O Pirata e o Imperador

Alexandre Lemos
Histórias para o Diário de Coimbra
2 min readNov 22, 2015

Conta o Santo Agostinho no seu livro “De Civitate Dei” (a que nós chamamos “A Cidade de Deus”) a história de um pirata capturado pelos soldados de Alexandre o Grande. Homem de reconhecidas fúrias e feitos, Alexandre, exigiu uma explicação ao pirata

– Como te atreves a aterrorizar os mares?

O pirata, talvez ciente que uma vez ali nenhuma palavra gentil lhe podia salvar o pescoço, replicou

– Eu tenho um pequeno barco e chamam-me pirata e ladrão. Mas, tu, com a tua armada e barcos e soldados, aterrorizas o mundo inteiro.

Para depois devolver a pergunta do imperador

– Como te atreves a aterrorizar o mundo?

Esta história foi contada muitas vezes em 5 séculos. Nem sempre para descrever o mundo dividido entre a terra e os céus, como pretendia a obra de Santo Agostinho. Eu encontrei-a num pedaço de livro do americano Noam Chomsky, em português, o título será algo como: “Piratas e Imperadores, Velhos e Novos. O Terror que nos Vendem e o Mundo Real.”

(o mesmo Chomsky que alguém se lembrou de citar nas paredes de Coimbra recentemente)

Nem Santo Agostinho, nem Noam Chomsky, terão contado a história para apresentar o pirata como um bom rapaz cuja pequena violência tinha menos importância que as maldades de um exército liderado por um poderoso imperador capaz de conquistar mais de meio mundo. Mas, porque um e o outro, o pirata e o imperador, frente-a-frente nesta pergunta

– Como te atreves a aterrorizar?

atacam por igual a vida dos inocentes.

O nome que lhes damos ou o dedo com que os apontamos não importam muito para quem sofre nas suas mãos.

Facsimile: Aurelius Augustinus: De Civitate Dei. Olomouc ( Wikimedia Commons)

(esta história foi primeiro publicada no Diário de Coimbra de 22 de Novembro de 2015)

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