Imagem: afresco de Benozzo Gozzoli, na parede leste da Capela dos Magos (Cappella dei Magi), em Florença

Apresentação às Guerras Carmilitas

Vale
bardosbardos

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Guerras Carmilitas é uma crônica de RPG jogada por amigos de longa data que, apesar da distância que agora os separa, mantém o vínculo vivo através do jogo. Usando o Discord e o Roll20, esses garotos de 30 e poucos anos se divertem todas as quarta à noite, com direito a brindes internéticos, sonoplastia única, devaneios coletivos e eventuais quedas da comunicação virtual.

No momento em que escrevo, somos seis jogadores e um narrador. Utilizamos pela primeira vez o sistema do Shadow of the Demon Lord, que tem recebido uma avaliação muito boa por parte dos jogadores. O cenário vai crescendo de acordo com as sessões, participando todos de sua autoria a partir da condução do narrador. Isso significa que introduzimos aspectos culturais e históricos, inventamos histórias e cidades que vão aos poucos construindo esse cenário.

O cenário

Guerras Carmilitas possui um parentesco forte com a Itália renascentista dos séculos XIV e XV, sendo composta por diversas cidades-Estado que disputam o controle de terras férteis e rotas de comércio. O comércio possui um valor muito grande, trazendo mercadores e pessoas do mundo afora. Esse fator, associado a uma revolução tecnológica e artística, torna a vida nessa região especialmente interessante e há grande variedade de formas de governo e diversas organizações presentes.

Esse multiplicidade também se reflete nos costumes, dialetos e crenças. Enquanto boa parte da elite adota uma postura cínica ou científica, bastante próxima de um despotismo esclarecido, as camadas mais populares cultuam ainda deuses antigos e espíritos de familiares. Esse contraste se acentua com a chegada de estrangeiros que cultuam seus próprios deuses ou professam estranhas filosofias. Há, contudo, um elemento bastante corriqueiro entre as diversas religiões e filosofias: a figura da serpente ou do dragão é malvista e desprezada, sendo considerada a raiz de todos os males.

Magia

A magia é vista de diferentes perspectivas, dependendo de quem a utiliza mas, em linhas gerais, os nobres a enxergam como um conhecimento acessível principalmente por meio da filosofia, como se houvesse algo intangível, que chama de Caos e que permeia as diferentes formas de manifestação mágica no mundo. A arte arcana dos nobres, por ter um caráter mais formal, quase científico, envolve a necessidade de longo estudo e investimentos que só podem ser empreendidas de forma consistente e metódica por aqueles com recursos e tempo livre disponível como eles próprios.

Os mercadores são uma classe relativamente recente que possui os recursos financeiros para ter acesso a tutores nobres, mas carecem dos costumes e crenças nobiliárquicas e possuem objetivos mais materiais e utilitários, de maneira que sua acepção da magia possui também essas característica, privilegiando as necessidades imediatas em detrimento das infindáveis discussões filosóficas sobre a origem ou natureza da magia.

Em contraponto a isso, a magia entre os plebeus tem uma característica mais supersticiosa, não metódica, sendo mais vista como um dom, um talento inato ou adquirido por vias milagrosas, não sendo acessível por estudo ou dedicação.

A nobreza acredita que sua magia é superior e refinada, pois racional, enquanto a plebe acha que os nobres pensam demais e sentem de menos, sendo limitados pela própria razão ao explorar todas as possibilidades do reino fantástico da magia. Os mercadores estão mais próximos da concepção dos nobres, de que a magia é algo acessível por quem tem recursos, mas dispensam todo o arcabouço filosófico, atentando para os efeitos reais da arte arcana.

Seja como for, a magia torna seu utilizador uma espécie de canal de energia entre o plano real e os planos mágicos. Quanto mais complexa for uma magia, mais ela requer do utilizador um domínio do plano que busca acessar. Por conta disso, o uso contínuo de magia deixa marcas em seu utilizador, embora muitos arcanos argumentem zombeteiramente que as marcas deixadas em seus alvos são mais conclusivas.

Tensões sociopolíticas

Imgem: pintura de Henri Félix Emmanuel Philippoteaux, a Batalha de Garigliano (1840)

Assim como há um avanço científico e tecnológico, existe uma redescoberta de magias, artefatos e conhecimentos, deixados para trás por civilizações chamadas de “antigas”. Como consequências das trocas econômicas e culturais mais intensas, o acesso à magia por parte daqueles que não compõem a classe aristocrática ou que frequentam as escolas de magia (o que costuma dar no mesmo) tem crescido, assim como a alfabetização das pessoas. Essa alteração no acesso aos conhecimentos tem causado tensões políticas e ideológicas, em especial porque os nobres veem esses desenvolvimentos com desdém mal-disfarçado e preocupação crescente.

