Porque Azazel?

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Azazel, BDSM etc
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8 min readMay 21, 2022

Esse é meu primeiro texto da minha Publicação sobre BDSM, fetiches, afetividades etc. Nela vou explicar especificamente a escolha do meu nome puppy, não vou explicar o que é o fetiche puppy play nem aprofundar muito sobre outros fetiches envolvidos. Mas logo virão mais textos em que poderei refletir e pôr em palavras meus pensamentos. A quem quiser ler, sejam bem vindes, mas enfatizo o que pus na descrição da Publicação: moralistas devem permanecer longe de mim e destas reflexões, isto nada tem a ver com minha vida pessoal e nem influencia a qualidade do meu trabalho. Século XXI, minha gente.

Vamos por partes.

Quem o Azazel das mídias?

Há vários filmes, desenhos, HQs, mangás e todo tipo de mídias que vocês imaginarem reivindicando Azazel e outros de seus pares, como, por exemplo, nas HQs de X-men, em que Azazel é o nome do pai biológico do mutante Noturno. Ele faz parte de uma horda de mutante demoníacos, chamados Neyaphem e tem como época de surgimento os tempos bíblicos, sendo uma óbvia referência ao Azazel bíblico — que logo falarei. Os demônios Neyaphem (Neiafins) batalhavam com os anjos Cheyarafim (Serafins) e perderam, sendo banidos para outra dimensão. Azazel na época era seu líder e com seus poderes de teleporte conseguia voltar à Terra por instantes breves. Em outra referência à história original, ele engravidou várias humanas nessas vindas, pois seus filhos estão vinculados à sua dimensão, sendo uma possível forma dele permanecer mais tempo na Terra. Ele também está presente nos filmes, mas com outra história.

Uma outra mídia famosa que falou de Azazel foi Supernatural (série), na qual ele era um servo de Lúcifer e assassino da mãe dos protagonistas. Boa parte do começo da história foi sobre eles perseguindo ele e, mesmo após a morte dele, seguiu influenciando a história. Também está presente em animes, como Shingeki no Bahamut. Muitas são as menções e adaptações a Azazel nas mídias, umas mais outras menos fiéis à história original. Mas quem foi o Azazel original?

O Azazel bíblico

Apesar de intitular o tópico assim, o anjo caído (ou demônio) Azazel está presente tanto nas crenças judaicas quando cristãs e até nas islâmicas, sendo mais importante, até onde li, na Bíblia Hebraica. Um dos sete Príncipes do Inferno, ele é responsável pelo pecado da ira e tem relação próxima com a questão dos pecados em si. No ritual do Yom Kipur, se sacrificam animais, e um dos bodes sacrificados era para Azazel, representando os pecados do povo e destinado a morrer no deserto. Uma outra passagem para isso fala que ele, enquanto anjo, era o conhecedor de todos os pecados e teria como principal função enumerar todos eles no julgamento anual da humanidade.

Porém, isto é confuso, especialmente quando se põe o fato de um demônio participar de uma cerimônia de expiação dos pecados, ou seja, um processo favorável aos seres humanos. Uma das possibilidades é que, por contra do hebraico antigo ter uma escrita difícil de tradução, tudo isso não passe de um erro de tradução e o bode não tenha esse endereçamento (o resto se mantém igual). Por esse tópico há toda uma polêmica envolvidae muitas divergências entre os cristãos. Entretanto, noutras passagens Azazel existe, sempre próximo dos pecados e dos pecadores.

Na história, ele veio à Terra para viver entre os homens junto com outro anjos, e durante estes anos os ensinou a fazer armas, a plantar, a estudar os astros e engravidou diversas mulheres. Seus filhos foram assassinados por deus durante o dilúvio.

Como citado, ele é um dos 7 Príncipes do Inferno, a contraparte dos 7 Arcanjos de deus, e conta-se que ele era adorado por uma seita judaica que tinha em seus rituais sacrifícios e orgias. Os reis de Judá assassinaram todos eles, por adoração de ídolos.

Uma outra lenda é que Azazel teve sua amada presa no inferno e desertou dos céus para tentar libertá-la. Sendo o Príncipe responsável pela Ira, a voz de sua amada era a única fonte de calma que ele conheceu. Antes de desertar, ele viveu por muito tempo entre humanos e teve relações e engravidou diversas mulheres, sendo sempre relacionado com o ato sexual fértil em suas histórias.

O meu Azazel

Finalmente chegamos ao último tópico do texto. Pegando um pouco de cada Azazel, especialmente ao demônio bíblico, meu Azazel surge.

O Puppy Play (ou só Puppy) é um fetiche que faz parte do Pet Play (ou só Pet). Esse “play” em comum não é coincidência, pois ambos vêm do fetiche maior Role Play. Role Play, por sua vez, corresponde ao fingir. Para os adeptos do Role Play, há um desejo forte atuando situações ou papéis, e, como estamos falando de BDSM, quase sempre isto envolve uma hierarquia, não necessariamente de dominação/submissão mas esta é uma das possibilidades.

