Aleitamento materno em público gera controvérsia

Apesar de ser um direito garantido, mães relatam dificuldades na amamentação por livre demanda

Deivid Duarte
Redação Beta
4 min readMar 26, 2019

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Com Vanessa Fontoura

Joana Duarte, 24, diz que, assim como muitas brasileiras, se sente constrangida com os olhares quando amamenta em público (Foto: Vanessa Fontoura/Beta Redação)

O movimento crescente das mães que amamentam seus bebês sem hora ou lugar determinado trouxe à tona a discussão sobre o aleitamento em espaços públicos. Graças ao debate sobre a “livre demanda”, tramita na Câmara dos Deputados um projeto de lei que pune o constrangimento ao ato de amamentar. Mas, afinal, por que esse assunto ainda é tabu?

A amamentação por livre demanda permite que o bebê mame quando sentir fome. Nessa prática, é o pequeno que se autorregula, definindo a hora, a duração e o lugar de se alimentar. A consultora em amamentação e mãe de dois filhos, Cris Machado, criadora do blog Plantão Materno, explica que a prática de obedecer a vontade da criança não é um movimento novo, mas ainda precisa ser mais aplicada.

A consultora esclarece que, nos primeiros meses de vida, o bebê precisa ganhar peso em pouco tempo e, consumindo o leite materno, o esvaziamento gástrico é mais rápido. Assim, o recém nascido aprende a se alimentar até estar saciado e evita enjoos. Além disso, vai ser uma criança mais autorregulável e mais controlada durante a introdução alimentar.

(Arte: Deivid Duarte/Beta redação)

Pesquisa global feita, em 2015, pela Lansinoh, empresa de produtos para facilitar o aleitamento, mostrou que 64% das mães brasileiras consideravam perfeitamente normal a amamentação em público. Entretanto, 47,5% relataram ter sofrido algum tipo de preconceito enquanto amamentavam, mais que o dobro da média global, que foi 18,1%.

Apesar de ser um direito assegurado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, muitas mães ainda são criticadas por aleitar quando o bebê sente fome. Situação que ocorreu com a professora Joana Duarte, 24, que, aos 19 anos, deu à luz ao Luis Gustavo. Ela conta que evitou ao máximo amamentar o filho em locais públicos, pois sentia vergonha de se expor.

“A gente tem essa ideia de que é feio e está todo o mundo olhando. Eu lembro que quando tive alta, tinha um tio meu em casa e eu estava com vergonha de amamentar na frente dele. Mas acho que isto é imaturidade, porque, agora no meu segundo filho, eu tenho outra cabeça”, comenta.

Joana também é mãe do Heitor, de quatro meses. Ela relata que mesmo já tendo mudado de opinião sobre o aleitamento em público, ainda se pune. “Esses dias eu estava no shopping e o Heitor começou a chorar, então dei o mamá. Eu vi os olhares, mas pensei, bom, se alguém falar alguma coisa eu vou dizer que ele está chorando e com fome e não vai dar tempo de ir ao lactário”, conta.

A nutricionista Carmen Ferazzo, 54, explica a importância da alimentação com o leite materno. “É o alimento completo, ideal e essencial para a proteção contra as infecções, além de fundamental para o desenvolvimento e crescimento saudável do bebê. Possui água, proteínas, vitaminas, sais minerais e gorduras. Tudo na medida certa”, destaca.

O leite materno é o alimento mais completo para o recém-nascido (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

A especialista revela que o aleitamento materno sempre deve ser incentivado e orientado, independente do local ou horário. A imunidade da criança aumenta e o vínculo da mamãe com o bebê é reforçado. Além disso, é mais prático, econômico e evita o risco de contaminação no preparo de outras fórmulas de leite.

“Deve-se amamentar exclusivamente até os 6 meses, se o bebê estiver ganhando peso ideal para a idade. A partir daí, passa a ser um complemento da alimentação, indicado até os 2 anos, ou seja, o leite materno fica para os intervalos entre os legumes, carnes e as frutas”, esclarece Carmen.

Contudo, para algumas mães, como a pedagoga Paula Juchem, 31, que deu à luz a Helena há um mês e meio, este assunto não é muito agradável. Ela evita amamentar em público, pois não se sente à vontade.

“Acredito que as pessoas devem amamentar em público, pois estão alimentando seus filhos. Eu não me sinto à vontade, mas faço. Penso que ninguém deve se intrometer na amamentação e em nenhum outro ponto, mas as pessoas se intrometem, dão palpite sobre tudo”, critica.

Para a consultora em amamentação, Cris Machado, o constrangimento pode gerar uma sensação de falta de liberdade para a mãe, causando um desconforto quando ela estiver com o bebê em eventos sociais. “Isso exclui as mães, e esse isolamento não faz bem para a saúde mental materna”, explica.

Esse constrangimento faz com que algumas mães decidam não adotar a livre demanda. Cris aponta que essa é uma das causas da introdução precipitada da mamadeira, que é mais aceita socialmente, mas que acarreta o desmame precoce. “Acolher a mulher que amamenta é uma ferramenta de promoção e proteção do aleitamento materno”, defende a consultora.

Sem contraindicação

Bem humorada, Cris Machado conta que não há contraindicação sobre a amamentação em locais abertos, como na rua ou em praças.

“A recomendação é que a mãe tome muito cuidado, pois não deve amamentar no meio da rua, fazendo mergulho em profundidade, fazendo bungee-jump. Fora isso não há problema nenhum amamentar quando a mãe e o bebê sentirem vontade, pois os pequenos não têm fome só quando estão em casa ou na praça de alimentação ou na zona de amamentação”.

Ouça a explicação da consultora Cris Machado sobre a importância e os riscos da amamentação por livre demanda:

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