Constância.
Conheço poucas histórias como a de Hartmut Esslinger e Steve Jobs. A história de como o primeiro alterou a aparência dos computadores da Apple para o célebre branco-neve que todos conhecemos. Um processo longo e paciente entre dois profissionais reconhecidos pela indústria antes e depois desta colaboração que os livros de história foram obrigados a incluir. Dotados de talento e ego em doses tão entoxicantes que me parece um milagre terem podido partilhar a mesma sala, por uma vez que fosse. Fizeram muito mais do que isso.
Esslinger pensou, planeou e apresentou a Jobs várias e diferentes possibilidades de design para os computadores da Apple. Contam eles que de todas as vezes as ideias foram apresentadas da mesma forma, prontas a implementar e devidamente defendidas. Quase sempre a resposta foi
– não. Faz outra vez.
E ele fez. Outra vez e outra e outra, até que uma vez, uma só vez, a resposta foi outra
– Sim. Vamos usar isto.
Desta vez, como em todas as anteriores, o designer foi pago pelo seu trabalho, manteve os seus objectivos e condições de trabalho inalteradas, e o cliente pode escolher o trabalho que quis para a sua empresa.
Conto sempre esta história com a sensação de estar a mentir. E, não é porque as personagens são quem são, com todo o exagero que há nas histórias que deles se contam. É porque sinceramente, na minha vida profissional, em todos os projetos criativos em que trabalhei, nos últimos 15 anos, não me lembro de ter visto nada assim. Não me levem a mal os talentosos, ambiciosos e generosos, criativos e clientes, com quem tenho trabalhado. Aprendi muito com quase todos vocês, e o que não aprendi, francamente, foi quase sempre porque não fui capaz, naquele momento, pelo menos. Mas, nunca, em nenhum momento, me lembro de saborear esta rotina de trabalho em que a exigência é apenas a normalidade e a rotina é tão-só fazer muito-bem. Conheço bem demais o cansaço do fazer muito-e-bem e o aborrecido que é viver-se o não-faz-ninguém.
Gostava só de conhecer mais histórias para contar em que as personagens não são avaliadas pelo sucesso do seu trabalho mas pelo seu trabalho. Gostava mesmo
(pode ser agora mesmo, em resposta a esta história, se quiserem).