Cashback ou dinheiro de volta? Um estudo de terminologia

Paula Völker
Banco Carrefour Design
9 min readJul 28, 2022

Um pouquinho sobre como a pesquisa é uma importante aliada para o trabalho de UX Writing/Content Design

Ilustração de uma menina sentada de pernas cruzadas com um notebook no colo. Ela está com uma das mãos na cabeça e, acima dela, um balão de pensamento. Ao seu lado está um grande sinal de interrogação. No canto esquerdo a palavra "cashback" e no direito a expressão "dinheiro de volta".

Você provavelmente já ouviu em vários cursos, palestras, lives, workshops e tudo mais que a pesquisa é essencial para o trabalho de uma pessoa UX Writer/Content Designer. E isso é a mais pura verdade. Mas, uma coisa que quem ainda não está atuando na área pode não saber é que nem sempre — ou raramente — você vai realmente ter a oportunidade de conduzir uma pesquisa de conteúdo sozinha (mas isso é conversa para outro momento).

Então, para fazer isso, a gente sempre conta muito com o apoio do time. E é assim que eu faço aqui no Banco Carrefour. As pessoas UX Designers e UX Researchers sempre me apoiam muito quando preciso fazer alguma investigação ou me aprofundar em algo sobre um conteúdo específico. Seja no meio de um teste de usabilidade, seja um teste A/B, uma entrevista com pessoas usuárias, uma pesquisa de profundidade… a gente sempre dá um jeitinho de incluir algumas perguntas ou tarefas que me ajudem a validar algo ou tirar insights de conteúdo que vão me ajudar no meu trabalho de writing.

E é sobre uma dessas atividades que eu quero contar para vocês hoje.

O cenário

Aqui, nós temos um produto com um programa de cashback para as pessoas usuárias. Mas, o time responsável por esse produto já vinha percebendo uma baixa adesão e compressão de clientes sobre esse benefício.

Foi então que, ao iniciar um processo de Discovery para ofertar esse produto para um novo público, a Tainá Fabro (que era a UX Researcher do time na época) percebeu durante algumas entrevistas que poucas pessoas entrevistadas conheciam ou entendiam o que era cashback.

Com esse resultado, a squad decidiu por trocar toda a terminologia existente no produto: onde estava escrito cashback, seria colocada a expressão “dinheiro de volta”. A intenção do time com essa mudança era deixar mais claro para a nossa pessoa usuária o que era aquele benefício que o produto oferecia, usando um termo em português.

Ok, mas e aí?

Na hora acendeu uma luzinha vermelha aqui para mim e eu resolvi entender um pouco melhor sobre o que estava acontecendo. Primeiro porque uma mudança de terminologia tem que ser feita com muito cuidado e de forma bem estruturada. E segundo porque nós já sabemos que o termo cashback é algo um pouco mais complexo do que a gente imagina, né?

Mas, mais do que isso:

  • Será que “dinheiro de volta” seria realmente a melhor opção?
  • Será que essa terminologia não estaria sendo usada por nossas pessoas usuárias em outro contexto?
  • Será que realmente faria sentido trazer essa troca, já que cashback é um termo que vem sendo muito usado no mercado e por outras empresas?
  • Será que não poderia ser simplesmente um problema de comunicação e não de terminologia?

Foi então que eu comecei um estudo mais aprofundado para realmente entender o contexto disso tudo. Como eu tinha sido envolvida no processo de Discovery realizado, então eu já sabia que essa pesquisa foi realizada com clientes e não clientes, e isso é um ponto bem importante aqui.

Depois de realizar uma breve imersão para entender melhor o cenário, foi momento de definir qual seria o objetivo principal desse meu estudo. Qual hipótese eu queria validar ou invalidar com a minha pesquisa.

O objetivo: “Entender se o problema é o termo cashback em si ou se existe um gap de entendimento devido a problemas de comunicação com a nossa pessoa usuária.”

Captura de tela com dois frames: no primeiro está descrito o objetivo do estudo e no segundo os passos que foram realizados.
Captura de tela com dois frames do board do Miro que montei para o estudo

Momento mão na massa

O próximo passo foi realmente começar a colocar a mão na massa mesmo. Mas, como eu atuo como única pessoa de Writing aqui do time, eu não realizei essa pesquisa totalmente sozinha. E agora é momento de contar como que foi isso.

Conversas com pessoas e times de writing de outras empresas

A primeira coisa que eu fiz foi usar o poder da comunidade. Se tem uma coisa que é incrível nesse mundo de writing é a abertura das pessoas para te ajudar e trocar ideias.

