O Sabor Seguro para uma Celíaca

Mary Gabriela
Baladasemgluten
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6 min readMar 10, 2017
Lilian e eu no episódio “Festa Infantil” do Desafio de Panelas Sem Glúten

Idealizadora do Desafio de Panelas Sem Glúten, Lilian é uma amiga que o mundo virtual me apresentou. Celíaca com diagnóstico há 12 anos, Lilian decidiu empreender nos últimos anos em algo que nos fazia falta. O Sabor Seguro é um site com produtos seguros para celíacos, dos mais diversos possíveis. Confira a entrevista do blog Balada Sem Glúten e entenda como ela descobriu a DC na família e o que mudou na sua vida desde então.

Lilian, quando você descobriu a DC e como foi a trajetória até confirmar o diagnóstico?

Descobri a DC em 2005, há 12 anos, muito tempo de Diagnóstico já.

Eu hoje, conhecendo e acompanhando a trajetória de muitos sinto que tive sorte no meu processo de diagnóstico. Morava sozinha em Florianópolis na época, para fazer faculdade, e me alimentava como todo jovem na faculdade — pizza, pães, massas e claro tudo isso regado a bastante cerveja.

Comecei a ter bastante desconforto com dores de cabeça e vômitos. Achava que era por conta da cerveja, talvez a ressaca.

Mas o tempo passou e comecei a ter ressaca mesmo quando não bebia. As crises começaram a ser mais frequentes e, quando cheguei a passar mal umas 3 vezes por semana, percebi que tinha algo errado com meu estômago.

Procurei por um gastro, relatei meus sintomas e na primeira bateria de exames fiz endoscopia com biopsia e já foi constatada a DC com grau Marsh III.

Eu credito meu diagnóstico rápido a junção de 2 fatores:

  • 1. Um sintoma muito claro no estômago, que me fez procurar a especialidade médica correta e
  • 2. A atuação e militância forte da Acelbra-SC que divulga fortemente a DC na cidade, portanto deixando os médicos mais alertas.

Na consulta de retorno, o médico foi simplista e me disse, era simples, só nunca mais comer nada que tivesse glúten e eu não teria mais problema.

Na época tinha 22 anos e achei que seria fácil — até chegar no meu armário de cozinha e separar tudo o que tinha glúten para doar ou jogar fora. Ainda lembro que chorei muito quando tudo o que sobrou no meu armário foi uma lata de óleo, um saco de sal, meio saquinho de açúcar e um pacote de polvilho.

Fui para a internet e achei o site da Acelbra-SC. Com muita informação, lista de alimentos proibidos e um norte.

Ali comecei aos poucos a trilhar meu caminho. Comecei imediatamente a dieta, mas ainda furava, abria exceções. Foi depois de muito sofrer as consequências e amadurecer no meu diagnóstico que me livrei do glúten de vez.

No começo havia poucos produtos substitutos, então minha alimentação se baseava no que era naturalmente sem glúten e muito pão de queijo.

Mais alguém da sua família tem DC? Tinham sintomas semelhantes?

Hoje na família temos 3 celíacos, eu, meu pai e minha irmã. Gostaria de ter recebido orientação do médico quando fui diagnosticada sobre a importância dos testes nos familiares.

Meu pai depois que insisti muito durante 10 anos aceitou fazer os testes e foi confirmado celíaco. Ele foi celíaco a vida toda e nunca conseguiram associar seus sintomas a DC. Hoje paga uma conta cara, ataxia cerebelar, neuropatia, problemas digestivos, tudo decorrente do glúten.

Minha irmã foi a vítima mais recente, começou a ter os mesmos sintomas que eu, e quando não conseguia negar mais fez os exames e positivou no genético. Com a exclusão do glúten já recuperou sua condição novamente.

Você morava fora quando descobriu a DC, certo? Como você se virava? Conseguia evitar a contaminação cruzada?

Na época que fui diagnosticada a informação sobre contaminação cruzada era menor, estava mais ligada a contaminação direta, como por exemplo não partilhar do mesmo requeijão ou faca de pessoas que estão comendo com glúten. Foi com a busca de qualidade de vida que eu fui cada vez mais conhecendo sobre a DC e o que precisava ser feito. Desde 2009 que não faço mais furos na dieta e cuido com mais rigor da contaminação.

O que te motivou a criar a loja e quando foi isso?

