“A mulher entrar na ‘obra’ significa o fim do império machista”

Aumenta cada vez mais o número de mulheres dispostas a quebrar os estereótipos de gênero e colocar a mão na massa na construção civil

Tina Borba
Redação Beta
5 min readMay 30, 2018

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A construção civil sempre foi um mercado dominado por homens. Mas essa realidade está mudando. Segundo dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), entre 2002 e 2012 o número de mulheres trabalhando em obras cresceu 65%.

A fundadora da ONG Mulher em Construção e autora da frase que intitula essa matéria, Bia Kern, tem feito parte desse crescimento desde 2006, ano de fundação da ONG. Até hoje, já alcançou mais de 5 mil mulheres, fornecendo gratuitamente cursos de hidráulica, cerâmica, alvenaria, pintura e elétrica.

Em cada curso a ONG seleciona um espaço público/carente a ser restaurado pelas alunas em seu processo de aprendizagem. Neste caso, a Prefeitura de Esteio. (Foto: Tina Borba/Beta Redação)

Mão de obra feminina

A ONG capacita mulheres de qualquer idade ou classe social para realizar reparos dentro e fora de suas residências. Os cursos acontecem por meio de parcerias com empresas apoiadoras ou prefeituras, como por exemplo as Lojas Taqi, MRV Engenharia, Tintas Renner, Prefeitura de Esteio, de Sapucaia do Sul, de São Leopoldo, além de entidades internacionais que prestam apoio especialmente na gestão do projeto.

Algumas mulheres não se contentam em apenas reparar suas casas e fazem da construção civil uma profissão. É o caso das profissionais cadastradas na plataforma de divulgação de mão de obra feminina Diosa. A plataforma foi fundada em outubro de 2015, pela porto-alegrense Maira Peres, junto com outras três sócias.

Maira passou por uma situação que a intimidou no início do ano de 2015 e viu que devia fazer algo a respeito. “Meu pai não estava na cidade e deu um grande temporal e eu tive que ir resolver a situação na casa dele. Eu passei dias apreensiva com dois estranhos dentro da casa, sozinha, enquanto eles consertavam”, afirma ela. Nada aconteceu com Maira, entretanto, levando em consideração que a cada 23 minutos uma mulher é agredida no nosso Estado (conforme dados da Secretária de Segurança Pública — SSP), não é de se estranhar que assim como ela, tantas outras mulheres não queiram passar pela mesma situação.

(Foto: Diosa/Divulgação)

Na Diosa todas as profissionais de elétrica, hidráulica, pintura, marcenaria, decoração e reforma são mulheres. Através do site é possível solicitar o orçamento, agendar o serviço e fazer o pagamento. As profissionais também atendem homens e empresas interessadas.

Rosana Coin, pintora residencial autônoma, também tem uma clientela variada. “Eu atendo principalmente casais, mas como tenho uma lista de espera grande, sempre dou prioridade para mulheres que vivem sozinhas, ou com crianças e idosos em casa”, comenta ela.

Há 20 anos Rosana, mãe de dois filhos, deixou a curiosidade falar mais alto e começou a pintar. “Eu aprendi com curiosidade mesmo, ia testando, ia aprendendo, tentando entender como funciona o mecanismo das tintas, tomando a frente e fazendo”, enfatiza ela.

Rosana atende por indicações e tem uma espera de até 4 anos. (Foto: Juliana Coin/Arquivo Pessoal)

O fato de mulheres não serem comumente encontradas em canteiros de obra e, principalmente, serem desacreditadas em trabalhos que exijam mais força física, não desestimula Rosana, pelo contrário. “E quanto mais me falam que não pode, mais eu vou que é para provar que eu faço. Porque a gente carrega esse estigma anti-trabalho braçal feminino porque mulher é delicada. Sim mulher é delicada, mulher precisa de carinho, mas nada diminui a capacidade de uma mulher trabalhar!”, ressalta ela.

Unidas contra o machismo

“Nosso objetivo social é quebrar esse estereótipo, incentivar mulheres a considerar essa área como opção de renda, é o empoderamento econômico delas”, observa Maira, fundadora da Diosa.

Na ONG Mulher em Construção o foco também não é somente na geração de renda, mas principalmente garantir que as mulheres consigam cuidar de si mesmas e se enxergar como capazes. “A gente queria passar para as mulheres não só a construção civil, também um espaço onde a mulher pudesse desenvolver as suas capacidades. Tu vê a diferença nessa mulher, depois de um ano, com poder, com dinheiro, com uma profissão, o respeito da família e dos filhos”, salienta Bia Kern.

Bia fala com entusiasmo sobre a cooperativa que está sendo lançada com o apoio da ONG. A Casa Rosa terá sua sede em uma das salas da Associação Cultural Vila Flores, em Porto Alegre. “No primeiro ano a gente vai apoiar com a luz, a água e o espaço, mas é tudo gerido por elas, elas é que são as responsáveis”, comemora Bia. A cooperativa nasceu da necessidade de mulheres que fizeram os cursos, mas não tinham com quem deixar os filhos, por isso não conseguiam um emprego formal, entretanto tinham como se organizar e trabalhar em alguns horários. A cooperativa será lançada dia 6 de junho, e de imediato tem mais de 700 atendimentos agendados no pós-venda da MRV Engenharia.

Já ciente de sua capacidade, Rosana Coin manda um recado para qualquer um que não acredite na capacidade feminina de superar desafios:

“Não necessita ter um homem para ter uma casa arrumada. Mulher não faz, quem disse que mulher não faz? Quem disse que mulher não é capaz? A mulher pode ter menos força física, mas não diminui a capacidade. Mulher é capaz sim, e pode fazer um serviço bom sim!

SERVIÇO

Você trabalha com reparos residenciais ou precisa de uma mulher para fazer algum reparo? Diosa: https://www.facebook.com/diosamaodeobrafeminina

Quer aprender a fazer a manutenção da sua própria casa, entre no Facebook da Mulher em Construção e se informe sobre os próximos cursos: https://www.facebook.com/mulheremconstrucao/

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Tina Borba
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