E essas trocas são incríveis. Pude ouvir e conversar com pessoas de diferentes empresas e backgrounds para entender os desafios que tiveram dentro de seus contextos não apenas com o termo “cashback”, mas com outros termos em inglês e as soluções que encontraram e os processos que realizaram para chegar à melhor conclusão.

Sempre recomendo fazer esse tipo de benchmarking, principalmente se você atua em uma “Euquipe” de writing ou se o time de Content é pequeno. Conversar com pessoas da área, conhecer outros cenários e trocar ideias sempre nos ajuda a expandir os horizontes e pensar um pouquinho fora da caixa. Faz bem!

Desk research

Em seguida eu comecei a fazer o famoso desk research. Fui atrás daqueles aplicativos e empresas que eu já sabia que tinham o benefício do cashback para entender como que era a comunicação sobre ele e as terminologias utilizadas.

Ao todo, eu estudei e analisei a jornada de 5 apps. E foi bem bacana ver as diferenças, tanto na voz, quanto na forma como cada marca se comunica com suas pessoas usuárias e apresenta o cashback.

Além de olhar para as telas dos aplicativos, eu também avaliei a comunicação via e-mail. Até mesmo para entender as diferenças na forma de falar sobre uma mesma funcionalidade em diferentes canais e analisar as estratégias e recursos utilizados.

Captura de tela do board do Miro com os prints dos aplicativos e emails que fizeram parte da etapa de Desk Research. São 5 blocos de capturas de telas, separadas por marca.
Como organizei a minha Desk Research no Miro: separei um frame para cada marca e nelas coloquei as capturas de telas dos apps e e-mails

Ao final, montei uma tabela comparativa de terminologia. Coloquei cada marca em uma linha e criei colunas com os diferentes momentos da jornada em que aparece/existe o benefício ou funcionalidade do cashback. Fui preenchendo as colunas com as terminologias que cada marca usava em cada momento: "cashback", "dinheiro de volta", "valor que ganhou comprando" e por aí vai. E quando em um mesmo momento a marca usava duas terminologias, eu trazia a informação de onde cada uma era usada.

Exemplo: "Cashback" nos títulos e "dinheiro de volta" nos textos complementares

E, por último, tinha uma coluna de observações. Ali eu coloquei uma análise sobre a comunicação como um todo e como as terminologias eram usadas pela marca, tanto no aplicativo, quanto nas comunicações transacionais (e-mails, push notifications etc.).

Captura de tela do board do Miro com a tabela comparativa das marcas. Nela, há 6 linhas e 9 colunas: a primeira coluna tem o nome da marca, nas colunas de 2 a 8 os momentos da jornada, com post its, e a coluna 9 é a de observações.
Imagem da minha tabela comparativa

Análise de pesquisas anteriores

Uma coisa que eu aprendi é que o histórico de um produto é algo extremamente rico. Então, é extremamente importante buscar pesquisas realizadas anteriormente para analisar e entender o que já foi feito, revisitar insights e traçar essa linha do tempo.

E por aqui a gente tinha um histórico muito bacana de pesquisas sobre o produto. Voltei para os meus tempos de jornalista, deixei a veia investigativa rolar solta por aqui e acabei descobrindo que essa dor já era antiga.

Por mais que não tenha uma pesquisa específica sobre o benefício do cashback, tinham estudos e testes de funcionalidades do produto ou da sua proposta de valor que acabavam falando sobre isso. E foi aí que eu percebi que sempre houve um problema de entendimento ali, não exatamente por causa do termo em si, mas por outras coisas que eu acabei comprovando com as etapas seguintes (sem dar spoiler, né?).

Outra coisa que eu fiz nesse momento, foi acessar o portal do nosso time de Inteligência Competitiva (IC) e buscar se havia algum estudo sobre cashback. E não é que tinha? Era um estudo de mercado super completo e que me ajudou demais a entender o cenário e como a concorrência estava fazendo.

Fica aqui a dica: pesquisa não é só teste, viu? É estudo de mercado, é desk research, é análise de pesquisas anteriores, é buscar dados com outros times da empresa para ajudar no entendimento e por aí vai. Bora expandir esse olhar!

— Breve resumo de um papo com a Ariana Dias, que eu achei muito que valia dividir por aqui.

