Relato de projeto
Abri esse documento para registrar um projeto de aplicação de ensino híbrido e da inversão da sala de aula realizado com três turmas do segundo ano do ensino médio do Colégio Rio Branco em 2014. Começo o registro já com o projeto em andamento, mas vou atualizando no decorrer do ano.
Tiago Bevilaqua — professor e assessor pedagógico
Contexto
O Ensino Estruturado e a sala de aula invertida
O Colégio Rio Branco conta com uma metodologia de ensino — o ensino estruturado com leitura prévia — que torna extremamente natural a aplicação da inversão da sala de aula.
Durante o ano de 2013 eu promovi a aplicação da inversão da sala de aula dentro do contexto do Colégio Rio Branco (usando o Moodle) nas minhas três turmas de segundo ano.
Na minha versão do ensino estruturado, dividi cada conceito a ser estudado em cinco momentos de classe, mais um momento de "lição de casa". O processo todo é explicado aos alunos na primeira aula do ano, usando uma apresentação em Prezi (LINK). Note que cada momento não corresponde necessariamente a uma aula. Os passos 1 e 5 são quase sempre menores que uma aula, enquanto o passo 3 na maioria das vezes dura pelo menos duas aulas.
- Passo 0: PREPARO PRÉVIO
O aluno deve assistir a um ou mais vídeos em casa, com conhecimentos prévios necessários e com o conteúdo novo. Se necessário, o aluno deve fazer anotações do que se tratava o vídeo e de suas dúvidas. Aqui, utilizo vídeos produzidos por mim (publicados no Canal RedeXplica) e também de outras fontes, sempre procurando utilizar canais também reconhecidos pelo YouTube EDU. Abaixo, o exemplo de um dos vídeos utilizados.
- Passo 1: CONSTRUÇÃO
Abro a fase de registro escrevendo na lousa o título do conceito a ser estudado. A partir de então, os alunos constroem juntos o novo conceito e eu organizo em um registro na lousa. Usando meu smartphone, fotografo o registro construído pela classe e publico, instantaneamente, no caderno compartilhado da classe. Todas as lousas mais relevantes das minhas aulas são fotografadas e publicadas em um caderno compartilhado no Evernote (para saber mais, clique aqui e assista ao vídeo feito para explicar como o aluno consegue acessar o seu caderno), deixando o aluno livre para fazer o seu registro livremente, mesmo que diferente do registro que a turma construiu junto comigo. Ainda assim, verifico os cadernos periodicamente (valendo nota) para me certificar que todos têm os registros em dia e possam realizar a Verificação Parcial — avaliação com consulta que ocorre no meio do bimestre — com as ferramentas necessárias à disposição. Alunos de qualquer uma das três turmas podem acessar os cadernos das outras e isso é ótimo, pois os registros acabam sendo bem diferentes entre si, na maioria das vezes.
- Passo 2: EXEMPLOS
A partir do registro, faço alguns exemplos de exercícios deixando claro qual o objetivo daquele bloco de aulas, ou seja, que tipo de exercício eles devem ser capazes de executar quando chegarmos ao passo 5. Tudo é registrado no Evernote. - Passo 3: EXERCÍCIOS
Essa é a fase mais longa e mais importante de todo o processo. Solicito a resolução de alguns exercícios como tarefa mínima e permito que os alunos organizem a sala em duplas, trios ou pequenos grupos. Durante essa fase, os alunos podem fazer uso dos smartphones para acessar o caderno compartilhado da turma no Evernote e podem tirar dúvidas de conteúdos anteriores. Circulo pela sala tirando dúvidas, trocando alunos de grupos, se necessário. Nesse momento posso, além de tirar as dúvidas de maneira muito mais próxima e individualizada, diagnosticar quais são as dúvidas mais comuns na classe para me preparar para o passo 4. - Passo 4: FECHAMENTO
Sempre começo o passo 4 no início de uma aula. Volto para a lousa e comento as dificuldades mais comuns durante a fase de exercícios. Faço os exercícios que provocaram mais dúvidas e, se necessário, revisamos algum conteúdo com lacunas. Os alunos fazem quaisquer questionamentos finais e avaliamos se podemos passar para o passo 5 ou se voltamos para o 3. - Passo 5: ORIENTAÇÃO PARA O PRÓXIMO CONCEITO
Últimos comentários a respeito do conceito estudado e de suas conexões com conceitos prévia e futuramente estudados. Faço as orientações sobre o próximo preparo prévio e fechamos o bloco. Esse passo ocorre sempre ocorrendo ao fim da aula.
