Análise | Assault Spy (PC)

Uma ideia boa arruinada por problemas técnicos, combos abusivos e jogabilidade desnecessariamente extensa.

Rafael Smeers
Aventurine Brasil
10 min readOct 10, 2018

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Art © by Wazen & NIS America, Inc.

Inicialmente disponibilizado em acesso antecipado na Steam em 7 de maio de 2018, Assault Spy foi lançado oficialmente no dia 2 deste mês, totalizando cerca de seis meses de desenvolvimento em acesso antecipado. O título inaugural da Wazen foi publicado pela NIS America, despertando o interesse daqueles que conhecem a qualidade dos jogos da publisher.

O game, categorizado na Steam nos gêneros Ação e Indie, conta com batalhas no estilo hack and slash e uma temática corporativa e tecnológica, onde o jogador deve enfrentar robôs de segurança para avançar em seu objetivo. Assault Spy oferece “duas campanhas diferentes” e está disponível para aquisição via Steam (Windows) e ainda não tem previsão de chegada para outras plataformas.

O título não conta com localização para o Português Brasileiro.
Não possui modo multiplayer local e/ou online.
Esta análise contém spoilers leves.

Enredo

Uma trama simples, constituída de bom humor e algumas surpresas

O jogador assume o controle de Asaru Vito, um espião de uma corporação misteriosa em “Japam” sempre acompanhado de Kanoko Yotsuba, uma aprendiz descuidada que sempre acaba atrapalhando o serviço de Asaru e denegrindo o nome dele na empresa. Sempre que o espião tenta explicar a situação para o seu chefe, ele acaba repreendido com lições de que deveria ser um bom tutor em vez de reclamar de sua aprendiz.

Só três pontos de exclamação? Isso aí é reação de quem esqueceu o celular em casa!

No começo do jogo, os personagens parecem um tanto quanto genéricos e desinteressantes, mas a relação de cada um deles (apesar de clichê) concede ao enredo um nível balanceado de complexidade. A trama principal começa quando Asaru recebe a missão de infiltrar e coletar informações sigilosas de uma mega corporação global de inteligência artificial de segurança chamada Negabot.

Chegando lá, Asaru e Kanoko se deparam com uma confusão: os robôs de segurança da empresa estavam expulsando todos funcionários, que acabavam de ser demitidos. Após defender os funcionários de alguns robôs na entrada principal do prédio, Asaru e Kanoko são confundidos com agentes do governo e convenientemente instruídos a entrar.

Já dentro da recepção/hall principal da empresa, duas figuras que se identificam por Mr. Showtime (homem misterioso e mudo) e Chidori realizam um comunicado no telão, oficializando a demissão em massa e declarando-se os novos donos da Negabot. Ambos passam a ser considerados terroristas.

Logo depois de enfrentarem outro grupo de robôs, Asaru e Kanoko são abordados por um robô controlado pela professora Irene Yoneda, diretora da empresa que conta com a ajuda dos protagonistas para expulsar a dupla de terroristas do prédio. Porém, eles se encontram em uma das salas mais seguras da empresa, e o jogador tem de coletar um total de quatro permissões (três delas espalhadas por três estágios diferentes) para alcançá-los.

Obviamente, a dupla de terroristas faz de tudo para impedir que isso aconteça, enquanto também tentam adquirir um “código supremo” de administração que permite controlar todos os robôs de segurança criados pela Negabot e espalhados pelo mundo. Apesar de terem caído na situação de paraquedas, Asaru considera o ocorrido uma oportunidade de coletar as informações sigilosas que procura e decide ajudar Yoneda, esbarrando com alguns outros personagens no processo.

Enquanto o enredo conta com uma boa construção de detalhes e uma porção satisfatória de humor e de surpresas, existem também algumas falhas. Kazama (personagem que atua como uma espécie de rival de Asaru) e o próprio Mr. Showtime não recebem muita atenção. As características de Mr. Showtime não são justificadas, e a história de Kazama é um mistério. Vale notar que uma cutscene no final da campanha de Asaru supõe uma expansão, atualização ou um próximo jogo da franquia.

Espero que essa não seja a desculpa da Wazen

Na campanha de Amelia (desbloqueada após encontrá-la na campanha de Asaru), uma agente “Mamericana” da CIA, a maioria dos papeis assumidos na história se invertem, e o enredo se torna praticamente um filme da sessão da tarde. Apesar de não ser o enredo canônico, trata-se de uma fonte de risadas para quem já se acostumou às características comuns de cada personagem.

