É possível ser obeso e saudável?

Pesquisadores opinam sobre o assunto que é carregado de divergências

Ariane Laureano
Redação Beta
5 min readOct 17, 2017

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Segundo especialistas, o Índice de Massa Corporal é insuficiente para definir se uma pessoa tem um peso saudável (Foto: Pixabay)

É possível estar acima do peso e ser saudável? Pesquisadores da Universidade de York, no Canadá, afirmam que sim. O estudo realizado em 2011 e publicado na revista “Applied Physiology, Nutrition and Metabolism” conclui que as pessoas acima do peso podem ser saudáveis, viver tanto quantas as magras e ser menos propensas a desenvolver problemas cardiovasculares. A equipe de pesquisa comparou o risco de mortalidade de 6 mil obesos com a de indivíduos magros. Segundo uma das autoras, Jennifer Kuk, o estudo vai contra a ideia de que todos os obesos precisam emagrecer e que ficar tentando e falhando na perda de peso pode ser mais prejudicial do que se manter num peso corporal acima do ideal, mas adotando um estilo de vida saudável, dieta balanceada e a prática regular de exercícios.

Adotar hábitos saudáveis é o ideal para evitar problemas futuros (Foto: Ariane Laureano/ Beta Redação)

Para o fisiologista do Grêmio e professor do curso de Educação Física da Unisinos Leandro de Oliveira o indivíduo pode ser obeso e saudável por grande parte da vida. Mas chega uma momento que essa sobrecarga afetará sua saúde. “Seja na articulação ou no sistema cardiovascular, o excesso de gordura se transformará em colesterol e isso é um fator que pode desencadear inúmeras doenças. Mas existem exceções, não podemos generalizar nenhum caso”, explica.

O nutrólogo e geriatra Leandro Minozzo afirma que a obesidade é uma doença e expõe a pessoa a muitos riscos. “Você pode ser obeso e estar fisicamente ativo e ter bons hábitos, isso é uma coisa. Mas não se pode negar o impacto da obesidade em si. A chamada gordura localizada, que é aparente na estética, a princípio não é a mais nociva. A que exige maior cuidado e precaução é a a gordura visceral, a interna”, salienta o especialista.

Para que uma pessoa seja considerado obesa, ela precisa ter um índice de massa corporal igual ou superior a 30 kg/m², enquanto adulto. Para crianças e idosos há variações específicas. Já para ser magro, ou ter o baixo peso corporal, é preciso que o IMC seja menor ou igual a 18,5 kg/m². Apesar de ser referência no mundo inteiro para cálculo da obesidade, o Índice de Massa Corporal costuma classificar atletas profissionais e fisiculturistas como obesos. É preciso utilizar desse método com alguma ressalva, explica o fisiologista. “O IMC faz uma comparação entre altura e peso. Mas a gente também precisa levar em conta os vários componentes corporais. De modo geral, a gordura, os ossos, as vísceras e a massa muscular. Tudo isso faz peso. Mas só o que pode ser nocivo é o excesso de gordura, e é aí que o IMC se atrapalha. Por isso, eu prefiro aliar o IMC ao cálculo das dobras cutâneas (avaliação física), onde será medido o real percentual de gordura”, defende.

As razões pelas quais algumas pessoas pesam mais do que outras são diversas e complicadas. Algumas são obesas por comerem muito, mas há outras razões que podem contribuir para esse fato — genética, falta de sono, raça e etnia, nível socioeconômico, medicamentos e até mesmo poluição e ar-condicionado entram na balança. Minozzo explica que o ideal é individualizar a dieta. “Precisamos balancear os macronutrientes. Contar apenas as calorias é uma grande armadilha. A alimentação é fundamental para o emagrecimento, assim como é o sono e o nível aumentado de atividade física “ , ressalta o nutrólogo.

Força de vontade para mudar

Para combater a obesidade, a Prefeitura de Canoas lançou o programa Canoas Mais Leve, que tem como objetivo acompanhar as pessoas obesas através de grupos, nos quais são feitos atendimentos nutricional e psicológico e com propostas de atividades físicas. Segundo a organização do projeto, os índices de obesidade na cidade motivaram a criação do programa. Em Canoas, 50% dos pacientes obesos morrem jovens, antes dos 70 anos.

A fim de reduzir os índices de mortalidade e prolongar a expectativa de vida com qualidade, o foco dos atendimentos está em pacientes que reúnam um ou mais fatores associados, como hipertensão, diabetes, dislipidemia, obesidade central, artrite, artrose, síndrome dos ovários policísticos, esteatose hepática (acúmulo de gordura no fígado que pode evoluir para cirrose), apneia do sono ou outra comorbidade que o médico entenda como importante.

A psicóloga do programa, Dóris Luft, acredita que além da perda de peso é possível ver resultados no resgate do amor próprio e no aumento da autoestima. “Costumo falar que o peso acaba ficando mais leve no momento que eles sabem que não estão mais sozinhos nessa luta, que têm profissionais orientando esse processo e que se trata de um adoecimento e não apenas um capricho de comer demais, aliviando assim suas culpas” , explica.

O supervisor de Manutenção de Equipamentos de Incêndio Salvador Machado da Silva, 64 anos, participa, por indicação médica, do projeto em razão do diagnóstico de Esteatose Hepática — gordura acumulada no fígado. Ele ingressou no grupo no ano passado e comemora a perda de 11 quilos até o momento. “Esta vitória se deu pelo processo de reeducação alimentar. O próximo passo é conciliar o meu trabalho com alguma atividade física para perder mais peso”, afirma.

Salvador da Silva perdeu 11 quilos e ganhou mais qualidade de vida. (Foto: Vinicius Thormann/Divulgação)

O educador físico Leandro de Oliveira salienta que entre todas as mudanças realizadas para perder peso, fazer exercício físico é o que menos contribui. “O exercício te motiva a continuar e a fortalecer a musculatura, isso porque ele diminui a gordura e aumenta a massa magra. Mas o gasto calórico em termos de emagrecimento, não é significativo. Além disso, não podemos avaliar a perda de peso apenas nos números da balança.Isso porque o indivíduo pode ter aumentado o peso numérico e diminuído a gordura. Por isso eu digo que a alimentação rende muito mais”, comenta.

Dóris relembra que a comida não deve ser lembrada apenas nos momentos de recompensa e celebração. “Queremos com o programa que cada participante entenda sua relação com alimento, e que possa estar no controle disso. Não queremos que o programa seja um castigo, queremos que ele seja uma escolha, um desejo de mudança, fazer escolhas sabendo que isso é benéfico a elas, e que de nenhuma forma essa escolha seja uma opção ruim ou punitiva, apenas diferente”, completa.

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