As novidades para 2014
Avaliação do processo anterior
A experiência de 2013 foi extremamente positiva, mas os princípios de ensino híbrido ainda podiam ser aprimorados. A adesão ao preparo prévio ainda não era a que eu queria e o desempenho do Moodle se mostrou insuficiente em relação à comunicação entre os estudantes, navegação em dispositivos móveis e geração de relatórios (os dados de acesso exportáveis são extremamente crus).
Além disso, tentando resgatar a questão motivadora do preparo prévio, iniciei o ano de 2014 ainda utilizando o Moodle, mas pesquisando já junto a alguns dos alunos mais engajados o que eles mais gostariam de ter, caso eu adotasse outra plataforma. Depois de muitos testes em diferentes sistemas, iniciei o uso do Edmodo no segundo bimestre, orientando os alunos em sala para instalação do aplicativo e criação de usuário em seus smartphones e publicando orientações no Moodle, que é institucional.
Implantação do Edmodo
Durante o segundo bimestre, os alunos ficaram livres para fazer suas atividades a distância tanto pelo Moodle quanto pelo Edmodo, mas já nas primeiras postagens ficou claro o quão mais disponíveis a participar eles estavam.
Num primeiro momento, os alunos apenas precisavam confirmar o preparo, sem responder a nada. Nesse ponto do piloto eu tentava avaliar se o fato de eu pedir para que eles fizessem alguma coisa além de assistir ao vídeo iria reduzir o nível de engajamento dos alunos, o que não ocorreu. Desde o início do piloto sempre houve mais preparos executados pelo Edmodo do que pelo Moodle.
Criei uma enquete para que os alunos expressassem suas preferências e comentassem o que estavam achando do projeto.
Chamo a atenção para dois comentários. Em primeiro lugar, o do aluno Diego J., surdo, que não precisa realizar as atividades de preparo prévio, já que não há material disponível com interpretação em Libras e não seria justo cobrá-lo em sua segunda língua, o português. Os alunos surdos são solicitados quanto às atividades de preparo prévio, mas para eles isso não vale nota.
Melhor do que moodle, Edomo é impossível qualidade ruim. Gostei mesmo, pois mais fácil para estudar e visual bem…
Obrigado!
Em segundo lugar, o comentário do aluno Leonardo L., que depois comentou em classe que quase nunca tirava nota acima da média no componente de Trabalhos Cotidianos (componente no qual entram as notas recebidas nas atividades realizadas online).
Tenho também a informação muito mais rápido. O trabalho que acabou de ser agendado para daqui 16 dias, por exemplo, já apareceu como notificação, e eu já soube que tinha que ser feito antes mesmo de ser cobrado em sala. Já está entregue antes mesmo de ser cobrado!
Depois de um curto tempo de adaptação, passei a cobrar sempre uma pergunta motivadora junto à atividade, tanto no Moodle quanto no Edmodo. Assim, ao invés de dar nota apenas para o acesso ao material na data certa e cobrar a pergunta motivadora oral e randomicamente e apenas para alguns alunos no passo 1, juntei as duas atividades. A essa altura do projeto, pouquíssimos alunos ainda faziam as atividades pelo Moodle. O principal motivo apontado por eles eram:
- O aplicativo do Edmodo os notificava no smartphone quando precisavam fazer tarefas ou quando alguém postava algo para eles.
- Eles podiam comentar algo, fazer uma tarefa ou se comunicar com os colegas e comigo por meio do aplicativo, durante o intervalo ou até no caminho entre a escola e suas casas.
- O feedback dos colegas e do professor era mais rápido pelo Edmodo.
Para mim, a principal vantagem era, além de um engajamento muito maior dos estudantes, o fato de que eu podia avaliá-los e tirar dúvidas de maneira muito mais rápida e fácil, principalmente no aplicativo de iPad.
Além disso, eu consegui otimizar o meu tempo de feedback e reforçar positivamente de maneira muito mais eficiente o trabalho bem feito dos alunos de destaque.