Está aí uma dupla mais assutadora do que Chidori e Mr. Showtime

Gameplay

Dash, Mouse 1, Dash, Mouse 1, Dash, Mouse 1…

A jogabilidade de Assault Spy se constrói (infelizmente) através de batalhas repetitivas com inimigos pouco variados, combos abusivos e derrotas pouco significantes. Asaru tem 5 unidades de vida, que quando esgotadas, retornam o jogador ao último checkpoint. Ao mesmo tempo em que os checkpoints são muito frequentes e a punição por ser derrotado é praticamente insignificativa, a invencibilidade concedida ao jogador após ser atingido por um golpe é praticamente nula. Isso faz com que séries de cinco projéteis ironicamente acabem com o jogador de uma vez só (ao menos quando um inimigo não morre acidentalmente e um refrigerante misteriosamente desliza até você).

As salas do prédio, em sua maioria, são compostas por no máximo uma ou duas batalhas cada. Não é possível avançar para outras salas sem entrar em batalha e/ou sem derrotar todos os oponentes presentes nela. Os inimigos variam entre celulares carregando armas (que muito provavelmente expressam 75% dos oponentes presentes no jogo), cones ambulantes, patinetes Segway, drones e robôs de limpeza. Apesar de cada um deles terem sim suas próprias habilidades, o jogador não tem de adaptar o seu estilo de jogo para ir bem nas batalhas.

Os inimigos mais interessantes são os drones (que tem de ser derrubados pelo arremessar de cartões de visita de Asaru ou pela pistola de Amelia), as versões mais fortes dos celulares carregando armas (uma espécie de mecha) e os chefes, denominados de Officers. Infelizmente os drones aparecem tão frequentemente que se tornam irritantes, as versões mais desafiadoras dos smartphones são muito raras e as batalhas contra os chefes ainda acabam por ser fáceis demais.

Boa parte do problema da dificuldade do jogo parte do sistema de combos. No início da aventura de Asaru, o personagem praticamente não tem combos para executar. Conforme o jogador completa batalhas, o protagonista ganha pontos de habilidade para gastar em pontos de Wi-Fi gratuito (extremamente frequentes, inclusive), além de utensílios desbloqueados ao longo da história como o guarda-chuva e o relógio de Overclock. As lutas se tornam muito mais frenéticas e interessantes conforme o jogador progride, até que isso também se torna um problema.

Enquanto outras franquias do gênero (como Bayonetta e Devil May Cry) punem o jogador por abusar (repetir desenfreadamente) de combos específicos com baixas pontuações, Assault Spy não se importa com a forma pela qual os inimigos são derrotados. Desta forma, não é incomum conseguir uma pontuação alta como um SSS mesmo depois de uma luta medíocre.

E tudo que eu fiz nessa batalha foi derrubar os celulares do elevador

Isso acaba inutilizando o número consideravelmente grande de combos desbloqueáveis presentes na campanha de Asaru, que poderia ser considerado um ponto positivo do jogo. Alguns golpes, como Rush Hour, são extremamente fáceis de executar e recompensadores, tornando técnicas como os golpes da Kanoko em uma perda de tempo.

Outro problema é a forma com que os inimigos ficam mobilizados durante a maioria dos ataques. É muito simples realizar combos que mantenham os oponentes “flinchados” (impossibilitados de agir), e isso rapidamente resulta em batalhas ainda mais repetitivas e monótonas. Se parece exagero, saiba que isso acontece até mesmo com o último chefe, que diante do Rush Hour se torna praticamente uma peteca na mão de Asaru.

Em adição, um bug onde Asaru se torna uma estátua invencível e não pode realizar ações além de invocar Kanoko aconteceu um total de 16 vezes, incluindo durante batalhas contra chefes, exigindo forçar o renascimento no último checkpoint pelo menu. Em muitos pontos o gameplay acaba parecendo uma mera forma de alongar a duração do jogo e adiar o encerramento da história. Em uma das áreas anteriores ao último chefe, por exemplo, o jogador é literalmente obrigado a derrotar inúmeros robôs ao longo de um corredor gigantesco.

A jogabilidade de Amelia, por sua vez, incentiva combinações maiores de armas diferentes e seus ataques básicos e do especial da personagem, desta forma apresentando menos combos desbloqueáveis. Controlando Amelia, o jogador deve aproveitar frames de invencibilidade e ser mais agressivo. Apesar de acabar por ser uma abordagem interessante e diferente das mesmas batalhas (em sua maioria) de Asaru, a chance de que o jogador queira completar a campanha dela ou até mesmo os modos alternativos depois de enfrentar tantos problemas é baixa.

Complexidade

Os controles de Assault Spy não são muito complexos e a maioria dos combos são fáceis de executar. Ao iniciar o jogo, só é possível iniciar uma nova campanha do Asaru na dificuldade Fácil ou Normal. Novas dificuldades e modos são desbloqueados conforme o jogador completa cada uma delas. São eles: Death March, Extreme, Hard Work, Spy Must Die e Boss Rush (além da campanha da Amelia, desbloqueada durante a campanha de Asaru).

