Análise | Shadow Tactics: Blades of the Shogun (PC)

Um belo jogo furtivo de estratégia em tempo real que exige técnica, precisão e atenção a todos os detalhes.

Gustavo Maganha Andria
Aventurine Brasil
10 min readJan 11, 2019

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Art © by Mimimi Productions

O desejo de primeiro contato com Shadow Tactics: Blades of the Shogun foi, sem dúvida, proveniente de meu extremo apreço por jogos de estratégia no estilo de XCOM. O que não havia notado é que o jogo produzido pela empresa alemã Mimimi Productions e distribuído pela Daedalic Entertainment não leva seus níveis táticos à mecânica comum de turnos, mas sim expande a ideia, tornando-o um game de ação furtiva em tempo real.

Por fazer parte de um gênero escasso de títulos expressivos no mercado, é compreensível o destaque atingido por Shadow Tactics em meio à crítica mundial. Desenvolvido com as mais profundas inspirações em Desperados: Wanted Dead or Alive e Desperados 2: Cooper’s Revenge, títulos clássicos do real time strategy, o game junta uma série de mecânicas, antigas e novas, para compor o que há de mais polido e fielmente completo quando o quesito é agradar novatos e “hardcores”.

Shadow Tactics: Blades of the Shogun foi lançado em 6 de dezembro de 2016 e está disponível para PC (via Steam), para PlayStation 4 ( via PlayStation Store) e para Xbox One (via Microsoft Store).

O jogo conta com localização parcial (apenas texto) para o Português Brasileiro.
Não possui modo multiplayer local e/ou online.
Esta análise não contém spoilers.

Enredo

Shadow Tactics: Blades of the Shogun nos leva para o período Edo (1603- 1868) da história japonesa. Esse período foi marcado por acabar com as guerras civis anteriores e “unificar” o Japão sob o comando de um imperador. O imperador, que possuía poder máximo, dividia as responsabilidades com os xoguns (grandes generais), uma espécie de líder local que comandava a administração de cidades e de tropas.

Seguindo os momentos iniciais da unificação do Japão, mais precisamente em 1615, somos colocados na pele de Hayato, um ninja mercenário que foi contratado para infiltrar uma fortaleza em conflito. Durante a missão, acabamos encontrando Mugen, um mestre samurai que serve ao xogun e está destinado a manter a paz pelo Japão.

O curso da trama segue uma linha do tempo de acontecimentos, que culmina no encontro de outros personagens presentes no game, como Yuki, uma habilidosa menina que cresceu nas ruas e sonha em ser ninja, Aiko, uma assassina especializada no disfarce e na descrição em conflitos e Takuma, um velho atirador de elite com diversos truques e conhecimentos. Diante de uma rebelião liderada pelo poderoso e influente inimigo do xogunato, Kage-sama, os cinco personagens principais são designados pelo xogum para espionar e sabotar a conspiração que vem enfraquecendo as bases do período Edo.

Da esquerda para a direita: Mugen, Aiko, Hayato, Yuki e Takuma.

A forma como o enredo é transmitido ao jogador é variada. A mais comum é o diálogo em meio à missão, onde os personagens conversam entre si sobre assuntos importantes ou não. As cutscenes estão presentes em dois modelos, uma mais simples e corriqueira, que utiliza os gráficos e a renderização in-game e outra que utiliza uma animação de luzes e sombras. As cutscenes podem aparecer entre ou em meio às missões.

A história de Shadow Tactics certamente não é o foco do jogo, mas isso não significa que seja ruim. Apesar de totalmente previsível quando se trata dos conflitos morais e da conclusão da trama, o carisma aplicado aos personagens principais e as constantes interações dos mesmos fortalecem a ligação do jogador com o universo, algo forte e mais que suficiente para fazer o enredo ser totalmente satisfatório.

Gameplay

O sucesso de um game de estratégia depende muito de sua jogabilidade, que deve ser intuitiva e agradável a iniciantes, mas também apresentar a dose certa de desafios para quem deseja ir além. Shadow Tactics coloca o jogador em uma área com objetivos a completar e várias formas de abordagem, deixando em aberto a forma como tudo deve ser conduzido.

Controlamos um ou mais personagens durante as missões, cada um tendo suas próprias forças e fraquezas e sendo melhores para determinadas táticas e ações. Por ser em tempo real, é crucial que o jogador atente-se às posições de cada personagem, visto que o mesmo pode ser descoberto por guardas se não estiver escondido ou em uma posição de vantagem.