Ao norte da região, um reino unificado prospera após a conversão em massa ao culto de Ezra, um santo cujo mito conta que libertou a humanidade da sombra opressora da serpente. Essa religião tem se espalhado e sua aceitação entre a nobreza tem sido facilitada pelo fato de que o Culto a Ezra engloba também conhecimentos sobre as tradições.

A região da Carmilita passa por grandes transformações. Enquanto os nobres ainda detém o poder de fato, algumas cidades vivem momentos de agitação social. A cidade de Lucello, por exemplo, expulsou a família regente e um conselho foi eleito. Ainda que a experiência não tenha durado muito pois as cidades vizinhas se aliaram e esmagaram a “Rebelião dos Idealistas” por medo de que o exemplo se alastrasse, a revolta pode ser entendida como um sinal dos tempos vindouros.

Enquanto a região da Carmilita, apesar e por conta da riqueza crescente oriunda do comércio, se envolve constantemente em disputas territoriais, escaramuças e pequenas guerras, os territórios ao seu redor vivenciam processos de unificação, em que nobres bem-sucedidos expandem sua área de influência e acabam por se tornarem Duques, Condes e até Reis. As regiões férteis e ricas da Carmilita podem se tornar um alvo bastante cobiçado desses poderes crescentes. Mas, por enquanto, ela aparenta estar alheia a essas ameaças, mais interessada em questionar quem controla aquela margem daquele rio, se o pedágio está caro ou barato e qual a nova sensação de chapéu entre a nobreza.

Os novatos dos Lobos Negros

O grupo é composto por pessoas que, pelos motivos mais diversos e inusitados, juntaram-se à companhia mercenária dos Lobos Negros. Liderados por Gambino, um veterano de guerras, a companhia parte da cidade de Roccaforte rumo a Venticera, onde devem se juntar ao General Albierri de La Marca. Por serem recrutas e novatos, os personagens sofrem forte discriminação e maus tratos por parte dos veteranos, relutantes em oferecer algum respeito àqueles que não provaram seu valor no campo de batalha. Esse tratamento fez com que o grupo se juntasse, se não por afinidade e sim por necessidade.

O grupo é composto por humanos, com classes (novice) e histórias de vida distintas. Abaixo, uma breve descrição de cada um deles, tal como se apresentam no início da campanha. Os relatos de suas aventuras podem ser encontrados aqui.

Brancaleone (imagem: Sandro Boticelli, Retrato de um jovem [1482/1485])

Brancaleone, magician (Vale): um jovem, poeta mercenário e mercenário poeta. Sua falta de aptidão, modos rebuscados e dons mágicos revelam um contraste entre as roupas sujas e pobres e um passado nobre.

Caelus (imagem: Parmigianino, Retrato de um homem com um livro [1524])

Caelus, rogue (Marcelo): homem de modos educados e comedidos, Caelus transmite confiança e determinação. Seu passado, assim como suas intenções, permanecem um mistério.

Enzo (imagem: Louis-Maurice Boutet de Monvel, Retrato de Paul Mounet [1875])

Enzo, rogue (Daniel): homem de traços comuns e ordinários, passa despercebido na multidão. Pouco falante, porém amigável. Sua história é difícil de ler.

Silhueta de Giuseppe (imagem)

Giuseppe, rogue (Nader): reservado, atento e desconfiado, características de quem cresceu à margem da sociedade. Esguio, usa sempre uma capa. Sua confiança deve ser conquistada para que revele mais sobre suas origens e objetivos.

Ophelia (imagem: Théodore Jacques Ralli, Mulher grega com um traje folclórico tradicional [séc XIX])

Ophelia Mavromichalis, rogue (Roberto): uma mulher mais velha e experiente, Ophelia abandona a vida de fazendeira e sai em busca de seus filhos e marido, que partiram pra guerra há alguns anos.

Silhueta de Ottelo (imagem)

Ottelo, priest (Yuri): jovem destemido em combate, graças à crença de que o destino lhe reserva algo. Curioso e indagativo, em sua terra natal foi treinado em filosofia e magia.

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