A fantástica fábrica de robôs gigantes da Mooca

Marcos Candido
As crônicas de Marcos Candido
4 min readOct 13, 2020

Uma visita ao local onde adolescentes vestidos como robôs precisam dançar com 30 kg de material nas costas

“Robot Monste…” by Javier Piragauta is licensed under CC BY-NC-ND 2.0

Um robô de 2 metros e 50 de altura passeia por uma rua pouco iluminada na Mooca.

As únicas luzes do local são emitidas pelo LED do robô. Assim que dá os primeiros passos, as fachadas das residências tornam-se escarlates, roxas, como uma versão de Blade Runner da zona leste. Janelas se abrem. Carros param. A via, até então deserta, transforma-se em um espetáculo com plateia. Crianças montadas em bicicletas rodeiam o robô. Pais saem de veículos — motos, kombis, caminhões — e seguram os filhos nos braços para as selfies com o maquinário. “As pessoas ficam paralisadas quando meus robôs chegam”, diz Meire Faria, 45.

A empresária é dona de uma produtora que confecciona robôs. Os artefatos produzidos por ela são sensação em eventos, de aniversários a casamentos, pelo país.

A produção leva cerca de três meses e custa até R$ 18 mil. São feitos a partir de EVA, um tipo espuma sintética, com lâmpadas de LED, articulações de alumínio, tinta e dezenas de fios e peças eletrônicas. Prontos, os robôs são vestidos por “pilotos”, jovens de 17 a 18 anos que ganham até R$ 150 por noite para dançar, distribuir bebidas e agitar a noite com um canhão de fumaça (um extintor, no bom português).

Cada armadura pesa cerca de 30 kg e é rodeada por baterias para ligar as lâmpadas de LED. Para vesti-las, é preciso de 30 minutos. Os garotos, franzinos, põem um capacete, uma espécie de roupa de astronauta por baixo e mais um suporte similar a pernas-de-pau. Por cima de tudo, vestem a couraça que os transforma nos seres robóticos cujos passos emitem uma breve onda de impacto por onde pisam.

“Quando apareço como robô, muita gente fica pensando: ‘É um ser humano ou um robô de verdade?”, brinca João Victor, 18, piloto do Robozão. Uma das etapas mais difíceis enfrentadas por ele durante a fase treinamento para se tornar um robô foi a adaptação a mudanças repentinas de terreno, como escadas ou chão escorregadio. É preciso ter cuidado para não pisar em pés incautos ou em crianças eufóricas que insistem em passar entre as pernas dos robôs. “Também tem gente que bebe e vem agarrar a gente”, pontua.

Além da receptividade e da paciência para as selfies, por trás da máquina há e precisa ter muito gingado. Em uma mesma noite os robôs podem sair de uma festa de debutantes e animar um evento corporativo, povoado por engravatados. “Nós vivemos na contramão. Quando todos saem para relaxar, nós saímos para o trabalho”, diz Meire.

A produtora da empresária fabrica e aluga robôs para eventos há cerca de um ano e meio, quando outras empresas de eventos também decidiram investir no segmento. É, hoje, uma das principais do estado a oferecer o serviço, atendendo eventos durante todos os dias da semana.

“Vimos os robôs que têm por aí e investimos em material para que eles fossem mais seguros”, explica, referindo-se ao extintor que libera fumaça. Em modelos de outras produtoras, o artefato fica pendurado nas costas do robô, intensificando o peso e tirando o equilíbrio do piloto. Neste caso, o “canhão” fica na mão do robô. Mais fácil.

Mariana Pekin/UOL (Todos os direitos reservados)

Os robôs gigantes, diz Meire, estão no imaginário popular desde o sucesso da franquia de filmes “Transformers” nos cinemas. No campo da música, fez sucesso o funk “Beat do Megatron”, em referência ao robô e vilão da franquia cinematográfica. Hoje, a música de MC Kitinho tem mais de 16 milhões de visualizações no YouTube.

Devido ao sucesso das máquinas de animar festas, a concorrência não é pequena. Na internet, diversas produtoras de evento oferecem o serviço dos robôs festivos. Há, inclusive, promoções e cupons de desconto em sites de compras coletivas. O aluguel de um robô de Meire custa cerca de R$ 1.000 por uma hora de evento. O preço é parte de um pacote com outros atrativos, como barman ou animadores para crianças além dos serviços robóticos.

A fabricação dos robôs, na prática, é feita por Carlos de Paulo, 47, marido de Meire. Ele usa um óculos com um tal ar nerd e tem fascínio em resolver um problema que só ele tem a expertise de prever, enxegar e solucionar.

“É uma manutenção constante”, explica, enquanto revira caixas com dezenas de fios emaranhados. O segredo dos robôs é também um segredo: Carlos tem medo de que a concorrência bote as mãos na fórmula de sucesso. Mas a maquinaria é de livre apreciação.

Por convite da reportagem, os robôs estenderam o passeio até a avenida Sapopemba e lá entraram em uma padaria, agitaram um posto de gasolina e ergueram a mão para um ônibus. O trajeto não teve qualquer motivo, mas contou com aprovação popular e de seu criador.

“Quando olhamos para cima e vimos o que criamos, a sensação é de missão cumprida”, diz. As lentes dos óculos refletem o roxo, o verde e uma leve e contida lágrima.

(Leia matéria original em UOL Universa/Agosto de 2019)

--

--