Mecânicas principais:

  • Movimentação: é possível movimentar um personagem ao mesmo tempo em que o outro está completando sua ação, por isso é importante coordenar o ritmo de caminhada, pois há diferença na velocidade de cada um. Como exemplo temos Yuki, que é mais jovem e se movimenta mais rápido que o velho Takuma. Mugen, por sua vez, juntamente de Takuma, não consegue se locomover pela água, enquanto Aiko, Hayato e Yuki não possuem restrições de locomoção e ainda podem utilizar um gancho para acessarem locais altos. Ficar atento em como cada protagonista se relaciona com os obstáculos no caminho é a melhor maneira de obter sucesso em Shadow Tactics. Uma trepadeira pode não significar nada para Takuma, mas é um atalho para Hayato, por exemplo.
Fonte: gamepressure.com
  • Inimigos e NPCs: o game conta com vários tipos de inimigos, que apresentam comportamentos e funções específicas, existindo formas diferentes de se lidar com cada um. Inimigos vestidos de azul fazem parte da composição original da fase, já os em vermelho representam os reforços após um alerta. O guarda comum é responsável por fazer rondas pelo mapa e pode ser morto com facilidade pela grande maioria das habilidades dos protagonistas. O guarda chapéu de palha possui os mesmos pontos fracos que o comum, porém é extremamente atento e não sai de seu posto por nada, ignorando barulhos e pedidos de investigação. O samurai é o inimigo mais forte, podendo ser morto apenas por Mugen ou quando está atordoado por um disparo de pistola/rifle. Os NPCs, em sua maioria civis, podem ser hostis ou não, dependendo da circunstância da missão. Se os personagens estiverem invadindo algum local, civis irão denunciá-los se os virem, mas caso os civis encontrem-se em perigo, não irão alertar os guardas da presença dos protagonistas.
  • Cone de visão: a forma de detecção é baseada em um campo de visão em formato de cone. A cor verde indica que nada foi percebido e/ou alertado, enquanto a amarela mostra que o inimigo esta ciente da presença do jogador e a vermelha caracteriza uma detecção completa. Existem duas áreas que compõem o cone. A parte rasurada permite que o jogador realize ações furtivas sem alertar o inimigo, tais como andar agachado, posicionar uma armadilha, etc. Já a parte normal do cone mostra a visão real do guarda, detectando o jogador com muito mais facilidade.
  • Corpos e esconderijos: existem muitos locais que servem tanto para o jogador se esconder, quanto para ocultar os corpos dos inimigos mortos. Cada personagem possui uma forma de se locomover quando está carregando um corpo, tornando essa uma mecânica crucial para se ficar atento. Mugen pode carregar dois corpos e correr ao mesmo tempo, enquanto Hayato pode carregar apenas um e de uma forma mais devagar. Apesar de serem dois bons “carregadores” do jogo, no momento do transporte do corpo ambos ficam expostos à visão inimiga. Nesse quesito, Aiko e Yuki levam vantagem, pois ainda que arrastem o corpo a uma velocidade baixíssima, permanecem agachadas e não são vistas. Cabe ao jogador decidir como irá ocultar a “bagunça” que fez pelo cenário.
Fonte: gamepressure.com
  • Habilidades: cada personagem vem equipado com um conjunto de habilidades que definem sua função em cada missão. Hayato, por exemplo, possui uma pedra para distrair os guardas e uma shuriken para eliminá-los à distância. Aiko possui a habilidade de se disfarçar e também um pó de espirro, que diminui o cone de visão dos guardas. Mugen é um exímio samurai, podendo eliminar diversos inimigos com sua técnica “vento da espada” ou atrair um por um utilizando sua garrafa de saquê. Takuma, por sua vez, é equipado com um rifle de precisão, granadas letais e soníferas e tem como mascote o guaxinim Kuma, responsável por distrair oponentes. Yuki, que considero a melhor personagem, tem em mãos uma pequena armadilha letal de proximidade e uma flauta de canto de pássaro para atrair os inimigos à morte. Além de tudo, cada um carrega consigo um kit médico e, posteriormente no jogo, uma pistola Tanegashima, adaptada em um tamanho pequeno para abordagens furtivas.
Fonte: gamepressure.com
  • Modo fantasma: esse modo serve para que o jogador planeje ações simultâneas e as acione no mesmo instante. A ferramenta serve para que novas opções de jogabilidade sejam atribuídas, elevando o nível de estratégia do jogo e dando mais maneiras do jogador passar por cada fase. Sempre bom lembrar que, em meio ao planejamento das ações, o tempo não para, então guardas e civis ainda poderão atrapalhar os planos na hora da execução.

