Sobre o que aprendi estando mais próxima da política. E sobre o quanto falta aprender.

carla mayumi
Bancada Ativista
Published in
6 min readSep 30, 2016
"Flertaço" realizado pela Bancada Ativista na Paulista Aberta, onde todos os candidatos a vereador da cidade de SP foram convidados a sentarem cara a cara com cidadãos interessados

Olá, dona Política, muito prazer.

Meu contato com a "dona política" é recente. Começou em 2013, quando começamos a desenhar o projeto Sonho Brasileiro da Política na Box1824. Fui aprendendo, aprendendo, e a cada coisa que aprendia eu ia percebendo o quão idiota eu era pra política. Aliás foi nessa aproximação que aprendi o que a palavra idiota tem a ver com política. "Idiotés", em grego, significa aquele que "só vive a vida privada" — e era a palavra usada para se referir a pessoas que "negavam a política".

A caminhada até aqui foi tipo um namoro mesmo. A gente ficou ficando até o dia que virou namoro e eu me vi completamente apaixonada. Mas eu tive sorte, conheci muita gente que me deu a mão e me conduziu nesse processo.

Isso está acontecendo com muita gente. A boa noticia é que eu não sou a única. Fiquei muito feliz quando vi o resultado da pesquisa realizada essa semana pelo Sonho Brasileiro da Política, que aponta que aumentou a importância da política na vida dos jovens pesquisados — 42% que acreditam que ela, a 'dona política', é importante em suas vidas. Em 2014 eram 31%. Estamos falando de muitos milhões de jovens que olham para a política hoje e pensam "olha, isso é importante na minha vida". Sem essa conscientização não tinha como passarmos para o segundo passo que é pensar: e como participo e me aproximo da política?

De 2013 para cá minha cultura política aumento, sem dúvidas. Mas ainda é pouco. É aquele velho e sábio jargão do "quanto mais sei, mais sei que nada sei". E aí, às vésperas de eleições municipais, decidi escrever este texto para compartilhar um pouco do que aprendi. Essa vontade também vem da dificuldade de acesso a conhecimentos básicos sobre a política. Como se desenha uma lei? Como se administra o orçamento de uma cidade? Não aprendemos sobre política nas escolas — apesar de esse ser o desejo de 63% dos jovens.

Aprendi a força das causas e como elas engajam as pessoas

Se outras gerações em décadas passadas se engajavam via partidos ou sindicatos, hoje as formas de engajamento são tantas e tão múltiplas que sobram razões para que cada um encontre a sua causa e faça algo por ela. As causas ganham importância e (ousado dizer) talvez passam à frente de dogmas ideológicos.

Como estamos cansados da incongruência partidária atual, vemos nas causas uma forma de nos engajarmos por algo que vai além de um pacote formatado. Não podemos, no entanto, desmerecer a importância dos partidos políticos. Eles precisam se adaptar aos novos tempos - tarefa, diga-se de passagem, nada fácil. Mas alguns mecanismos ajudam, como a candidatura independente — e pasmem, 91% das democracias permitem candidaturas independentes e o Brasil faz parte dos 9% que não aderiu a esse mecanismo democrático. Isso precisa mudar, para facilitar que novas almas entrem para dentro da política institucional. Por enquanto o que existe a fazer é tentar hackeá-las, como fez o Pedro Markun, candidato independente pela Rede (único partido que permite essa forma de candidatura).

Aprendi a importância de olhar para a política que é feita na cidade

Pouco nos damos conta de quantas leis existem à nossa volta. Participei de uma atividade de educação política com jovens do ensino médio recentemente. Essa simples pergunta: “que leis você conhece na cidade?” gera aquela cara de apreensão. Num papo de bar, entre adultos, a reação não é muito diferente. Nos damos conta da pouca importância que damos para leis que são desenhadas e aprovadas (ou não) para nossas cidades. E elas estão em todos os lugares: na alimentação escolar, na forma como vamos de casa para o trabalho, nas atividades que podemos fazer numa praça pública.