Além das dificuldades e modos adicionais, existem 50 funcionários perdidos pela Negabot que Asaru pode resgatar e adquirir pontos de habilidade, além de conferir um diálogo especial para cada um deles. Apesar do jogo não informar o jogador, o número total não compreende somente os funcionários de uma campanha, mas sim da campanha do Asaru e da campanha da Amelia juntas.

Antes que você se assuste, isso será discutido na próxima seção

Por fim, os achievements de Assault Spy também são um desafio extra aos complecionistas. Entre as conquistas existentes, está aprender todas as habilidades de Asaru e de Amelia, resgatar todos os funcionários da Negabot e completar todas as dificuldades e modos do jogo. Tenho de admitir que se você tiver a paciência necessária para completar tudo isso no estado atual do jogo, poucas coisas te tiram do sério.

Audiovisual

Capricho mal compartilhado

As artes conceituais e o estilo proposto por Assault Spy eram promissores, e as artes que eventualmente compõem os diálogos são dinâmicas e carismáticas. Mas infelizmente, nem mesmo o fator audiovisual do título está livre de problemas. Os cenários corporativos da Negabot, construídos através de belas iluminações e do uso intenso de preto e branco e a cor vermelha destacante de máquinas de comida são dignos de elogios, mas existem imperfeições muito visíveis em outros aspectos.

🠖 Os modelos 3D dos personagens, por exemplo, são muito mal modelados e contam com poucos detalhes em comparação às artes conceituais, além de serem coloridos por tons fora do padrão e não serem influenciados pela iluminação do cenário. Estes fatores, em conjunto, fazem com que os personagens pareçam bonecos de plástico em cenários realistas, sendo que o modelo 3D dos robôs são bem mais detalhados.

🠖 O posicionamento incorreto da câmera e o uso exagerado (e provavelmente mal configurado) de filtros como depth of field cria cenas de conversa com funcionários absolutamente bizarras e impossíveis de entender, quebrando a imersão do jogador e criando situações frustrantes.

Você sabe melhor do que ninguém, Asaru!

🠖 A iluminação nos cantos de algumas salas é extremamente escura e desbalanceada. Pontos de Free Wi-Fi parecem ter sido espelhados e até mesmo o símbolo de indicação de sinal se encontra fora do centro.

🠖 Apesar das animações de batalha serem bem trabalhadas, as animações de movimentação dos personagens são estranhas e anaturais.

🠖 Todos os menus do jogo são um pouco confusos e fora do comum, seguindo um modelo que faz o jogo parecer que ainda está em acesso antecipado/inacabado.

Pessoalmente, a trilha sonora me passou mais despercebida do que eu esperava. Não existem temas memoráveis de situações, personagens ou chefes. Estes aspectos, em adição a todos os outros problemas do título, intensificam a necessidade de correções. Além de é claro diminuir o interesse do jogador aos extras citados na subseção Complexidade.

Desempenho

Assault Spy apresentou alguns problemas de desempenho durante nossas sessões de jogo, mesmo com um computador muito acima das especificações recomendadas. O primeiro mapa/missão do jogo, em especial, contém quedas de frame rate absurdas, que voltam a acontecer mais para o final do jogo. As telas de carregamento do jogo são extremamente rápidas e um único fechamento inusitado ocorreu.

Versão utilizada na análise: Release Build (O número da versão não é fornecido no jogo)

Análise — Assault Spy (PC)

Assault Spy é uma ideia boa mas extremamente deteriorada por uma execução péssima. Os bugs criam situações problema demais para uma experiência que já não é tão refinada quanto o jogador esperaria de um jogo completo.

A campanha de Asaru leva cerca de nove horas, e nem mesmo ao longo de tanto tempo o jogo consegue elaborar suas mecânicas. Se formos levar em conta, somente as batalhas contra chefes são realmente construtivas tanto para o enredo quanto para as mecânicas de jogabilidade, fazendo o jogador ser mais cuidadoso ou usar ataques específicos em momentos determinados.

Trata-se de uma trama simples que se torna uma jornada maçante devido a muitos problemas e imperfeições diferentes, que ao tempo todo parecem ressaltar que quantidade de conteúdo não é tudo. No fim das contas, um dos maiores desafios do título é acreditar que este é o seu “estado final”.

Avaliação do jogo segundo o autor da análise: 3/10 — Ruim
Análise produzida com cópia digital cedida pela NIS America.

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Rafael Smeers
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Organic Marketing, Neuromarketing & Game Journalism/Localization | MTB 309683