A jogabilidade de Shadow Tactics é muito boa e fluída, exigindo grande precisão e atenção, adquiridas com experiência de jogo e muitas tentativas. Contudo, o jogo sofre com alguns problemas na movimentação e na câmera, e quando se deseja realizar uma ação mais complexa, as imprecisões presentes podem gerar frustrações. Mas graças à liberdade de salvar e carregar os saves, nada afeta diretamente o progresso ou o sucesso da missão.

Ainda que ofereça ao jogador a opção de abordagem, não há a possibilidade de excluir totalmente a furtividade. É essencial que quem joga acostume-se a realizar missões no formato stealth, pois o combate aberto é ruim e limita o gameplay. Porém, é compreensível que as limitações dadas ao gameplay de combate aberto foram introduzidas justamente para focar nos elementos furtivos da experiência de Shadow Tactics.

Complexidade

Shadow Tactics é dividido em missões, cada uma representa um capítulo do jogo e possui um número de guardas e objetivos únicos. É possível ajustar a dificuldade antes de cada missão, passando por fácil, médio e difícil. Ao final, temos acesso às estatísticas gerais de cada missão, que contam com tempo de conclusão, tempo de jogo com cada personagem e número de vezes que utilizamos certa habilidade.

Existem também insígnias, que podem ser obtidas nas dificuldades médio e difícil e servem como desafios adicionais para quem busca algo além de apenas terminar a missão. Com um total de 9 por capítulo, as insígnias garantem alguns troféus e conquistas, mas não adicionam nenhum bônus ao jogo em si.

A dificuldade do game não está diretamente atrelada apenas ao nível escolhido antes de se iniciar cada empreitada. Algumas missões possuem uma dificuldade altíssima, principalmente quando se deseja completá-la sem alertar nenhum inimigo. Há um problema, mesmo que mínimo, com o balanceamento e disposição de inimigos no cenário.

Evidentemente, com certo empenho e boas estratégias, nenhum obstáculo afeta a experiência. Porém, para se obter um 100%, as instabilidades de balanceamento de certas fases atingem determinado grau de injustiça e descuido.

Audiovisual

A trilha sonora de Shadow Tactics é característica japonesa, possuindo um ritmo calmo e leve para acompanhar o jogador durante a furtividade e se intensificando quando o mesmo é descoberto ou se encontra em meio a uma situação tensa. No geral, devido ao alto grau de atenção que o jogo requer, a trilha sonora acaba agindo como um agente secundário que, muitas vezes, passa despercebido. Contudo, apesar de ficarem em segundo plano, as músicas compõem um papel importante no jogo. Momentos de ausência de melodias após um momento trágico nos fazem estranhar a falta do ritmo que nos acompanhava.

O visual do game é belíssimo, com cenários detalhados e modelos de personagem muito bem feitos. Cada arte, seja com renderização in-game ou cutscene, foi feita com uma dose perceptível de cuidado e atenção.

A ambientação é outro fator importante, visto que as fases devem e são diferentes entre si, cada uma com suas próprias mecânicas, segredos e ambientes únicos que nos proporcionam diferentes sentimentos e experiências conforme onde estamos. Os gráficos foram adaptados para uma visão mais afastada e, apesar de não representarem o que há de mais real hoje em dia, cumprem seu papel na premissa do jogo.

Desempenho

Não foram percebidas quedas de frames ou travamentos que pudessem influenciar o jogador. O loading inicial para entrar na missão é bem demorado, mas isso é compensado com o carregamento instantâneo de checkpoints, mecânica muito utilizada após se habituar ao jogo. Contudo, Shadow Tactics não é de todo leve, exigindo certa potência para ser . Isso se deve ao fato da intensa movimentação da câmera e do número de elementos presentes em cada cenário.

Art © by Mimimi Productions

Análise — Shadow Tactics: Blades of the Shogun (PC)

Shadow Tactics é um jogo de estratégia furtiva em tempo real, que nos situa em meio ao período Edo, importante e rico momento da história japonesa. Somos apresentados a cinco protagonistas, cada um com suas forças e fraquezas, que lutam por um bem maior: a paz no Japão. Com uma jogabilidade fluída, um visual belíssimo e uma trilha sonora importante para o ritmo de jogo, Shadow Tactics veio para reviver um gênero de games há muito ignorado, mas nunca esquecido.

Exigindo muita atenção e precisão, o título coroa-se não só como um dos mais fiéis ao gênero real time strategy, mas também como o melhor de seu estilo presente no mercado. Graças à Mimimi Productions, que já trabalha em uma sequência de Desperados, é aguardado que muitos outros “Shadow Tactics” apareçam em um futuro próximo e que, juntos, revivam por completo um dos melhores gêneros dos videogames.

Avaliação do jogo segundo o autor da análise: 9/10 — Ótimo
Análise produzida com cópia digital adquirida pelo próprio autor.

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