Aprendi a importância do Poder Legislativo

Aprendi como se desenha um projeto de lei, um pouco sobre como ele tramita, e entendi que é um trabalho duro ser um vereador ou um deputado sério. Com isso passei a conseguir separar minimamente o joio do trigo quando olho para nosso Congresso Nacional e percebo que nem tudo está perdido (sim, mesmo após o horror que foi assistir àquela fatídica votação do impeachment). Aprendi que antes de sair comentando um projeto de lei polêmico nas redes sociais, como o Escola sem Partido, eu preciso ler o documento e aí posso ir atrás de quem faz parte da Comissão onde o projeto tramita e depois acompanhar como ele será votado pelos deputados e/ou senadores.

Aprendi que a renovação na política não acontece porque o sistema eleitoral protege quem está no poder

As eleições são um grande jogo onde quem está no poder e tem dinheiro, manda. Pensa comigo: se você estivesse jogando um jogo e fosse OK mudar as regras dele para ganhar na próxima partida, por que não mudá-las? Pois é isso que acontece na política. Nos últimos anos foram aprovadas 11 mini-reformas eleitorais no Brasil, que no geral facilitaram a vida de quem quer se re-eleger e dificultaram a vida de gente nova que quer mudar as coisas. Quando quem está no poder define as regras, a renovação fica mais difícil. Nas eleições de 2014, todos os candidatos a deputado e senador que investiram mais de R$5 milhões em suas campanhas foram eleitos. Entre os que investiram menos de R$500 mil, apenas 3% foram eleitos. Aprendi tudo isso participando da Bancada Ativista, um movimento criado por um grupo de pessoas que se juntou para tentar mudar a forma como se elege vereadores em São Paulo.

Aprendi que as mulheres estão sub-representadas na política

A Lei das Eleições diz que partidos devem ter pelo menos 30% de candidatas mulheres, mas isso está longe de garantir equidade de gênero verdadeira. Muitos partidos cumprem a cota mínima só por cumprir, e não dão protagonismo real algum a mulheres na corrida eleitoral. Conheci muitos movimentos e mulheres que lutam pela participação das mulheres na política. Em São Paulo são 5 mulheres para 50 homens. Como país, ficamos atrás do Afeganistão, numa ridícula 153ª posição global com relação ao número de parlamentares mulheres.

Aprendi que existem, sim, caminhos possíveis para se inovar na política

Entendi que isso vem das pessoas, muito mais que das instituições. A descrença nas instituições só aumenta. Cada vez menos esperamos que mudanças virão dali. Enquanto isso é a força do coletivo, de forma independente, que tenta sair desse vazio em que estamos. São experimentos que acontecem pelo mundo que nos apresentam novas referências de como podem ser a política e a participação cidadã no futuro. O Update Politics mapeou iniciativas de inovação política na América Latina. O Muitxs, em Belo Horizonte, criou um movimento para dar força a candidaturas cidadãs, abertas e transformadoras. A Bancada Ativista, em São Paulo, é um grupo de pessoas que se uniu de forma suprapartidária para ajudar a eleger oito candidatos ativistas e mudar a cara da Câmara de Vereadores de São Paulo.

Tudo isso serve também pra dizer uma última coisa que aprendi e que é urgente porque vamos à urna domingo dia 02/10: que principalmente nessas eleições, em função da minirreforma eleitoral, votar nominalmente em candidatos e não em branco ou na legenda (partido) é a forma que eu e você temos ao nosso alcance para começarmos a virar a política. Sinto que muitas pessoas estão nesse movimento de saber mais sobre os candidatos e não votar sem pesquisar a trajetória e entender o que a pessoa já fez. Isso me dá esperança. Representatividade não se cria da noite pro dia. Os vereadores de agora serão os deputados do futuro. É hora de começar a nos vermos políticos que, de verdade, nos representam.

Sim, o túnel dos próximos anos pode ser escuro e longo. Mas tem, sim, muitas luzes ao longo do túnel. Esse fim pode estar mais próximo se a gente der potência a essas luzinhas que para a maioria são imperceptíveis. Mas você pode participar. Participando, vai ver como seus olhos mudam e você passa a enxergar coisas que antes não via.

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carla mayumi
Bancada Ativista

Sou mulher, mãe, gaúcha, empresária, perennial. Estudiosa de comportamentos e tendências desde 2005, apaixonada por música, tricô e outras cositas más.