Como consegui um emprego remoto com uma startup gringa sem sair do Brasil

Gabriel
BaixadaNerd
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8 min readJun 17, 2019
Trabalhar de casa significa tranquilidade e nada de roupa social [Foto: tirachardz | www.freepik.com]

Talvez a maior vantagem de todas em trabalhar na área de tecnologia seja a facilidade com que nós podemos trabalhar de absolutamente qualquer lugar. Isso não só permite que o profissional tenha horários mais flexíveis, mas também gera um grande aumento na sua qualidade de vida. Resolvi compilar algumas ideias e experiências que me permitiram conseguir um trabalho fixo com uma empresa estrangeira sem sair do Brasil.

Parece que a maioria dos gestores no Brasil ainda não se acostumou com a ideia de administrar uma equipe que está trabalhando de vários lugares ao mesmo tempo, e parece que nós brasileiros estamos fadados a passar horas (não pagas, diga-se de passagem) no trânsito.

Existem ainda outros fatores problemáticos. O campo de Tecnologia da Informação tende a se concentrar em áreas específicas, e as grandes empresas do setor ainda não são numerosas o suficiente para que existam muitas vagas fora dessas regiões. Com isso, quem trabalha na área acaba se concentrando nessas localidades — o que, em troca, faz com que as empresas se interessem cada vez menos por diversificar as partes do mapa onde aparecem. Pessoas de várias regiões do estado de São Paulo, por exemplo, passam os dias de semana em hostels para trabalhar nos escritórios, assinam transporte fretado mensal, ou de fato de se mudam para a cidade quando conseguem um emprego no setor de TI.

O trânsito, a locomoção forçada ao trabalho e eventuais mudanças não são o único problema. Fica também uma falta de tempo para outras tarefas não relacionadas ao trabalho. Tudo isso cria uma exaustão desnecessária, que faz com que o profissional chegue no escritório já cansado, além de apresentar sintomas o tédio e a insatisfação profissional com muito mais frequência. Então, uma tarefa em que antes víamos muito prazer em executar (afinal, nós que escolhemos nossas carreiras) pode se tornar algo terrível e deprimente — tudo isso por causa da distância entre seu trabalho e… todo o resto da sua vida.

Uma solução para a saturação urbana

Vimos que esse grande problema tem duas etapas — a centralização do trabalho nas grandes cidades e o excesso de pessoas nesses lugares. Uma alternativa para as causas desse problema é cada vez mais necessária.

Sabemos, então, que:

  1. As empresas estão onde a maioria das pessoas está;
  2. Ainda assim, muitas pessoas estão longe destes lugares; e
  3. Fica cada vez mais difícil o acesso aos grandes centros.

Por sorte, o constante crescimento da capacidade das conexões e a redução gradual do seu custo fizeram com que o trabalho remoto se tornasse uma realidade para diversos setores. O primeiro setor a ser afetado é, como poderia se esperar, o de Tecnologia da Informação. Hoje, com a ajuda de ferramentas de administração de projeto e programas de mensagens para equipes é possível trabalhar em equipe com pessoas que estejam do outro lado do mundo sem gastar um centavo além da internet e do hardware.

Há uma nova forma de competição no mercado — as empresas e profissionais mais aptos a trabalhar num regime descentralizado têm uma nova moeda de troca para negociar

Foi por isso que o trabalho remoto se tornou tão popular. As vantagens são praticamente impossíveis de medir, mas vistas positivamente por quase todas as pessoas. Passa a haver também uma nova forma de competição no mercado: as empresas mais aptas a trabalhar num regime descentralizado, e os trabalhadores mais capazes de manter a produtividade fora de um escritório convencional, agora têm novas habilidades para usar como moeda de troca. Uma vaga com um salário mais baixo pode ser mais vantajosa que a outra por oferecer dias de trabalho remoto, por exemplo.

O desafio (ou como eu consegui passar por ele)

Apesar de todas as vantagens, não é todo mundo que se adapta bem à ideia de trabalhar de qualquer lugar, e existe uma série de habilidades e conhecimentos que podem dar vantagem a quem procura um emprego remoto.

Melhore o seu inglês

Com a quantidade de comerciais ruins que vemos já não é a menor novidade: inglês é um idioma popular e importante para os brasileiros. Entretanto, não quer dizer que temos uma dificuldade fora do comum: Uma coisa que eu comecei a notar após entrar num emprego internacional é que não são apenas os brasileiros que têm dificuldade em falar um inglês perfeito, mas pessoas do mundo inteiro — algumas muito mais que nós.

Quem fala inglês está do outro lado dessa relação: normalmente, são pessoas mais acostumadas a ouvir sotaques variados e pessoas do mundo todo tentando falar sua língua. No entanto, isso não significa que podemos simplesmente falar de qualquer jeito — confiança e um vocabulário grande, bem como saber como as palavras são faladas, são fatores essenciais.

Vá ler alguns livros, assistir séries com legenda em inglês — mas, mais importante que isso, encontre uma forma de você praticar o idioma: escreva, tente conversar com as pessoas na internet, e, quando estiver mais confiante, se aventure em conversar. Não deixe de praticar a pronúncia: não precisa ser perfeita, mas precisa chegar perto o suficiente para que todos te entendam!

Se você já fala inglês num nível em que as pessoas te entendem, aventure-se em algumas entrevistas de emprego para ver como funciona — as formas de tratamento e o tom da conversa variam muito de acordo com a cultura dos falantes. Essa é uma experiência importante para se sair bem num ambiente novo.