Com isso, passei a ter uma avaliação muito mais personalizada e pude resgatar no passo 1 os erros mais comuns no preparo prévio, além de tornar a nota um indicador qualitativo de compreensão do conteúdo, e não só quantitativo.
O trabalho de seminários
Experiência anterior
Já havia um projeto muito interessante de trabalho em grupo ocorrendo nos anos anteriores. Dividimos alguns dos conteúdos de geometria espacial em oito temas para apresentação de seminários.
- Cubo
- Paralelepípedo retângulo
- Prisma de base triangular
- Prisma de base hexagonal
- Cilindro
- Pirâmide de base quadrada
- Pirâmide de base triangular
- Pirâmide de base hexagonal
Os demais assuntos do tema (geometria espacial) e alguns complementos intermediários ainda seriam guiados por mim, e não pelos grupos.
Cada grupo recebia um tema e era responsável por pesquisar previamente material para disponibilizar para a turma como preparo prévio, realizar um seminário sobre o assunto e tirar as dúvidas sobre os exercícios propostos. Ou seja, o grupo era responsável pelo material do passo 0 e pelos passos 1, 2 e 3.
Proposta para 2014
Com o suporte do Edmodo e a incorporação da pergunta motivadora à tarefa, a execução do projeto foi um pouco modificada.
Depois de sorteado o tema de cada grupo, os membros da equipe recebiam uma tarefa solicitando o preparo prévio para, no mínimo, 4 dias antes de sua apresentação.
Com o material e a pergunta enviados, eu crio a tarefa para a turma em questão.
No dia do seminário, os alunos apresentadores devem retomar a questão motivadora, realizar um registro dos conteúdos e fazer exemplos. Depois (na mesma aula ou na aula seguinte), tiram dúvidas da turma. Por fim, ficam responsáveis por tirar as dúvidas que forem postadas no Edmodo.
Depois da apresentação do grupo, crio uma enquete no Edmodo para os outros alunos da turma avaliarem o seminário. Essa média também compoem a nota do trabalho.
Para cada um dos temas, temos uma página organizando o material de apoio pesquisado pelos três grupos, bem como a apresentação dos grupos que quiseram ser filmados (eles escolhem se querem sua apresentação no material ou não).
O material todo é compilado em uma página no Medium (como essa que você está lendo) e serve tanto para registrar nosso trabalho quanto de referência para estudos na Prova Unificada (a avaliação bimestral do Colégio Rio Branco).
Clicando no link abaixo você acessa as páginas que já estão em construção ou finalizadas.
As páginas finalizadas serão apresentadas no Encontro Cultural e, além do imenso valor que elas têm como material coletivamente construído e para os estudos dos alunos, há ainda o valor adicional de compartilhamento que é fomentado. Os alunos têm a oportunidade de interagir com os colegas durante a elaboração do trabalho e com qualquer pessoa, já que o material é publicado online e pode ser comentado por qualquer pessoa conectada ao Facebook. Desenvolver nos alunos a capacidade de trabalhar em grupo e colaborar em um ambiente online é uma habilidade essencial para o futuro desses jovens.
Grupos de estudo virtuais
Compartilhamento e colaboração
Inspirado na idéia do aplicativo colaborativo Brainly, mantive a timeline principal do Edmodo para que os alunos postassem dúvidas de exercícios que estivessem fazendo em seus estudos, em casa. Os alunos conseguem fazer isso pelo celular, tirando uma foto de um exercício, se preciso. Permito inclusive que eles postem dúvidas de exercícios que não foram propostos, conteúdos de anos anteriores ou futuros e mesmo listas do Núcleo de Apoio (grupo de professores que realiza o trabalho de reforço e complementação de estudos no Colégio Rio Branco).
Os alunos têm a oportunidade de colaborar no nosso grupo, respondendo e comentando as respostas uns dos outros.
Eu não havia previsto ainda a possibilidade de o aluno filmar um vídeo com a resolução pelo próprio aplicativo no smartphone e postar, ajudando o colega. Isso aconteceu pela primeira vez nos estudos para a Verificação Parcial do terceiro bimestre (foram 89 interações realizadas por alunos no sistema somente na tarde da véspera da avaliação, praticamente sem interferência minha).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
- Blended Learning: Personalizing Education for Students — Brian Greenberg, Rob Schwartz, Michael Horn
- A cultura da participação — Clay Shyrky
