Escrevi meu primeiro conto

Estou editando esta história há alguns anos, mas sinto que ela deve voar

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3 min readApr 17, 2020

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Ler sempre foi um passatempo muito presente na minha adolescência. Entre um livro e outro me arriscava escrevendo algumas histórias bobas, alguns parágrafos sobre o dia a dia e até cartas para personagens fictícios.

Assim nasceu um conto simples sobre dois rapazes. Ele chegou a ser roteirizado dentro de uma oficina de cinema que participei em Belém, na Fundação Curro Velho. Chegamos a gravar algumas cenas, mas o projeto não andou.

O conto foi escrito um pouco antes de eu entrar na faculdade, em 2011. E desde lá venho adicionando e retirando palavras, refazendo frases…na intenção de melhorar a leitura. Mas acho que já é hora de deixar ele livre :)

Photo by zenad nabil on Unsplash

Duas Maçãs

Ele acabara de virar a esquina. Deu sorte. Sua bicicleta estava sem freios. Seria uma tragédia morrer atropelado enquanto comprava cinco goiabas. Sim, cinco goiabas para o suco do almoço — foi o que sua mãe lhe pediu pra comprar na quitanda do outro lado da avenida.

Parou em frente a uma caixa de acerolas. Com uma mão segurava o guidão, com a outra o banco, e, quase como um equilibrista, puxou com o pé o descanso da sua bicicleta. Pedro sentia-se orgulhoso de tal coordenação.

Cinco goiabas pensava enquanto catava uma aqui, outra ali, tentando escolher as mais maduras e adocicadas. Se tratando de escolher frutas, Pedro não entendia nada, mas colocou no saco plástico cinco daquelas que mais lhe chamaram atenção: as maiores.

Voltou do fundo da quitanda e seguia em direção ao balcão para pagar pelas goiabas.

Atrás do balcão, um rapaz de boné e camiseta cinza pediu gentilmente: — O seu, por favor — e estendeu as mãos pra pegar e pesar o saco de frutas. Pedro não costumava reparar nas pessoas, principalmente em homens. Enquanto a balança cumpria sua função, Pedro sentiu-se instigado a olhar aquele rapaz.

Dario era um homem de corpo escandaloso. Tinha nos olhos grandes um caramelo suave, na musculatura do peitoral, traços quadrados. Com ombros largos e barba mal feita derramava um sorriso atraente. Possuía mãos grandes e um olhar ardente.

- Deu R$ 3.00. Algo mais? — perguntou Dario, a voz barítona. Pedro não notou a pergunta — fitava e seguia o corte em V da camiseta do vendedor. Seu olhar continuava a descer.

-Algo mais? — insistiu gentilmente Dario. — Na…não, não! — gaguejou Pedro — Quanto é mesmo? — estava confuso. — R$ 3.00 — mais gentil, quase sedutor. Dario era consciente de seu corpo e compreendia os devaneios alheios. Parecia ter sido lapidado e esculpido à mão da robusta delicadeza. Em consciência maior, pode ver a imaginação de Pedro. Deu um sorriso e matutou algo.

Agora com o pensamento dentro da quitanda, Pedro procurou o dinheiro. Estendeu uma nota de R$ 20.00 com as mãos trêmulas. Estava pouco ofegante.

Isso…isso…é estranho. Pensou Pedro esperando o troco. Como que proposital, o rapaz do balcão pegou uma nota de dez, uma de cinco e duas moedas. Dobrou as cédulas, juntou-as às moedas e segurou na ponta dos dedos ásperos.

Pedro pegou o troco, os seus dedos diferentes, delicados e suaves, tocaram os de Dario. É verdade que sua respiração travou, suas pernas bambearam e o coração acelerou. Todavia, tudo piorou — ou melhorou — no momento em que Dario, com aquele olhar de intenções, pôs a outra mão por baixo da dele.

A palma áspera colou na costa da mão de Pedro. — Muito obrigado! — disse Pedro e puxou a mão daquele contato excitante e demorado.

Nervoso, colocou o dinheiro no bolso, respirou fundo, subiu na bicicleta, mas não se lembrava de andar.

Olhou pela última vez para o rapaz no balcão. Podia dizer pra si que queria resposta pra tal situação.

Dario não acenou, apenas levantou uma das sobrancelhas e sorriu pelo canto dos lábios carnudos.

Pedro foi para casa e entregando as goiabas à mãe, disse: — Mãe, posso comprar duas maçãs?

É isso :)
Se esta história vai ganhar o mundo, não sei.
O importante é que a libertei e isso já me deixa feliz!

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Publicitário, nortista e designer que trabalha com UX e adora livros.