Tenha um bom currículo

Vamos deixar uma coisa clara: experiência e currículo forte não são sinônimos, nem experiência e anos de trabalho na área (falaremos mais sobre este último).

Um currículo forte é conciso e fácil de ler, tem pouca prosa, e está ordenado pela relevância, e não em ordem cronológica. Um currículo júnior ou pleno não costuma passar da primeira página; se tem duas, é melhor que a segunda tenha conteúdo relevante e bem maior que três linhas. Formatação também é importante — a hierarquia visual dos elementos deve ser clara como em uma ficha técnica, sem floreios, excessos ou diferenças gritantes entre uma seção e outra — afinal, todas são pequenos parágrafos ou listas, e não há nada muito diferente para se mostrar.

Não deixe de mencionar tudo que for relevante para as vagas que você procura: quem vai pegar seu currículo é um administrador, hunter ou gestor de recursos humanos, e não um guru da tecnologia. Por isso, tenha certeza de que mencionou cada um dos requisitos da vaga em algum lugar — nem que seja em uma lista corrida de nomes — ou seu nome pode ser descartado na pré-seleção. Não é raro acabar com várias versões diferentes de currículo depois de algum tempo buscando emprego.

É claro que currículo não é apenas aquele pedaço de papel ou PDF (não DOC, por favor!) que enviamos para todos — o seu currículo consiste em todas as formas que você possui de mostrar seu trabalho. Por isso, não são apenas relatos de empresas anteriores ou a faculdade em que você estudou que vão garantir — ou eliminar — sua chance com uma empresa. Tenha um LinkedIn atualizado, com uma foto honesta e todos os trabalhos relevantes. O LinkedIn é uma rede profissional, e você pode inserir tudo que faltou espaço para colocar no seu currículo aqui, por isso, não economize palavras.

Estude!

Estudo é a análise minuciosa de trabalhos que servem de exemplo e também um constante processo de tentativa e erro.

Há devs e designers que nunca fizeram faculdade na área — ou nenhuma faculdade. Há também os que passaram pelas universidades, com notas altas ou baixas, os que fizeram mestrados e os que largaram o curso. Em todos esses grupos existem profissionais bons e medíocres, e nada disso é motivo para você se sentir melhor ou pior que alguém. Por isso, quando eu digo estude, não é em educação formal que estou pensando.

Estudo não é o mesmo que cursos ou universidades. É uma combinação de leitura, vídeos, análises minuciosas de trabalhos que você considera bons (bons designs em apps e sites, programas com interfaces úteis e projetos organizados são alguns exemplos) e, principalmente, um longo e exaustivo processo de tentativa e erro. A maior parte da experiência que relato numa entrevista de emprego, numa conversa ou num encontro de profissionais vem de projetos que talvez nem estejam mais no ar, ou que nem chegaram a ser publicados. O contato como conhecimento é o essencial, assim como a confiança em conversar sobre o assunto e se mostrar seguro da sua capacidade — e isso só virá com experimentos.

Isso não quer dizer que experiências reais são dispensáveis — é melhor que as vejamos como complementos dos estudos. No entanto, não se deve sentir medo de tentar a sorte com oportunidades porque te falta experiência em produção, tampouco acreditar que sua experiência profissional substitui conhecimentos adicionais que você pode adquirir estudando.

Crie um portfólio

Há muito tempo, portfólios são associados às carreiras visuais: arquitetos, artistas plásticos, designers gráficos… E foi apenas em tempos recentes, com a saturação de mercados tradicionais e o surgimento de outros (aqui se enquadra a Tecnologia da Informação) que a necessidade de fornecer amostras do seu trabalho antes que seja contratado se fez presente.

No entanto, não é porque sua carreira tradicionalmente não exige a construção de um portfólio que criar um se torna uma perda de tempo! Muitos desenvolvedores e outros criadores de material digital são contratados devido à sua presença em redes sociais, websites com bons rankings em motores de busca e a capacidade de fornecer amostras do que é capaz de fazer caso alguém pergunte.

Dos itens que estão listados aqui, esse é definitivamente o que mais me faltou. Sem um portfólio definido com exceção de alguns projetos dificilmente mantidos no meu GitHub, já me peguei dando desculpas esfarrapadas e explicações que podem ter se parecido mais com invenções do que relatos — tudo porque eu não tinha em mãos o resultado das histórias que contava.

Insista

Não tenho como enfatizar isso o bastante: insista! Nem tudo que fazemos é recompensado tanto quanto gostaríamos ou quanto merecemos. É normal se sentir desmotivado e até mesmo achar que seus esforços não valem a pena. Já perdi a conta de quantas vezes me senti assim, mas, acredite, é só uma questão de tempo até que a pessoa certa perceba o seu talento.

Boa sorte!

Independente de você ter um emprego remoto como objetivo ou não, essas dicas serão úteis na busca de novas oportunidades no Brasil ou fora. Faça bom proveito delas!

Numa oportunidade futura, falaremos sobre os desafios enfrentados por quem já passou por essa fase de busca de emprego e agora tenta melhorar sua produtividade num trabalho remoto.

Gostou do artigo? Tem críticas ou sugestões? Entre em contato comigo e vamos conversar sobre isso.

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Gabriel
BaixadaNerd

Software developer. Linguistics and gaming enthusiast.