idioma principal da região é considerado inglês e pelo menos 80% dos seus poucos 2,1 milhões de habitantes, se denominam cristãos. Essa situação diminuí e deprecia a cultura tradicional. Uma das crenças tradicionais, é a ideologia Iorubá, que originou o Candomblé e posteriormente a Umbanda. As práticas mágico-religiosas são os fenômenos por meio dos quais os homens entram em contato com entidades sobrenaturais, espíritos, deuses e ancestrais. Esse era um aspecto central da vida dos africanos e que passou a ser também na vida de seus descendentes. De acordo com a cosmologia iorubá, cada orixá influencia ou rege os diversos domínios da vida e da natureza.

Tribo Himba

Com objetivo de questionar essa situação, o livro A Máscara da África, traça uma jornada em busca de investigar as práticas religiosas locais. Através de conversas em meio a visitas a santuários e locais sagrados, o autor busca compreender a natureza das crenças africanas e recolhe depoimentos que explicam o porquê da atual situação. Alguns acreditam que o islamismo e o cristianismo tenham sido aceitos por conta do seu conceito de pós vida, diferente das africanas que oferecem um mundo de espíritos e ancestrais. A ausência de registros oficiais como a bíblia, também afetaram a situação. E por último, foi a mistificação que as instituições europeias ensinavam no período colonial que abalou mais a população, ao afirmar que os deuses africanos precisavam de sacrifícios animais e humanos como suprimento. Assim, de forma discreta, porém cativante, a Namíbia exibe obras de arte de intenso significado, confeccionadas por artistas que buscam resgatar valores e proferir expressividade, se distanciando ao máximo do fenômeno da homogeneização cultural. John Muafangejo, artista que trabalha basicamente da dualidade clássica, o branco e o preto, procura pintar as manifestações da cultura perdida e mensagens escondidas entre textos e imagens mixadas.

Natal Where Art School Is

Já Inatu Indongo, a primeira mulher negra a ter sua própria exposição na Galeria Nacional de Arte da Namíbia, desenvolve colagens que configuram seu trabalho como único e texturizado, colorido e montado sob as suas próprias perspectivas das crises e contrastes sociais que vivencio.

Sisters in Circles

Para finalizar, Tamai. Não se sabe onde mora, trabalha e nem mesmo se está vivo. O artista misterioso é um bosquímano, ou seja, um nômade derivado dos remanescentes do povo Khoisan, caracterizado pela quase total independência de materiais. Com obras sempre muito coloridas e com formas abstratas, é preciso interpretar os sinais. Sem data ou nome, é autodidata e artista de nascença.

Obra Sem Nome

Ao refletir sobre os dados e não considerar que a cultura e expressões de arte podem ser encontradas nos lugares considerados os mais desalojados do mundo, é mentir sobre a verdadeira essência da arte. A cultura presente no continente africano é apenas um dos milhares de pontos ofuscados pelo mundo. O valor atrelado as sensações, aura estética e ao poder de crítica são puramente dependentes da obra em si e, por isso, algumas vezes é preciso queimar as cortinas, para contemplar o esplendor que se encontra por trás.

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