5. Roupão, o traje da desistência
Usou dedo médio, indicador e dedão para sentir a textura do tecido. Estava na dúvida entre o azul marinho e o verde água.
_Macio, muito macio. Elegante o azul. Esse verde água também tá bonito…
_É Tiffany! — a vendedora corrigiu na melhor das intenções. A treinadora de vendas havia reforçado: magenta, tiffany, turquesa; porque valoriza, dá glamour.
_Ah, sim. Tiffany.
_ Isso. Dei um desses pra minha mãe. Ficou lindo nela, olha, vai ficar ótimo em você! — E estendeu o roupão na frente do corpo, erguendo a manga direita.
_ Legal… Sua mãe tem quantos anos?
_ Um pouquinho mais que você — sorriu, mostrando os dentes brancos, muito bem alinhados, uma manchinha de batom rosa choque no canino direito— Eu nasci quando ela era beeem nova.
Fez, mentalmente, todas as contas possíveis e concluiu que a mãe da mocinha tinha entre 37 e 40 anos.
Tudo bem, gente jovem perde a noção de idade. Quando eu tinha 20, colocava as pessoas dos 30 aos 40 todas na mesma faixa etária. Agora, aos 30, me sinto muito mais próxima dessa vendedora, que deve ter, no máximo, 21, do que da mãe dela, que talvez tenha 37. Eu poderia beber vodka com ela sentada na sarjeta, poderia usar esse jeans rasgado no joelho, mas certamente não ganharia um roupão Tiffany da minha filha. Porque, afinal, não tenho uma filha.
_ Hmm. Ah! E esse branco? Lindo! Esse eu não tinha visto... Mesmo preço? Ótimo. Vou levar esse. M. Não precisa de embrulho. Tem desconto à vista?
Existia a piada interna: quando eu comprar um roupão e adotar um gato, é porque desisti de tudo.
Branco e felpudo. Encarde, mas acho lindo. Falta o gato. Letícia vai rir disso. Com certeza, a mocinha da loja não tem um roupão.