Como praticar yoga pode mudar o jeito que você trabalha (e toda sua vida)

Laura Barcelos
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8 min readJun 22, 2018

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Lições de uma yogini apaixonada e workaholic

Antes de mais nada, eu preciso dizer: eu não acho que você deveria fazer Yoga para mudar o jeito que você trabalha. É isso mesmo. Mas calma, o título do texto não quer te enganar.

O fato é que se eu achasse isso e escrevesse pra te convencer, eu estaria concordando com o atual sistema de trabalho, que nos quer sempre (mais e mais) produtivos, focados, dedicados a empregos que, frequentemente, muito nos exigem (carga horária excessiva, dedicação exclusiva, hora extra, metas super exigentes etc etc), mas pouco nos dão em troca.

O que eu realmente acredito é que o Yoga nos deixa mais felizes e conscientes. E com a prática, sua vida realmente pode mudar (tipo, mesmo) em muitos aspectos, inclusive, no trabalho. Por isso, como pessoa que tem sentido na pele essas mudanças que o Yoga traz, sinto uma vontade imensa de estimular mais e mais pessoas a experimentarem a prática. Pelo objetivo que for, seja para buscar espiritualidade, melhorar a saúde ou a forma como trabalha.

E acontece que eu também trabalho e, depois de repensar e renascer várias vezes, hoje gosto muito do que faço, tanto na minha fonte de renda quanto nos meus projetos paralelos. Depois de todas lições que o Yoga me ensinou sobre mim mesma e a relação com meus pensamentos e emoções, passei a perceber a influência da prática na forma como eu lido com a minha rotina, na sensação de bem-estar, nas atividades e compromissos profissionais diários. E foi (e é) incrível.

Então o acordo é esse: não vim te convencer de nada, mas você pode encontrar aqui muitos motivos para fazer Yoga. Esse texto é muito mais um relato de experiência que vivo diariamente do que qualquer outra coisa.

Primeiro, é importante dizer: Yoga não é só uma sequência de asanas (aquelas posturas espetaculares que, algumas vezes, mais parece de contorcionista).

Essa filosofia de vida, fundada por Shiva há mais de 5 mil anos na Índia, é constituída por passos e fundamentos que foram passados dos mestres para seus discípulos e, assim, de geração em geração até os dias de hoje.

Na tradução do sânscrito, a palavra yoga poderia significar integrar, unir. O Patanjali, um dos mestres, explica que o yoga é o direcionamento total dos sentidos e pensamentos a um fluxo de estabilidade.

Tudo muito lindo mas e o que isso tem a ver com o trabalho? Você deve estar se perguntando.

Algumas dessas considerações trago a seguir. Se fizer sentido (ou não) para você, vou adorar saber :)

Energia

Sabe quando a gente tem a sensação de a preguiça ter estacionado pra sempre no corpo depois de ter dormido mal e então entrar num ciclo de cansaço que não termina?

Pois é, sabemos. E isso não era tão frequente pra mim mas era recorrente a ponto de incomodar. Com o início da prática de yoga, essa é uma das mudanças mais visíveis a curto prazo. Percebi que nos dias que eu praticava (2 ou 3 vezes na semana), o cansaço desaparecia e a energia ia lá em cima. A disposição para realizar ficou maior e já passei a fazer mais atividades e tarefas do que no tempo sem yoga. Quando intensifiquei a prática para de 6 a 7 dias na semana, pensei que ficaria acabada, que seria mais difícil acordar, e foi justamente o contrário: uma sensação contínua de bem-estar, mais disposição, energia e menos sono ou preguiça (mãe da procrastinação, fica a dica).

Concentração (dharana) e foco (dhyana)

No Yoga, a prática de respiração, meditação e postura convergem para a atenção verdadeira no momento presente. Já tentou fazer uma invertida sem prestar atenção no que está fazendo? Não tenta, dá pra cair bem feio. E meditar fazendo lista mental do que precisa fazer naquele dia? Não rola!

A concentração no seu corpo, na respiração, no aqui e no agora nos direciona para um estado meditativo e com o corpo e a mente vamos nos treinando para aquietar aquele macaco interno que combatemos diariamente (que não para quieto e vive ansioso). Com a prática intensa e o foco contínuo que vamos desenvolvendo, nos conectamos com nosso centro e nossa estabilidade, e os pensamentos desnecessários deixam de perturbar.

Passando pro dia a dia de trabalho, o foco e a concentração proporcionam um estado de presença que reduz muito a ansiedade. A vontade de fazer várias tarefas ao mesmo tempo é substituída pelo hábito de iniciar e terminar uma só tarefa, de forma consciente e completa.

