Cuidado, Gatilho!

Barbara Moraes Vicente
Babi Moraes
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3 min readJun 8, 2019

Nessa última semana dispararam continuamente e insistentemente o gatilho que me leva a lembranças doloridas.

Você pode não saber que sua colega de trabalho ou faculdade sofreu alguma violência sexual ou que a moça que está na mesa do lado ouvindo suas piadas sobre estupro também já foi vítima um dia ou sua irmã, ou sua mãe ou sua filha. Nem sempre é fácil para as mulheres falarem sobre esses assuntos, por isso vamos para algumas estatísticas: em 2017 foram registrados 164 casos de estupro por DIA no Brasil, POR DIA. Segundo o relógio da violência do Instituto Maria da Penha 29 mulheres foram assediadas no Brasil até você chegar nessa parte do texto

Sim, eu me dei ao trabalho de disparar o cronômetro e ler até o última ponto final para colocar o dado. Mas, voltando aos dados: UMA mulher é assediada a cada SEGUNDO no Brasil. Isso já é o suficiente para você perceber que a probabilidade de uma mulher que está a sua volta ter sido vítima de alguma violência é muitíssimo alta!

Não acionem nossos gatilhos! Já é dolorido demais viver com as lembranças, com os medos, com os traumas, com as consequências que essas violências trouxeram para nossas vidas.

Se você é mulher e nunca sofreu assédio, levante as mãos para o céu e agradeça, agradeça muito mesmo, você nem imagina a sorte que tem.

Ah, quase que me esqueço, se você vive no Brasil e saiu de casa essa semana ou tem acesso a alguma rede social, muito provavelmente você ouvir dizer que Neymar Jr foi acusado de estupro. Eu particularmente não quero julgar o caso, nem quero opinar sobre porque evitei o máximo que pude me inteirar sobre o assunto. Mas vamos a alguns fatos: independentemente de conversas e provocações, só é sexo se os dois querem no momento que tá rolando, caso contrário, é estupro sim; dois deputados do PSL — Cabo Junio Amaral e Carlos Jordy — protocolaram projetos de lei para agravar a pena de mulheres que acusam falsamente homens por crimes sexuais, a lei posteriormente foi batizada de Neymar da Penha.

Sobre os tais projetos de lei, primeiro que é difícil para caramba falar sobre casos de violência sexual, ainda mais difícil falar sobre isso na delegacia, inclusive é difícil lembrar tantos detalhes porque nossa memória tenta apagar alguns traumas para evitar sofrimento, e muitas mulheres têm dificuldade de denunciar no mesmo dia ou no dia seguinte. Eu mesma demorei uns 16 anos pra denunciar um caso de assédio, e obviamente tive medo de fazê-lo, tive medo das consequências, e muitas mulheres compartilham desses medos, aumentar a pena para casos de acusações falsas só aumenta nosso medo e só dificulta que façamos ocorrências e tentemos buscar minimamente por justiça, mesmo sabendo que não somos ouvidas, que os casos em sua maioria nem são investigados e que o estado não se importa em punir nossos agressores.

E por último, é um desrespeito enorme das pessoas que batizaram o tal projeto de lei Neymar da Penha ironizando todo o sofrimento de Maria da Penha e toda a luta das mulheres para conquistar a existência da lei Maria da Penha.

Cuidado: você está disparando o gatilho de alguém.

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Barbara Moraes Vicente
Babi Moraes

Estudante de Engenharia Civil & Apaixonada por Python