O que me motivou a criar a loja é o acesso a produtos sem glúten para todos. Mas não falo apenas da clássica farinha de arroz, falo de comida gostosa. Não precisamos fazer dieta para emagrecer, precisamos fazer dieta para nos manter saudáveis, e uma guloseima sem glúten faz bem. Essas guloseimas seguras é que são difíceis de serem encontradas.

O cereal “tipo sucrilhos”, a cerveja, o “miojo”, a bolacha, merecemos comer estas coisas de vez em quando, e são produtos difíceis de serem encontrados. Morava em São Paulo e tinha que ficar garimpando produtos. Pensei que deveria junta-las em um só lugar e entregar no Brasil todos, afinal, se está difícil em SP imagina nas cidades menores desse país gigante que temos.

O que me motiva a continuar são os feedbacks positivos que tenho dos clientes. Pessoas compartilhando comigo foto dos filhos matando a vontade de comer cereal. Adultos aproveitando uma boa cerveja com os amigos. Esses produtos nos fazem ter a sensação de pertencermos ao mundo normal, sem exclusão e com segurança.

Também acho a loja mais um canal para conscientização sobre Doença Celíaca, sensibilidade ao glúten não celíaca, alergia a trigo e etc. Se eu soubesse há mais tempo sobre a relação da DC com os parentes de primeiro grau, meu pai poderia estar muito melhor hoje. Quero ajudar para que ninguém mais passe por isso.

Tem algum depoimento de clientes ou situação envolvendo a loja que queira compartilhar?

Acho que o melhor é o contato com outros celíacos e o suporte mútuo que a loja permite.Uma vez por telefone, conversando com uma mãe de uma menina celíaca, tirando algumas dúvidas sobre a segurança dos produtos, comentei que era celíaca e que consumia e sabia a importância do cuidado. Comentei sobre como consumia esse produto durante a minha gestação e ela, começou a me questionar se tinha filhos, se tinha tido uma gestação tranquila. Percebi alí que ela estava expondo os medos que ela tinha em relação a própria filha, se ela poderia também ser mãe e como a DC poderia afetar a vida futura dela. Conversei longamente com ela, respondendo a tudo e tentando tranquilizá-la que seguindo a dieta e os cuidados necessários a vida da filha dela só tinha a ganhar.

Ganhei uma cliente satisfeita e também pude sentir que meu trabalho vale mais do que apenas a relação comercial.

O que, além da dieta/alimentação, mudou na sua vida depois do diagnóstico?

O convívio social, a organização e a cara de pau!

  • O convívio social foi afetado primeiro, tinha dificuldade de fazer as mesas coisas porque não podia mais sentar a mesa e comer junto com todos.
  • A organização veio depois, pois percebi que me organizando podia viver melhor, comendo antes, levando comida ou organizando em lugar seguro meu convívio social voltou ao normal.
  • A cara de pau vem pois temos que perguntar para todos o tempo todo sobre comida. Festa de empresa na casa do Diretor, vai ter jantar? Sentei com ele para discutir o cardápio e dizer que ele precisava pensar em mim. A amiga vai casar? Qual é o cardápio, como vai ser o evento, amiga, pensa em mim! Quero comer na sua festa!
    No restaurante: Posso ver a embalagem do produto?
    Quero falar com o chef! Se você estiver mentindo ou não cuidar vou desmaiar aqui no chão do seu restaurante!

Com relação ao desafio de panelas, o que te fez criar o jogo e unir outras pessoas?

Dois objetivos:

O comercial — uma forma interessante de divulgar minha marca e os produtos que vendo

O Não comercial — Divulgar a Doença Celíaca, mostrar que podemos competir, se divertir, se deliciar, diversificar — fazer tudo isso em um ambiente seguro e uma mesa cheia de delícias glúten free.

Que experiências e lições carrega depois de realizar o desafio?

Ganhei seis amigos Glutenfree, dividi experiências, me senti pertencendo a um grupo, aprendi receitas novas. Vi que a batalha é de todos.

E o melhor, dá para ser muito feliz e comer muito bem sem glúten!

Lilian finaliza a entrevista com uma mensagem para nós:

Calma, você consegue! Você é mais forte que a vontade de comer o que não pode! Depois que você sentir os benefícios de uma dieta limpa nunca mais vai conseguir voltar atrás.

E me chama para tomar uma cerveja que eu te ajudo!

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Mary Gabriela
Baladasemgluten

Relações Públicas — Especialista em Comunicação Interna. conteudista do “Fantástico Mundo RP”, conselheira do Conferp e Gerente de CS da “SimplificaCI”.