Além disso, a atenção no presente traz mais qualidade nas relações interpessoais (tanto do trabalho quanto de fora dele), a escuta se torna mais verdadeira e as conversas mais objetivas e significativas. Outro ponto de mudança foi uma maior facilidade na resolução de problemas: quando se está concentrado, menos dúvidas surgem e isso nos faz tomar decisões de forma mais calma e inteligente.

Disciplina (tapas)

“Tô gostando disso aí, amanhã vou começar a seguir a filosofia do Yoga e minha vida vai mudar!”

Vai, mas não do dia pra noite.

A prática de Yoga é sincera. Quanto maior a entrega que damos, maior o efeito que sentimos na mente, no corpo, no dia a dia. Por isso que o Yoga ensina sobre disciplina. O processo é gradual, constante e cumulativo, a cada momento de meditação, respiração profunda, estudo dos fundamentos ou asanas damos um passo a mais na construção de um hábito.

Na prática diária, isso fica ainda mais claro. Se me comprometi comigo mesma em praticar todos os dias, preciso organizar muito bem minha rotina pra não me auto-sabotar. Isso implica talvez levantar mais cedo para praticar antes do trabalho e assim criar o hábito de dormir antes. A partir disso, podemos começar a nos questionar sobre a nossa saúde e alimentação e a ter um cuidado maior com ações que podem influenciar o nosso bem-estar. Assim, aos poucos vamos desenvolvendo disciplina pra seguir com um propósito maior.

No trabalho, isso se reflete em maior organização com horários, priorização de tarefas, clareza de demandas e metas e foco naquilo que me comprometo a fazer.

Impermanência e desapego

Os asanas (posturas) raramente machucam se feitos corretamente, mas eles podem ser incômodos algumas vezes. Mesmo a postura de lótus ou outra postura simples para meditar pode gerar um certo desconforto em permanecer nela por um período mais longo. É aí que a prática ensina sobre impermanência. Não vamos ficar o dia todo naquela postura, ela faz parte do processo, mas em breve (talvez em mais ou menos tempo) vamos transicionar para outra postura e o incômodo passa. Tudo passa, nada é permanente na vida. Nem a tristeza mais profunda, ou a raiva mais louca, e nem a alegria mais intensa; tudo muda.

E esse entendimento nos estimula a ter uma visão mais ampla e calma sobre os cenários vividos diariamente no trabalho, fazendo com que a gente tome menos decisões precipitadas ou sinta menos ansiedade com algo que parece não ser possível de se resolver naquele momento.

Do lado disso, batendo na porta, está nosso velho amigo controle, aquele que gostamos tanto que grudamos nele que nem chiclete no cabelo em uma tentativa de fazer com que tudo saia como planejamos. Claro que é importante ter organização, mas o desapego de um controle muito rígido nos torna mais preparados para lidar com imprevistos.

Hoje lido muito melhor com o inesperado do que há um ano atrás e o desapego trouxe mais liberdade de tranquilidade pra entender que não preciso de controle pras coisas darem certo. Também percebo uma adaptabilidade a mudanças muito maior, habilidade que compõe a nossa inteligência emocional.

Gratidão

Eu sei, talvez você esteja cansado de ouvir essa palavra sendo usada por aí. Mas você já agradeceu pela sua vida hoje? Pela oportunidade de estar vivo e principalmente por ser exatamente quem você é?

No Yoga, depois de toda a prática, de estar presente, de ter atenção consigo mesmo, de focar na sua evolução, de sentir a entrega, uma conclusão é latente dentro de nós: a gente já é e tem tudo que se precisa pra ser o mais feliz possível. É um pensamento tão simples mas que esquecemos diariamente. E acredite, tem um poder imenso.

Por mais que dê tudo errado no seu dia, que você se sinta triste, que brigue com alguém do trabalho, você está vivo e a cada manhã, ganhamos um novo dia de presente pra seguir evoluindo, buscando, aprendendo, sendo.

Na prática, ser grato (a) nos faz dar mais valor para cada conversa, nos traz pro presente, nos deixa despertos, nos motiva a fazer melhor, a fazer diferente, a questionar e a mudar o que não faz sentido. Esse sentimento estimula outro: o sentimento de contentamento, pelo que se é, pelo que se vive, pelo aqui e agora. E aí experimentamos aquela paz que pedimos todo dia.

Claro que não tem fórmula mágica, essas percepções não surgiram na mente de um dia pro outro, mas foram sendo construídas de pouco em pouco a cada prática e com bastante auto-reflexão, bem como tudo nessa jornada louca que é a vida. E como o processo é contínuo, já estou curiosa pra saber que outras surpresas vêm pela frente :)

E então, bora praticar?

Gostou do papo e quer continuar conversando? Me escreve no barcelos.lau@gmail.com ou no @nomundodelaura.

Quer conhecer estudos que falam desse tema? Dá uma olhada aqui e aqui.

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