O Entrevero do Lê fica em frente ao portão C, no lado oeste da esplanada a Arena (Foto: Beta Redação/Lucas Alves)

A voz da Arena

As narrações que o estádio conta para quem está em seu entorno

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Por Thiago Borba, Lucas Alves e Gustavo Gomes Machado.

O que você pensa quando ouve alguém dizer que gostaria de viver de futebol? Que ele quer ser jogador? Talvez, jornalista esportivo? Ou quem sabe, youtuber?

Leandro Cardozo realizou seu sonho com o Entrevero do Lê. Em 2016, o então funcionário da Arena do Grêmio decidiu mudar. Montou um trailer e foi vender lanches na esplanada do novo estádio gremista. Confira Leandro contando um pouco de sua história na Arena.

Posicionado em frente ao portão C, no lado oeste da esplanada da Arena do Grêmio, o trailer de Leandro é ponto de encontro de amigos. Frequentador da Arena, Elvis Angeli vem de Gramado a Porto Alegre para assistir aos jogos do tricolor, porém, não sem antes fazer uma parada no Entrevero do Lê para conversar com o, hoje, amigo. “A gente nunca tinha se visto antes”, conta Angeli. Leandro complementa: “Tem pessoas daqui que já foram na minha casa, com quem já fiz churrasco, parceria junto. Posso dizer que é um sonho realizado”.

A relação de Leandro com a Arena vem desde quando ela nem existia ainda (Arte: Lucas Alves/Fotos: acervo pessoal)

Todo final de ano a Arena realiza um torneio de futebol entre seus funcionários, a confraternização dura um dia inteiro e, assim, a relação de Leandro com o futebol começou a se tornar ainda mais próxima. “Quando eu entrei pra jogar, sinceramente, foi uma alegria que eu não sei explicar. Se tu perguntar ‘o que tu sentiu?’, eu não posso descrever. É muito grande”.

Há menos de um mês da histórica derrota do Grêmio por 5 a 0 para o Flamengo, pela semifinal da Libertadores, as duas equipes se reencontraram neste domingo, dia 17, pela 33ª rodada do Brasileirão. Os torcedores viviam um clima de revanche. Pouco mais de 30 mil tricolores compareceram nas arquibancadas da casa gremista, enquanto que o espaço visitante foi inteiramente ocupado pelos flamenguistas.

O Entrevero do Lê funciona em dias de jogos, tanto na Arena quando no Beira-Rio. Na casa colorada, possui duas lojas. Além disso, também há operação em shows no Pepsi On Stage. “No Beira-Rio é um pouco diferente porque a nossa loja é dentro do estádio, aí eu consigo enxergar o campo”, explica Leandro.

É um jeito diferente de vivenciar um jogo de futebol. Sem poder ver o jogo, quem trabalha nos arredores, ouve o estádio antes do rádio. “É muito engraçado porque quando dá gol, primeiro a gente ouve aqui e depois dá no rádio, porque tem alguns segundos de diferença. Então a gente vê tudo isso, por exemplo, agora, estão vaiando, alguma coisa aconteceu”.

Para torcedores menos experientes pode ser difícil entender o que a Arena fala, entretanto, há quatro anos trabalhando alí, Leandro aprendeu a escutar a casa do Grêmio. “Aqui a gente está no meio do campo. Então, se gritar para esse lado (direita) é a torcida do Flamengo. E pra cá é a do Grêmio”. Porém, de vez em quando ainda ocorre um pouco de confusão: “Às vezes é um pênalti e tu acha que é gol”, comenta Leandro.

O Entrevero do Lê está há quatro anos na esplanada da Arena do Grêmio (Foto: Beta Redação/Thiago Borba)

“Quando o Renato estreou (em 2016), o Grêmio estava na oitava de final da Copa do Brasil contra o Atlético-PR, e foi para os pênaltis. O Grêmio errava um pênalti, eles mandavam fechar aqui as portas, porque a torcida poderia se revoltar, ou alguma coisa assim. Aí a gente ouvia quando dava o gol do Grêmio ou quando o Grohe defendia, era a comemoração de um gol. Aí eles mandavam abrir. Esse foi o meu primeiro ano, a primeira final.”

Maior que a agonia de estar ali e não poder assistir ao jogo é a incerteza com o futuro da administração do estádio. Não há como saber, no caso de aquisição completa dos direitos da Arena por parte do Grêmio, como o clube irá gerenciar os espaços da esplanada. “A única coisa que a gente sabe é que dia 31 de dezembro vai ser decidido. Hoje o meu contrato é com a OAS, se o Grêmio pegar, eu não sei o que vão pedir. Se continuar a OAS, eu já sei o que vão pedir.”

-Silêncio-

“Óh! Provavelmente lance do Flamengo, né?”, complementa Leandro.

A torcida gremista teve uma participação tímida neste domingo. Tirando os torcedores da Geral, que cantaram durante toda a partida, os demais tricolores permaneceram sentados apenas assistindo. Uma de suas poucas manifestações foi no momento que o telão do estádio anunciou a escalação que o técnico Renato Portaluppi mandaria a campo, os gremistas ovacionaram todo o elenco, inclusive o contestado goleiro Paulo Victor. O intuito era motivar os atletas frente a equipe que hoje é considerada a ser batida no futebol brasileiro.

Contudo, o incentivo não se manteve por toda a partida. Na medida em que os erros de passes aconteciam e as jogadas eram desperdiçadas, vinha a impaciência e os ruídos da arquibancada. As vaias começaram quando o Grêmio já perdia por 1 a 0 e Portaluppi chamou o atacante André, que entrou na vaga de Michel, no segundo tempo. Na reta final, os jogadores partiram para o ataque, mas não conseguiram alcançar o empate.

Após o término do jogo, a torcida tricolor se manteve em silêncio, enquanto os rubro-negros faziam a festa no setor visitante, não só pela vitória, mas pela aproximação do título nacional. “É só barulho naquele canto lá. Aquele canto é a torcida do Flamengo”, destaca Leandro.

Depois de quatro anos, Leandro afirma que é possível entender um pouquinho mais do estádio. Cada jogo é uma história. E muitas já ocorreram ali em frente ao portão C. Torcida vir de longe e não conseguir ingresso, não conseguir entrar e ficar aqui acompanhando. “Algumas pessoas vêm pra comer, algumas pessoas não conseguem ingresso e ficam aqui. Quando dá o gol a galera comemora. Mas aí dois minutos depois o VAR vai ver, aí todo mundo chia, vaia”, finaliza.

“Hoje eu peguei uma camiseta com os autógrafos dos jogadores todinhos. Tenho dos dois, do Grêmio e do Inter. Tenho foto com quase todos jogadores, minha filha também. O futebol pra mim, eu acho demais. É incrível como uma bola move 30 mil pessoas. 30 mil só aqui, olha quantas mais estão assistindo!”

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