Almeida Centro de Inspiração: quando a arte ocupa o Centro de BH

Redação Cool
Beagá Cool
Published in
5 min readDec 6, 2017

Em vida, o astrônomo Carl Sagan costumava dizer que éramos feitos de poeira de estrelas. Do ponto de vista científico, isso significa que os elementos químicos que constituem os seres humanos vieram de estrelas que morreram bilhões de anos atrás. Mas basta um olhar um pouco mais poético para enxergar nessa informação a prova de uma origem em comum entre todos os habitantes do “pálido ponto azul” que é a Terra. Pode-se até dizer que, no final, somos feitos uns dos outros.

Contando com a força dessa ideia, surge uma campanha de financiamento coletivo promovida pela Ernesto — Plataforma de Humanização. Seu objetivo é que Belo Horizonte abrace e apoie a comunidade de artistas, educadores e criativos que ocupou três andares do edifício Joel Augusto de Almeida (ali na Rua São Paulo, 249) para montar o Almeida Centro de Inspiração. A iniciativa abriga uma série de atividades culturais e tem a proposta de resgatar o afeto das pessoas com a região central da cidade.

A ocupação começou oficialmente neste ano e já mira futuros desdobramentos. Mas, antes de conhecê-la, aqui vai um pouco de história mineira.

O início de tudo

Em 1959, dois irmãos, Henrique (foto acima) e Joel Augusto de Almeida, dedicavam-se ao comércio de tecidos no Centro de BH. Quando uma doença cardíaca deixou Henrique preocupado com a própria vida, ele começou a pensar em novas possibilidades de negócios para garantir o sustento de sua família. Inesperadamente, porém, quem morreu no ano seguinte foi Joel, após um infarto fulminante.

O triste acontecimento motivou Henrique a comprar um terreno na Avenida Santos Dumont, esquina da Rua São Paulo, e iniciar a construção de um prédio de 12 andares, que receberia o nome do querido irmão. Em 68, a obra foi finalizada e Henrique passou a se dedicar à administração das 96 salas comerciais em um dos pontos comerciais mais importantes da capital.

Décadas se passaram e o empreendimento trouxe bons resultados para a família. No entanto, em 2004, devido à degradação da região central e da dificuldade de achar novos e bons inquilinos, Henrique resolveu desativar o edifício, com muito pesar.

Segundo Daniel Simão, um dos cofundadores da Ernesto, o proprietário “morreu aos 94 anos, em 2012, sem encontrar uma solução para o prédio que sempre foi sua menina dos olhos”. E essa até poderia ser uma história triste se ela terminasse aqui.

A Ernesto entra em cena

No final de 2015, a Ernesto conheceu o edifício Almeida e ficou encantada com a possibilidade de fazer uma edição de sua revista homônima sobre esse interessante objeto urbano.

“O personagem Ernesto, que dá nome à publicação, representa o homem médio em busca de suas potencialidades e de sua melhor versão. Nós também somos ‘Ernestos’ e nos vimos confrontados com novas maneiras de falar sobre o Centro de BH. Então, pedimos a chave para a família Almeida e lançamos a revista em 2016 com o tema ‘Como reativar o que não deveria ser esquecido’”, conta Daniel.

A partir daí, o vínculo com o prédio se intensificou, assim como o sonho de viabilizar algo no interior dele. Uma série de atividades que priorizassem relações mais humanas e horizontais começou a ser feita. Um exemplo foi o Marmita no Museu, que convidou várias pessoas que trabalham, moram ou transitam pelo centro de BH a almoçar no Almeida, enquanto assistem a palestras, oficinas, filmes, performances e apresentações musicais.

Além disso, também houve a preocupação de reapresentar o edifício para os integrantes da família Almeida, através de poesias e músicas criadas para contar a história deles.

As estrelas da ocupação

De acordo com Daniel, o projeto foi crescendo e surgiu a necessidade de chamar pessoas que ocupassem o prédio e racionassem em conjunto as melhores soluções para ele. “Contatamos o JA.CA — Centro de Arte e Tecnologia e formatamos um edital de convocação de artistas e de coletivos locais interessados em conhecer a história do Almeida e ocupar as primeiras salas, de junho a dezembro de 2017”, completa.

No momento, o Almeida conta com 24 ateliês ligados à dança, fotografia, música, cinema e literatura. Participam do projeto nomes como Criola, Lucas Kröeff, Marc Davi, Jade Marra, Binho Barreto, Zuba, Filme de Rua, Lorena Zschaber, Athos Souza e Bernardo Silva, Fernando Poletti e Igor Reis, O SOMOS, Masterplano, Micrópolis, Radiolaria, Virgílio de Barros, Coletivo Joyces e Coletivo M O F O.

Muitos deles estão no início de suas carreiras e, assim como o personagem Ernesto, tentando encontrar suas melhores versões e as melhores versões de seus trabalhos, para repensar as dinâmicas urbanas no Centro da capital mineira. Seja por meio de exposições, projeções de filmes, performances ou aulas de dança.

“Temos um espaço que encanta as pessoas e que as motiva a criar algo em prol do todo. Isso é muito bonito, pois se sobrepõe à ideia do individualismo como regra”, afirma Daniel.

O que você pode fazer para ajudar

Durante o processo de ocupação, a família Almeida se relacionou com o grupo de forma completamente emocional e nunca fez qualquer tipo de cobrança financeira. Por isso, a história de seus integrantes e do próprio edifício foi respeitada com bastante atenção.

“Tudo que foi encontrado aqui dentro foi utilizado por nós de alguma forma. Nossas intervenções são pontuais e servem para aumentar as possibilidades do espaço. Não queremos interferir na estrutura do Almeida, porque sua beleza está na história que ele conta”, revela Daniel.

Apesar disso, existem algumas reformas que precisam ser feitas para que o prédio possa voltar à vida. Elas estão relacionadas à modernização de dois elevadores da década de 1960 e dos sistemas hidráulico e elétrico. Daí vem a campanha de arrecadação que não só possibilitará essa renovação, como dará continuidade ao projeto.

Segundo Daniel, o objetivo é emocionar Belo Horizonte para que ela abrace a causa e contribua para a ocupação das outras 72 salas do prédio. “Nossa intenção é transformar o Almeida em um centro de absoluta produção artística, que visa transformar a cidade. Estamos prontos para dar esse salto. Entendemos as leis de incentivo, mas não acreditamos nelas. Queremos uma nova maneira de fazer as coisas acontecerem e que o Almeida seja referência de qualidade absoluta em arte e educação”, afirma.

A campanha que vai viabilizar a continuidade do Almeida Centro de Inspiração está aqui, esperando seu apoio.

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