Fazer política é construir confiança

Caio Tendolini
Bancada Ativista
Published in
3 min readJul 20, 2017

Você já parou pra pensar porque o discurso da “família brasileira” é tão presente na boca dos políticos, e porque ressoa tanto nos cidadãos?

Durante muito tempo, eu achava que a razão era o bom e velho “ahh, o brasileiro é um povo conservador” e seus derivados (na esquerda “esse povo reacionário, facista” e na direita “esse povo ignorante, maleducado”).

Mas não é isso.

É porque hoje em dia ninguém confia mais em ninguém. A nossa tendência é cada vez confiar menos nas pessoas e nas instituições (partidos, movimentos, ongs, empresas, democracia, etc). E para além de confiar em si mesmo, o próximo nível de confiança é o da família (claro que famílias tem problemas, mas no imaginário é o lugar de confiança).

Níveis de confiança
você mesmo > sua família > seus amigos próximos

Quando algum político, algum partido ou alguma empresa se refere à família é porque é basicamente o único recurso narrativo que restou para nos falar sobre confiança.

“Defender a família brasileira”, mais do que defender um conjunto de valores, é uma forma de dizer (na maior parte das vezes sem nenhum fundamento) “eu vou defender o seu único espaço de confiança, então confie em mim”.

Agora corta pra Espanha

Recentemente fui pra lá e vi de perto os movimentos municipalistas que tem surgido e se fortalecido (se vc n conhece, da uma olhada no Barcelona en Comú e no Ahora Madrid, que ganharam as prefeituras nessas cidades em 2015).

Diferente do municipalismo a lá PMDB (que é basicamente quando governadores e presidentes ficam repassando verba para prefeitos que os apoiam, da forma mais clientelista possível), o municipalismo espanhol trata de organizar confluências cidadãs (juntar um monte de gente) nas cidades para discutir que cidade queremos e depois se organizar para eleger quem vai representar esse programa.

E a parte chave aqui é o “nas cidades”. Quando estive lá, entendi um pouco melhor o porquê. E tem basicamente duas razões, uma conceitual e outra bem pragmática.

A conceitual é porque um projeto político que de fato quer transformar alguma algo tem que priorizar a reconstrução da confiança. E confiança se reconstrói de perto. é quando as pessoas se juntam num bairro e transformam um terreno baldio numa horta comunitária ou numa praça. quando se organizam para frear a mudança de zoneamento de seu bairro. quando se reúnem para discutir o problema de segurança na rua de casa. quando saem de noite para entregar agasalhos e comida para moradores de rua. (perceba que aqui estamos falando de um nível de confiança para além da família, que são basicamente os vizinhos)

Tipo assim
você mesmo > sua família > seus amigos próximos > seus vizinhos

Você confia quando constrói algo junto. quando tem uma experiência real com outras pessoas.

E isso só acontece no território. Por isso, a escolha de focar em cidades é acertada. Porque para falar de política precisamos falar de confiança, e isso só se faz olho no olho.

A razão pragmática é porque a disputa local, por mais desafiadora que seja, é mais simples que a disputa estadual e federal. E que uma vez que se constroem Cidades sem medo, cidades para pessoas, cidades que confiam, podemos avançar para discutir que país queremos de verdade.

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Caio Tendolini
Bancada Ativista

Amante de projetos colaborativos que geram impacto positivo na sociedade. @update-politics