Nisso, retornando as chaves que abrimos, dentro do Role Play, há o Pet Play. Neste caso, o fingir envolve fingir ser um animal, como por exemplo um cachorro, um gato, um cavalo e outros mais. Logicamente, não somos estes animais e nem acreditamos ser, porém, a personalidade típica (ou atípica) destes animais por algum motivo nos atrai, bem como sua relação com seus donos e/ou outros animais da mesma espécie ou diferentes. Resumindo, uma pessoa com fetiche em Puppy Play, como eu, gosta de ser tratado como um cachorro, receber carinho como cachorro, receber comandos como cachorro, e outras possibilidades.

Um disclaimer importante: Puppy Play não é o mesmo que z**filia, nem envolve espécimes de animais não-humanos. Isto é crime e não é encorajado com este texto. O fetiche é pelo fingir e, assim sendo, se restringe ao fingir.

Voltando ao texto, no Puppy, assim como na maioria dos adeptos ao Pet, o filhote (aquele que finge) molda uma personalidade e escolhe um nome. É diferente de outros Role Plays, em que muitas vezes se tem uma experiência pontual (role de professor/aluno, por exemplo), pois é um fetiche que se realiza e se desenvolve ao longo do tempo. Ser adestrado, ser Puppy por mais tempo, tudo isso faz parte de um processo também de autoconhecimento, já que muitas das coisas que o indivíduo tem vontade e não poderia por vergonha e estranhamento, agora pode fazer: afinal, não é você ali, é sua persona.

E aí chegamos ao nome. O nome é uma parte importante do Puppy, pois ali reside sua personalidade. Se será arisco, dócil, raivoso, impaciente, babão, o que será. No meu caso, vim Azazel.

E quem sou Azazel?

Minha personalidade Puppy pode mudar ao longo do tempo, mas vou falar um pouco de como me defini por agora.

No começo, por não ser um cara tão bruto, pensei que deveria adotar outro nome. Eu realmente queria um nome espiritual, nomes terrenos ou nomes comuns de cachorro nunca me atraíram. Daí pensei nos Príncipes do Inferno, e por isso minha máscara é vermelha: comprei antes de escolher qual meu nome, mas já sabia de onde viria naquele instante. Pensei inicialmente em Azazel por realmente ser fã de mutantes, embora já soubesse que minha inspiração não viria dessa adaptação, e sim do original. Quando vi a ira, titubeei. Pensei em escolher Asmodeus, o demônio da luxúria. Mas dei para trás: a relação de Azazel com o pecado, a fertilidade e o incentivo ao fetiche me convenceram. Me dei conta de que não precisaria ser totalmente igual ao Azazel bíblico, afinal, quem é meu Azazel senão uma adaptação? Me inspirei nele, mas sou outro.

Como Azazel, sou um filhote decidido, que sabe usar a força quando necessário, por ser inspirado num espírito guerreiro, líder e de pura ira. O sadismo é uma diversão para mim, é também uma forma de carinho, de explorar caminhos incomuns de prazer para aqueles que só sabiam chegar num orgasmo típico antes de me conhecer. O estímulo extremo é minha morada. Para ter acesso ao meu eu calmo, é preciso um vínculo de confiança, tal qual Azazel e sua amada. Um adestrador, um dominador, um submisso, todas as possibilidades, só me terão para além da fúria se merecerem.

Um aspecto importante é que meu Azazel é um espectro, ele varia e progride — ou regride. A cada parceiro um pouco ou muito de Azazel é liberado, a depender do que faz o parceiro sentir seu ápice de êxtase. Para um parceiro que apenas queira a estética, não vou julgar, usarei minha máscara e meus arreios sem problemas. Para um parceiro que queira ir além e usar comandos, tal qual um adestrador de cães, tudo bem também. Para um parceiro que queira me tratar como um cão em outros formatos e lógicas, como adestrador, alfa, beta, ômega ou outros, tudo bem também. E para um parceiro que queira ir profundamente no conceito de Azazel e queira fingir que eu próprio sou o Príncipe do Inferno, porque não?

Isso porque um último ponto essencial da minha personalidade Puppy é a relação com pecado. O filhote Azazel não julga nenhum fetiche, desejo, necessidade. Nós somos movidos pelo desejo, e somos nosso próprio desejo. Não há o que julgar, apenas temos a ilusão de termos este poder. Acolho todos os pecadores, e por isso podem ser sinceros comigo. Sem medo. O que der prazer a quem estiver comigo será acolhido.

Outras questões são sua relação com a fertilidade, ao incentivo ao pecado, a orgias, as ações que seriam julgadas pelos moralistas, à exploração de novas possibilidades, ao metafísico (e, de certa forma, à alucinação, às drogas, a um mundo para além do físico, para contemplar de fato sua existência).

Por fim, nada que Azazel faz com seus parceiros vem dele. Vocês já têm todos os desejos que desperto quando estão comigo. Só faço explorá-los e fazer eles saírem, sem te dar chance de sentir vergonha por sentir prazer com aquilo que te atrai. Eu uso uma coleira e em alguns momentos posso te amarra, mas Azazel é sua liberdade. Agradeça.

Azazel é um conceito elástico, porque com ele caibo em todos os fetiches e realizo todas as possibilidades do homem.

Disclaimer final: Puppy play consiste em personas e fingimento, não tendo nada a ver com práticas envolvendo animais de verdade. Outro ponto, sou ateu, logo nada do dito aqui tem quaisquer ligações com demonologia de fato, apenas me inspirei numa de suas entidades, sem qualquer fidedignidade aos seus processos e sua mística.

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