Aproveitando uma pesquisa de guerrilha

Foi então, que, enquanto eu estudava tudo o que a gente já tinha dentro de casa sobre o assunto, surgiu a oportunidade de inserir uma pergunta específica sobre o meu estudo em um teste de guerrilha com clientes do nosso produto.

Lógico que eu não ia perder essa oportunidade, né? Conversei com a Tainá e incluímos questionamentos bem simples, só mesmo para validarmos o entendimento de terminologias:

  1. Você conhece a palavra cashback? O que ela significa para você?
  2. E a expressão “dinheiro de volta”?

Foi aí que veio o baque para o time do produto: a maioria das pessoas disse conhecer o termo cashback. E, quando vinha a segunda pergunta, muitos não conheciam ou falavam ser algo atrelado ao termo cashback.

Ou seja, aqui já começamos a entender que o problema não era a palavra em si, mas sim a forma como era realizada a comunicação sobre o benefício.

Desse teste, conseguimos tirar alguns insights bem interessantes, como:

  • Usar termos como desconto, lucro e economia na comunicação sobre o benefício do cashback pode ser algo interessante e chamativo para nossas pessoas usuárias.
  • A curva de aprendizado de clientes pode ser menor se usarmos cashback e “dinheiro de volta” de forma complementar.

Shadowing e teste de usabilidade

Por último, surgiu mais uma oportunidade de incluir perguntas e observações sobre o meu estudo em outro teste/pesquisa que ia acontecer. A Janaína Borba, que era a UX Designer do time, ia fazer uma pesquisa sobre o fluxo de aquisição do produto e isso se encaixava perfeitamente no contexto do meu estudo. Por alguns motivos:

  • Saber como é feita a oferta/explicação sobre os benefícios.
  • Investigar se há alguma dúvida sobre o cashback no momento da aquisição e como essa comunicação é feita.
  • Entender como o benefício é explicado para as pessoas atendentes de loja que fazem a oferta do produto.
  • Descobrir se há algum material de apoio sobre o produto e seus benefícios para auxiliar na venda e na explicação para clientes.
  • Avaliar o pós-venda, entender o que acontece, tipo de comunicação feita.

E foi um teste extremamente rico! Além de complementar tudo o que eu já tinha feito e obtido de insight das etapas anteriores, o que descobrimos nesse momento nos ajudou a validar a nossa hipótese de que o problema não era o termo cashback.

Isso porque durante o teste identificamos que existe uma falha na comunicação, pois não há um padrão já que as pessoas atendentes não possuem um material de apoio para isso. Além disso, a informação sobre os benefícios acontece apenas nesse momento. Como não há um reforço, elas acabam esquecendo dele e como ele funciona.

Captura de tela com três frames do Miro. No primeiro estão post-its com os insights das pesquisas realizadas anteriormente. No segundo, os post-its com as respostas e descobertas do teste de guerrilha. E, no último, post-its com os insights do teste do fluxo de aquisição.
Imagem da organização dos insights das pesquisas e testes

Depois de tudo isso, e o resultado?

A conclusão foi que apenas mudar a terminologia não seria o suficiente para sanar o problema de entendimento. Ao longo de todo o estudo foi identificada uma falha na comunicação e no entendimento sobre o termo desde a aquisição do produto.

Com isso, a solução proposta foi de realizar algumas ações para resolver o problema ao longo de toda a jornada, não apenas com uma mudança de texto no aplicativo.

Ainda temos um longo caminho pela frente, mas a ideia é mapear os pontos da jornada de clientes em que podemos trazer um conteúdo mais explicativo para auxiliar no entendimento do benefício e diminuir a curva de aprendizagem.

E isso vai ser feito de forma conjunta com os times de Marketing e Uso e Engajamento, pois envolve outros canais de comunicação. Queremos pensar nas melhores soluções para realmente trazer valor para as pessoas usuárias e auxiliar no entendimento do benefício. E, para isso, a ideia é utilizar os termos cashback e "dinheiro de volta" de forma complementar.

Captura de tela que mostra o board do Miro completo, com todos os frames e etapas que foram realizados ao longo do estudo.
Visão de todo o board do Miro ao final do estudo inicial de terminologia

Nota: lembrando que esse estudo foi feito para o nosso contexto aqui no Banco, tendo como foco o nosso produto e pessoas usuárias. Lembrem-se: cada marca/produto/empresa tem a sua história, contexto e necessidades. Então, cada uma vai ter uma solução que se encaixa melhor. 💜

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Written by Paula Völker

UX Writer | Content Ops meio nerd e apaixonada pelas palavras