Todo Domingo é Domingo de Ramos

Thais Cavalar
Basileia
Published in
4 min readApr 5, 2020

Peter J. Leithart

Igreja de Bethphage © Saint Mary’s Press

Quando Jesus entra em Jerusalém no Domingo de Ramos, tudo muda. Como Marcos conta, Jesus havia andado em segredo, ensinado em privado, evitando chamar atenção a seus milagres, e falando em parábolas codificadas. Ele cura um leproso, mas o alerta: “Olhe, não conte isso a ninguém” (Mc. 1:44). Pedro confessa que Jesus é o Cristo, mas Jesus o instrui a “não falar a ninguém a seu respeito” (Mc 8:30), e depois da transfiguração, Ele “lhes ordenou que não contassem a ninguém o que tinham visto, até que o Filho do homem tivesse ressuscitado dos mortos” (Mc. 9:9). É uma anti-campanha de relações públicas.

Jesus não procurou os centros de poder de Israel. Ele esteve no desprezado fim de mundo da Galiléia e nas periferias da terra. Ele não visitou Jerusalém nem o templo. Ele andou por toda a parte, sempre em movimento, mas sempre a pé.

O Domingo de Ramos, todavia, não foi um segredo. Jesus encena um advento para a cidade, aceita a aclamação da multidão, e segue direto para o templo. Até mesmo seu meio de transporte muda: Ele monta entronizado em um jumentinho, enquanto discípulos estendiam seus mantos e ramos de árvores pelo caminho. É uma cena de “teatro em praça pública” (David Garland), a realização autoconsciente da profecia de Zacarias 9, que nos fala da chegada de um rei conquistador a Sião. A hora de Jesus chegou, uma hora de confronto que ele sabe que levará a sua prisão, julgamento e morte.

Apesar de todo o espetáculo de sua entrada, o Domingo de Ramos termina em anticlímax. Ele é proclamado rei, mas não há coroação ou unção. Ele entra no templo, olha ao redor, então sai silenciosamente para passar a noite na vizinha Betânia. O anticlímax é parte do ponto. Quando Ele finalmente toma seu trono, trata-se de uma cruz.

No entanto, à medida que os eventos se desdobram no passar dos dias, se torna claro que o Domingo de Ramos não é exatamente tão anticlimático como parece à primeira vista. Apesar de não ser coroado como rei, Jesus assume o papel de sacerdote com sua análise do templo. De acordo com Levíticos 14, tanto casas como pessoas podiam contrair “lepra”. Para determinar se a casa estava contaminada, um sacerdote inspecionava a casa e então retornava depois de uma semana para ver se a infecção tinha se espalhado. Eventualmente, se a casa era leprosa, ela deveria ser demolida, “as pedras, as madeiras e todo o reboco da casa” (Lv 14:45).

A primeira visita de Jesus ao templo é uma inspeção sacerdotal, e quando Jesus retorna no dia seguinte, Ele encontra uma contaminação disseminada. O templo deveria ser uma casa de oração para todas as nações, mas Jesus acusa os Judeus de transformá-lo em uma casa segura para bandidos e ladrões. O templo deveria ser um refúgio para viúvas, mas as autoridades do templo devoravam as casas das viúvas (Mc 12:40–44).

Dessa vez Jesus age, dramaticamente, tombando as mesas dos cambistas e os expulsando. Em outra peça de teatro profético, Jesus encena a destruição da casa leprosa. Alguns dias depois, assentado no Monte das Oliveiras, Ele os alerta que em breve “não ficará pedra sobre pedra que não seja derribada” (Mc. 13:1).

Como os outros escritores dos Evangelhos, Marcos entrelaça a narrativa da limpeza do templo com a história da figueira. Quando Jesus volta a Jerusalém no dia seguinte à sua entrada, ele procura frutos em uma figueira, não encontra nenhum e amaldiçoa a árvore. Na manhã seguinte, a árvore está “seca desde as raízes” (Mc. 11:20). É uma figura da destruição do templo, e Jesus imediatamente acrescenta um encorajamento sobre o poder da oração: “se alguém disser a este monte: ‘Levante-se e atire-se no mar’, e não duvidar em seu coração, mas crer que acontecerá o que diz, assim lhe será feito” (Mc. 11:23). Esta montanha é o monte do templo, e o mar é o mar dos Gentios, que engolirá o templo poluído dentro de uma geração. Assim como a maldição de Jesus secou a árvore, as orações dos discípulos moverão montes de templo.

“Hosana! Bendito é o Rei que vem em nome do Senhor! Paz no céu e glória nas maiores alturas!” Através dos séculos e hoje por todo o mundo, os Cristãos cantam a canção do Domingo de Ramos todo domingo. Por esta música, nós reconhecemos que Jesus o Rei veio entre nós. Jesus o Rei conquistador é também Jesus o Sacerdote inspetor, que veio para examinar o templo do Espírito que é Sua igreja. Se Ele descobrir que transformamos Sua casa de oração em um covil de ladrões, se Ele ver sangue de viúvas e órfãos em nossas mãos, Ele declarará nossa casa desolada e removerá nosso candelabro.

Todo domingo é Domingo de Ramos. Nós aclamamos Jesus com alegria, reverência, e temor, pois nosso Sacerdote é fogo consumidor.

Texto original: Every Sunday is Palm Sunday
Tradução: Thais Cavalar
Revisão: Bruno Pasqualotto Cavalar

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