CRÍTICA: A subjetividade em “Better Call Saul”

Marília Port
Redação Beta
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2 min readAug 27, 2022

A série que estendeu o universo de Breaking Bad oferece uma narrativa sublime em suas complexidades e nostalgias

As duas versões de vida do advogado (Foto: AMC)

Caro leitor, fica aqui registrado um misto de sentimentos sobre o término de uma história que se ama. Essa amálgama mutável de alguma forma se assemelha à experiência da vida. Na série, você e eu acompanhamos pessoas muito humanas; na vida, nós as somos.

Better Call Saul chegou ao seu episódio final na sexta temporada, depois de sete anos, no último dia 15 de agosto, pela AMC, e no dia seguinte pela Netflix. Entre idas e vindas temporais, o spin-off de Breaking Bad assumiu um caráter muito mais intimista do que a frenética história principal.

Enquanto a história central segue Walter White — professor de química de ensino médio que passa a produzir metanfetamina após descobrir um câncer —, aqui o caminho trilha a metamorfose do advogado James McGill em Saul Goodman, bem como as peculiaridades de suas duas faces.

A saga de McGill conduz um percurso que torna a totalidade da trama mais completa e, de alguma maneira, aflora a compreensão do telespectador diante do complexo personagem interpretado por Bob Odenkirk. As decisões que toma são quase palpáveis, cada uma reafirmando as escolhas anteriores.

Os personagens a descobrir têm múltiplas camadas, como de praxe de tudo que vem das mãos e mente de Vince Gilligan, o criador. Aos nostálgicos, a narrativa reserva boas surpresas que aparecem ao longo das temporadas e permitem entender a formação de certas alianças depois consolidadas.

A intimidade de explorar e sentir (de uma maneira quase pessoal) cada drama provoca momentos muito intensos a cada pequena ou grande virada de chave na vida do protagonista e de todos os que o cercam. Saul Goodman é uma pessoa real que caminha (des)equilibrado sobre os dilemas da lei.

Como produto audiovisual, os planos-detalhe que permeiam a montagem das cenas integram um conjunto muito parecido com a estética de Breaking Bad, permitindo devorar minúcias nas ações mais cotidianas. Com originalidade, mantém a identidade visual deste abundante universo narrativo.

Esta é uma série para amantes de Breaking Bad, cujo desenrolar reafirma seu intuito de ser assistida em ordem de produção, ao invés de seguir a cronologia da história, que pode comprometer a experiência e entregar informações fora de hora — os temidos spoilers.

Caro leitor, a despedida é difícil. É um balde de água fria entender o destino e perceber quando não há mais volta. É a expressão corpórea do não-dito frente a tudo que poderia ter sido. É o fio da esperança transmutado na gratidão e identificação com uma boa história.

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